“As autoridades francesas estão novamente a tentar apresentar um conjunto de medidas erradas sobre imigração”, considerou a investigadora sénior para a Europa da Human Rights Watch, Eva Cossé, citada em comunicado.
“Dividir as famílias e diminuir os direitos dos requerentes de asilo não é a resposta às preocupações de segurança do país”, sublinhou.
O projeto de lei será debatido no Senado (a câmara alta do parlamento francês), sendo depois enviado para a Assembleia Nacional (câmara baixa) em dezembro.
O Governo apresentou a medida em fevereiro, mas, em março, adiou o debate devido à falta de apoio no parlamento.
Se for aprovado, o projeto permitirá às autoridades emitir uma ordem para o migrante deixar o território francês, mesmo que a pessoa se enquadre numa categoria protegida pela lei existente.
As proteções existentes abrangem situações pessoais e familiares, como pessoas que chegaram a França antes dos 13 anos, têm residência de longa duração em França ou são cônjuges ou pais de um cidadão francês.
A lei permitirá que as autoridades desconsiderem essas proteções se o comportamento do estrangeiro for considerado “uma ameaça grave à ordem pública”, apesar de o projeto de lei não explicar o que é entendido como “ameaça grave” e “ordem pública”, sublinha a Human Rights Watch (HRW).
O Defensor dos Direitos Francês (que tem funções semelhantes à Procuradoria-Geral da República em Portugal) criticou fortemente todo o projeto de lei, referindo que as alterações planeadas vão “deteriorar a proteção dos direitos fundamentais dos estrangeiros”.
Também a Unicef (Fundo das Nações Unidas para a Infância) criticou as disposições, afirmando que o enfraquecimento das proteções relativas à expulsão de cidadãos estrangeiros – em particular pais de crianças francesas – poderá entrar em conflito com a Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos da Criança, da qual a França faz parte, e que protege a vida familiar e o princípio da não-separação.
Mas o ministro do Interior francês sinalizou que o Governo pretende acrescentar ainda outra disposição ao projeto de lei para facilitar a deportação de cidadãos estrangeiros com suspeitas de ligações a “ideologia radical”, citando o alegado assassino de um professor numa escola de França em outubro, que foi indiciado por assassinato terrorista.
O projeto de lei também reintroduz uma disposição controversa contra o “separatismo”, que tinha sido censurada pelo Conselho Constitucional, a mais alta autoridade constitucional de França, com base na imprecisão.
A disposição, que foi alterada na sequência dessa censura, pode agora ser reinstaurada, permitindo às autoridades retirar ou recusar a renovação de autorizações de residência a pessoas que não cumpram “os princípios da República”, uma medida que “parece ter como alvo os muçulmanos que sejam suspeitos de ‘separatismo’”, refere a HRW.
Por outro lado, adianta ainda a organização de defesa dos direitos humanos, se for aprovada, a lei irá enfraquecer as salvaguardas processuais para migrantes e requerentes de asilo, nomeadamente diminuindo o número de juízes especialistas que apreciam os recursos de asilo, passando de três para um e reduzindo os prazos.
Embora a proposta proíba a detenção de crianças migrantes menores de 16 anos em centros de detenção, a HRW alerta que continua a permitir a detenção de milhares de menores de idade e permite de crianças em territórios ultramarinos franceses.
“Os deputados franceses têm de refletir sobre as reformas de imigração que a França realmente necessita, incluindo o fim da detenção de todas as crianças, proteções eficazes contra expulsões injustas e um tratamento humano para as pessoas”, defendeu Eva Cossé.