Faltam 1.800 oficiais de justiça, há comarcas em rutura

Os serviços judiciais têm 1.800 oficiais de justiça em falta e há comarcas em risco de rutura, como Leiria ou Lisboa Oeste, onde Sintra e Cascais não conseguiram captar qualquer interessado para o recente recrutamento excecional, segundo dados sindicais.

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De acordo com dados do Sindicato dos Funcionários Judiciais (SFJ) enviados à Lusa, o destacamento excecional aberto pela Direção-Geral da Administração da Justiça (DGAJ) para os núcleos de Sintra e Cascais fechou “sem interessados”.

O procedimento extraordinário para tentar colocar naqueles serviços dezenas de oficiais de justiça pretendia ser uma “resposta urgente” a uma “situação de rutura extremamente delicada”.

Em causa estava o recrutamento de 10 escrivães auxiliares para o núcleo de Sintra e de oito escrivães auxiliares e quatro técnicos de justiça auxiliares para o núcleo de Cascais, depois de as colocações no âmbito dos movimentos judiciais não terem sido aceites pelos colocados.

Segundo o sindicato, há situações próximas da rutura em Bragança, com oficiais de justiça da área judicial a tramitarem inquéritos do Ministério Público (MP), “sob pena de ser arguida nulidade”, referindo ainda que os serviços do MP em Beja estão “de portas fechadas”.

A falta de aceitação de nomeações é um problema cada vez mais recorrente na profissão, tendo o SFJ adiantado que o recente concurso para 200 novos funcionários judiciais, que só por si já não seria suficiente para “colmatar as saídas de 2023”, ficou também marcado pela desistência de cerca de 50% dos nomeados para os lugares.

Os dados sindicais apontam que em 2024 se aposentam 459 oficiais de justiça.

Os baixos salários e, mais recentemente, o valor das rendas levou ao desinteresse pelo ingresso nesta carreira, sobretudo em lugares nos grandes centros urbanos, onde o preço da habitação pode ser centenas de euros superior ao ordenado de entrada na profissão.

O SFJ diz ter alertado a DGAJ e a própria ministra da Justiça, Catarina Sarmento e Castro, para o problema, tendo sugerido ainda em março de 2023 um subsídio de renda em algumas comarcas para fazer face aos custos de residência, acusando a tutela de nada fazer.

O concurso aberto em janeiro de 2023 para integrar até 200 novos funcionários judiciais estipulava no aviso de abertura um vencimento base de 854 euros, menos de 100 euros acima dos 760 euros de salário mínimo nacional que vigorava no ano passado.

Em janeiro, numa manifestação de funcionários judiciais à porta do Campus de Justiça, em Lisboa, João Gonçalves, de 48 anos, a trabalhar no tribunal de Sintra, da comarca de Lisboa Oeste – uma das que se encontra em situação de rutura por falta de funcionários – relatava à Lusa um retrato de dificuldades para os oficiais de justiça e para os cidadãos.

Descrevendo uma “realidade péssima”, em que os “processos urgentes são despachados a muito custo” e onde existe um défice de 40% de profissionais naquele tribunal, o funcionário judicial realçou que a carência chega aos 60%, se se somarem as baixas médicas numa classe envelhecida.

“Há uma grande falta de pessoal e o serviço não consegue ser feito a tempo e horas. Para se auxiliar o senhor magistrado nas diligências, o trabalho na secção fica por fazer e o cidadão é mal servido, porque a justiça – as ordens emanadas pelo senhor magistrado – nunca são cumpridas no tempo em que deviam ser”, explicou.

Natural da zona das Beiras, João Gonçalves vive na região de Lisboa, mas lembrou que é “praticamente impossível” a um funcionário judicial em início de carreira sobreviver com cerca de 800 euros de ordenado.

Por isso, apelava na altura ao Governo – o atual ou o que vier a ser eleito – para reabrir a porta das negociações: “Aquilo que os oficiais pedem não são valores que não sejam comportáveis para a economia do país. Haja vontade política para que isso seja feito”.

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