Porque razão o CHEGA não é um partido populista

Quem acusa o CHEGA de populismo não sabe o que é o populismo. O que não admira, conhecida como é a deplorável preparação intelectual e cultural da maioria dos jornalistas portugueses e dos líderes políticos da nossa esquerda. Já aqui defini mais de uma vez o que é o populismo. O que o caracteriza principalmente é a ligação entre um líder carismático (seja ele individual seja colectivo) e o «povo», ligação esta que ofusca a importância do debate ideológico e desvaloriza a formação de uma opinião pública crítica e consistente. O perigo para a democracia política que o populismo representa resulta precisamente da concepção de povo que se perfila atrás do líder e do partido que o secunda. Que povo é esse? Seja qual for a concepção de povo de que se alimenta o populismo, uma coisa é certa; ele exclui quem o não integra ou seja, marginaliza e ostraciza os outros. Não se identifica com o povo soberano próprio da democracia representativa que compreende todos os cidadãos eleitores, sejam eles quais forem. Daí a deriva para a exclusão em vez de para a inclusão, para o ódio em vez de para o diálogo.

    Exemplos claros de populismo são-nos dados pelos partidos comunistas da Europa ocidental, a começar pelo português, e pelos da extrema-esquerda. Estes partidos dividem os cidadãos em classes claramente identificadas, de um lado o «povo» ou seja, os comunistas, o «povo trabalhador» e «outros democratas» e do lado oposto a burguesia logo identificada com os grandes monopolistas, os agrários e quejandos. Todos nós fomos bombardeados com esta cantilena durante décadas e ainda somos, quer na versão do pc que na do be. O «povo» reduz-se a uma parte da sociedade que obviamente necessita de se contrapor à outra parte, considerada exploradora, réproba e relapsa. Ao povo cabe seguir as pisadas do líder (individual ou colectivo) na senda das certezas da «história» que se encarregará de absolver todas as violências entretanto cometidas. A direcção partidária é tudo, a ideologia é básica e a crítica é erradicada. O populismo é o contrário da democracia representativa porque quer substituir a representação resultante das eleições por uma representação informal e directa de uma parte da sociedade articulada em torno de uma direcção individual ou colectiva.

    Ora, o CHEGA é tudo menos isto. Estou farto de dizer que o CHEGA não é a causa do populismo mas precisamente a sua consequência. Consequência do populismo da esquerda radical portuguesa que ostracizou uma parte importante da sociedade popular a que nunca deu voz e que quis reduzir a uma cidadania de segunda categoria, naturalmente que à custa da instrumentalização daquela parte do «povo» de que se alimenta. Em consequência, para estes partidos as eleições são um plebiscito, um acto de fé não de razão. 

    Mas existe uma outra razão fundamental para explicar o sucesso do CHEGA. É o sistema dos partidos maioritários portugueses e o impasse a que levou. No nosso país os dois partidos maioritários deixaram há muito de ser os mediadores ideologicamente robustos da democracia representativa. Transformaram-se em partidos eleitoralísticos cujo único propósito é enfiar as suas clientelas no aparelho do estado. Não se importam nada com as ideias pois que o seu único objectivo é segurar os votos necessários para alimentar as suas clientelas políticas. Em vez de ideias apresentam propostas confusas e inexequíveis que promovem junto dos eleitores a preços de saldo e fazem alianças contra-natura, até com o diabo se necessário, para garantir o acesso ao poder. O único partido da esquerda (não marxista, ao que parece) que compreende esta realidade é o Livre. Os partidos do establishment (ainda) não o atacam; pudera, não o compreendem.   

    A denúncia deste lamentável estado de coisas a que o sistema partidário português foi conduzido paga-se caro com campanhas de desinformação e anátemas. Daí a força do CHEGA. Não compreendem as luminárias que vazam no combate ao CHEGA as suas frustrações que é precisamente delas que ele se alimenta. Pois que por detrás do fraseado barato e intrujão está à mostra a triste realidade político-partidária do nosso país e eles não a podem esconder porque é dela que vivem.  

Artigos do mesmo autor

A esquerda portuguesa está muito preocupada, ou diz estar, com a destruição da democracia política. E utiliza este chavão para atacar quem se lhe opõe no plano das ideias. Não entende nem pode entender que é pela mão dela que os ataques à democracia são evidentes. A democracia não é apenas uma metodologia […]

Do programa eleitoral do PS constam duas medidas principais visando vincular os médicos ao serviço nacional de saúde (sns). Lá está previsto que eles ficam agarrados ao sns por um período mínimo e que se quiserem sair têm de pagar ao estado a formação que tiveram. O pretexto é compensar o estado pelo dinheiro gasto […]

Porquê? Porque RFM foi um exemplo de lucidez intelectual e de honestidade pessoal durante o dificílimo período do liberalismo português de oitocentos, dividido entre os radicais vintistas e o cartismo. Deu sempre mostras de autonomia, independência e nível intelectual. Homens como ele fazem hoje mais falta do que nunca. O que se vê hoje é […]

Só os mais ingénuos é que podem acreditar que ela é revolucionária e está possuída por um inconformismo radical. Só os mais cândidos é que poderiam supor que ela cabe nas imortais palavras de Dostoievsky (que a dita extrema-esquerda portuguesa nunca leu) tiradas do magnífico romance «Os Demónios» onde lhe atribuía a convicção necessária para […]

A esquerda portuguesa está desnorteada. Para o crescendo conservador na Europa em geral e também no nosso país só tem uma explicação; o fascismo, evidentemente, o papão fascista, adornado agora com a xenofobia e o racismo. Daquelas cabeças não sai mais nada. E mais nada pode sair porque o universo mental do politicamente correcto que […]