Os pais de Maria, Tiago, Letícia, Félix, Dânia e Odete não se conhecem apesar de terem estado, hoje de manhã, nos serviços da Direção-Geral de Estabelecimentos Escolares (DGEstE), em Lisboa, à procura de uma solução para os filhos. Dos funcionários, ouviram todos a mesma resposta: “Têm de esperar”.
As famílias com quem a Lusa falou queixaram-se da falta de vagas para os filhos, que ainda não foram à escola, apesar de o ano letivo ter começado na semana passada. São seis histórias de diferentes regiões de Lisboa e vários níveis de ensino.
Quando Débora Mascarenhas entregou a reclamação e a funcionária lhe respondeu: “Pronto, então está tudo”, a mãe de Félix revoltou-se: “Desculpe lá, mas não está nada tudo, diria mesmo que não está nada. Estamos a 20 de setembro, as aulas já começaram, e o meu filho continua em casa”.
Já fora das instalações, contou a sua história à Lusa. Imigrante em França, decidiu regressar para Portugal, mas esperou que o ano letivo terminasse para não prejudicar Félix com mudanças a meio das aulas.
“Nunca pensei que o mais difícil neste processo fosse encontrar uma escola”, lamentou Débora Mascarenhas, que disse ter tratado da “transferência dentro do prazo”. Os planos da família Mascarenhas previam que Félix estivesse agora numa turma do 9.º ano, em Alverca, mas o rapaz de 14 anos continua em casa.
“Se não há escolas, construam-nas”, defendeu, após mais uma ida infrutífera à DGEstE, onde esteve também na terça-feira, dia em que se deparou com “uma fila de mais de 100 pessoas”.
A Lusa questionou o Ministério da Educação sobre quantos alunos continuam a aguardar vaga numa escola e quais são as zonas do país mais complicadas, mas não obteve respostas até ao momento.
As famílias Siquenique e Candongo atravessam o mesmo problema. Tiago Siquenique e Odete Candongo deviam estar hoje numa sala de aula do 1.º ciclo, mas passaram parte da manhã na sala de espera da DGEStE. Desde que começaram as aulas, na semana passada, vêm os irmãos ir para a escola e sentem-se esquecidos.
Adalberta Candongo trocou Angola por Portugal, para onde veio com os quatro filhos. Fez as inscrições e quando saíram os resultados, em agosto, descobriu que a casula Odete não tinha ficado colocada.
Já esteve várias vezes nos serviços educativos e, há três semanas, fez uma reclamação “ainda sem resposta”: “A única informação que recebo é que tenho de esperar”, contou a mãe viúva, perante o olhar da menina que “era muito boa aluna” em Angola e já devia estar numa escola em Odivelas.
Tiago, também de poucas palavras, disse apenas que “gostava de estar na escola”. À Lusa, a mãe contou que o Tiago tem dificuldades educativas e era suposto estar no 4.º ano.
“Tivemos de vir para aqui porque não atendem o telefone nem respondem aos e-mails. Nem sei para que é que têm telefones!”, lamentou a mãe, numa critica que a Lusa ouviu de todos os pais, que garantiram ter tentado, sem sucesso, ligar dezenas de vezes.
Mas também há crianças em escolas em situações complicadas, como é o caso de Letícia Veríssimo.
Letícia poderá não aparecer nas estatísticas dos alunos sem vaga, porque a menina de 12 anos continua inscrita no seu antigo agrupamento de escolas na Pontinha, que fica agora a quase 60 quilómetros da nova casa, em Setúbal.
A mãe contou que o processo de transferência dos três filhos foi feito no verão, “dentro dos prazos”, mas apenas a filha do meio, de 4 anos, conseguiu vaga num jardim-de-infância em Setúbal. A família Veríssimo ainda não conseguiu creche para o bebé de dois anos nem escola para a menina que passou para o 5.º ano.
“Ela está presa na outra escola, mas nós não temos como a ir levar ou trazer”, contou a mãe Anny Veríssimo, depois de sair da DGEStE com a recomendação de “voltar à escola da Pontinha, porque as funcionárias daqui não conseguem aceder ao processo” da filha.
“O mais frustrante é que eu vou à escola antiga e mandam-me para a DGEStE. Chego aqui e empurram outra vez para lá”, lamentou.
Também Filipa Marinai sente que “existe uma barreira que impede de resolver os problemas”. Soube na terça-feira que a filha Maria tinha ficado colocada numa turma do 7.º ano numa escola no Laranjeiro, em Almada, depois de muitos e-mails e telefonemas.
“Já mudámos de casa e de vida e ela andou sempre no agrupamento Vale Milhaços, mas agora foi colocada numa escola do bairro social. Ontem [terça-feira], depois de receber a notícia, fui à escola e até vi miúdos a fumar droga junto ao portão. Recuso-me a meter lá a milha filha”, contou.
Foi isto que Filipa disse hoje aos funcionários da DGEstE, que a alertaram para os perigos de a menina faltar às aulas: “Disseram que tinha que aceitar, senão iria ter problemas com a CPCJ (Comissão de Proteção de Crianças e Jovens) por incumprimento escolar”.
Também Joana Baptista contou uma história complicada. A filha foi vítima de ‘bullying’ e os serviços de pedopsiquiatria aconselharam que deixasse a escola até que, recentemente, sugeriram que a menina regressasse e se inscrevesse na Escola de Mestres, em Alvalade.
A mãe fez o pedido em junho, mas “a única resposta é que o processo está a ser analisado”, contou, depois de ter apresentado hoje “a quinta queixa” na DGEstE, na qual diz que vai religiosamente “todos os dias”.
“A única coisa que me dizem é que tenho de esperar e que a resposta poderá só chegar em dezembro. Queria muito que a minha filha voltasse à escola, até porque lhe ia fazer bem em termos psicológicos”, disse a mãe.