Em artigo de opinião hoje no jornal Público, a procuradora-geral adjunta (PGA) Maria José Fernandes, embora sem se referir a Operação Influencer, questionou como foi possível chegar até aqui, ou seja, até “à tomada de decisões que provocaram uma monumental crise política e cujas consequências vão ainda no adro”, questionando métodos de trabalho e investigação do MP, designadamente do Departamento Central de Investigação e Ação Penal (DCIAP).
Em contraponto, Adão Carvalho, presidente do Sindicato dos Magistrados do Ministério Público (SMMP) referiu à Lusa que aquela procuradora-geral adjunta apresenta “uma visão singular e manifestamente não concordante pela quase totalidade dos magistrados do MP”, revelando alguns “vícios”.
Primeiro – observou – a magistrada apresenta “claras deficiências de argumentação e erros crassos sobre a questão que fala, quer sobre a posição do SMMP sobre a autonomia do MP, designadamente da autonomia interna, quer sobre as considerações que faz sobre o enquadramento de determinados tipos legais de crimes (recebimento indevido de vantagem)”.
Outro aspeto criticado por Adão Carvalho resulta da “profunda deslealdade” manifestada no artigo pela magistrada, designadamente porque “sabe que os magistrados do MP, nomeadamente os responsáveis pela investigação que cita, estão sujeitos a um dever de reserva e nunca terão oportunidade de se defenderem publicamente”.
“Por outro lado, parece-nos que a procuradora está ela própria a violar esse dever de reserva, pronunciando-se sobre processos que ainda não estão findos” ou concluídos, sublinhou o presidente do SMMP.
Nas palavras de Adão Carvalho, “num tempo em que já há muito burburinho e muita contra-informação na praça pública, é irresponsável que alguém que exerce funções no MP contribua ainda mais para o ruído”, tanto mais que internamente a magistrada podia sempre assumir a iniciativa de fazer “denúncias aos órgãos competentes do MP sobre quaisquer situações que considere anómalas ou incorretas”.
O dirigente do SMMP frisou que existem “formas de controlo jurisdicional dos atos praticados pelo MP no âmbito do próprio processo, onde esse controlo deve ser exercido, e que, no fundo, garantem que qualquer cidadão tem direito a um processo justo e equitativo”.
O presidente do SMMP lembrou que os procuradores do MP que estão à frente do inquérito da Operação Influencer são “magistrados responsáveis, com reconhecida qualidade, e que estão a dar o seu melhor no exercício das competências que lhes estão atribuídas, mesmo num quadro de trabalho excessivo em que se encontram no DCIAP”.
No artigo, a procuradora alega, entre outros pontos, que “os desfechos de vários casos já julgados permitem extrair que há aspetos do trabalho dos procuradores de investigação a carecer revisão e aprimoramento pelo exercício da autocrítica”.
No decurso dos interrogatórios aos detidos na operação Influencer, o juiz de instrução criminal Nuno Dias Costa considerou Diogo Lacerda Machado (consultor e amigo do primeiro-ministro) fortemente indiciado por tráfico de influência e sujeitou-o a prestar uma caução de 150 mil euros e a não se ausentar para o estrangeiro, devendo entregar o respetivo passaporte.
Já quanto a Vítor Escária (chefe de gabinete de António Costa demitido na sequência da investigação) foram validados fortes indícios do crime de tráfico de influência, ficando proibido de se ausentar para o estrangeiro e obrigado a entregar o passaporte.
O autarca Nuno Mascarenhas e os administradores Rui Oliveira Neves e Afonso Salema, da Start Campus, ficaram sujeitos unicamente a Termo de Identidade e Residência (TIR), tendo a empresa ficado obrigado a prestar caução de 600 mil euros. Para o autarca não foram validados indícios de quaisquer crimes, enquanto os dois administradores estão indiciados por tráfico de influência e oferta indevida de vantagem.
O juiz não validou os indícios apontados pelo MP da prática de corrupção e prevaricação que recaíam sobre os arguidos.
Esta investigação, que envolveu mais de 40 buscas, motivou a abertura de um inquérito conexo junto do MP no Supremo Tribunal de Justiça, relacionado com escutas de conversas entre arguidos e o primeiro-ministro demissionário, António Costa.