Sem pastagens para o gado, devido à seca, e com as rações e a palha a preços altos, os criadores de bovinos do Baixo Alentejo estão a desfazer-se dos animais em leilões ou nos matadouros.
A ACOS – Associação de Agricultores do Sul, em Beja, organiza todos os meses um leilão de bovinos no parque de feiras e exposições da cidade e o deste mês conta com 295 animais inscritos de cerca de 30 criadores da região.
Na véspera, o gado foi descarregado, pesado e agrupado em lote e, no dia do leilão, muitos dos compradores, com um papel descritivo dos lotes nas mãos, aproveitam o período que antecede as vendas para passar a revista aos animais.
Manuel Machado Godinho tem uma pequena exploração agropecuária no concelho vizinho de Serpa, onde possui cerca de 60 cabeças de gado bovino, e conta à agência Lusa que se deslocou a Beja para acompanhar a venda dos 21 jovens animais que leva ao leilão.
“Já tive que reduzir 10 animais adultos na exploração”, devido às dificuldades provocadas pela seca, e, agora, “vou aguentando da maneira que posso e vendo se dá para manter” o efetivo, realça este produtor alentejano.
Enquanto aguarda pelo início do leilão, Manuel Machado Godinho alerta que a falta de chuva na região limitou o crescimento das pastagens e que os preços de um fardo de feno chegam a atingir os 25 a 30 cêntimos o quilo.
“Um fardo de feno com 450 quilos pode chegar aos 130 euros e dá para à volta de 25 animais por dia”, salienta, adiantando que as suas reservas, entre palha do ano passado e feno silagem agora comprada, só dão para alimentar os animais durante quatro meses.
Sentados ao lado um do outro e de frente para o ringue onde o gado é leiloado, Leonel Cantinho e José Rodrigues, ambos com explorações no concelho de Beja e animais no leilão, analisam o setor da pecuária e temem o pior.
“Não há pasto e a palha, além de ser cara, é difícil de encontrar”, lamenta Leonel Cantinho, para quem o setor “não está bem encaminhado” pois os criadores gastam muito dinheiro por dia na alimentação e os preços dos animais estão a descer.
José Rodrigues é ainda mais pessimista e vaticina o fim da pecuária extensiva: “A tendência é para acabar se não houver ajuda da Comunidade Europeia ou do Governo português”, afirma.
“Estão-se a abater milhares de cabeças de gado e vai-se abater muito mais porque não há condições para se aguentarem os animais com falta de comida”, alerta.
Este leilão, segundo Miguel Madeira, vice-presidente da ACOS e responsável pelo Departamento de Sanidade Animal desta associação, teve “uma procura maior”, sobretudo, para a venda de animais adultos devido à falta de comida para o gado.
“Se mais espaço tivéssemos, mais animais adultos teríamos, porque a procura tem sido muita. Só que o espaço é limitado e não podemos acolher todos”, refere, indicando que alguns bovinos “ficaram em lista de espera e entrarão no próximo leilão”.
O responsável, que durante o leilão ajuda no encaminhamento dos animais pelas mangas desde os parques até ao ringue, diz à Lusa que já se nota que “os produtores estão a reduzir os efetivos para os adequar às suas capacidades”.
Artur Ferreira, um dos compradores presentes no leilão, reconhece que este ano “os produtores estão a vender mais animais do que nos anos anteriores” e alguns até se querem desfazer do “rebanho todo”, pois sabem que “não vão ter alimento”.
Mas o preço dos animais “não tem baixado porque não há fartura e há negócios para o exterior [do país] que levam a que os preços não baixem”, assinala.
A tendência de que os criadores estão a vender mais animais verifica-se igualmente no Matadouro do Litoral Alentejano, em Odemira, também no distrito de Beja, de acordo com Cármen Lampreia, uma das responsáveis da empresa.
“Já começámos a ter alguma procura”, frisa, prevendo que, a partir do próximo mês de junho, o matadouro passe “a ter bastantes abates, nomeadamente de bovinos e ovinos”.
Assinalando que também aconteceu no verão passado, Cármen Lampreia dá como exemplo o abate e carregamento de bovinos em, pelo menos, três camiões para um cliente português, previsto para a próxima semana.
Este aumento da procura é sobretudo para os chamados “animais de refugo”, ou seja, “os animais mais velhos que iriam, muito possivelmente, parir este ano” e, provavelmente, vêm para abate, acrescenta.