O ultimato e a ocupação efectiva

O fator africano só se tornou relevante para Portugal a partir do Ultimato, em Janeiro de 1890. Essa humilhação pelos nossos mais antigos aliados, teve o duplo efeito de fixar os limites geográficos da expansão em Africa e incidiu como um cataclismo na consciência das elites portuguesas.

O desprezo oficial por Africa converteu-se no maior fermento orgânico do Partido Republicano Português e na sua campanha contra a monarquia. A ausência de estratégia africana de estado foi dramatizada no final do sec. XIX, quando as potencias industriais  da Europa accionaram a exploração sistemática do interior. A “corrida a África”  (The scramble for Africa) assentou sobre a competitividade entre nações, como a Bélgica e a Alemanha e as nações já com impérios informais, como Portugal.

Entre nós, à noção de impotência para agir nos territórios africanos, juntava-se a marginalização diplomática na cena europeia, tendo Portugal sido excluído da Conferencia Geográfica de Bruxelas (1876).

Como reação de alarme patriótico, criou-se a Sociedade de Geografia que se tornou, em 1876 a vanguarda intelectual e científica do africanismo, agindo sobre a opinião publica e promovendo expedições pioneiras ao interior (Serpa Pinto, Brito Capelo, Henrique de Carvalho). Esses grupos da Sociedade de Geografia tiveram um papel determinante na descoberta de África. 

Mas na Conferencia de Berlim de 1884 foi consagrado o princípio da “ocupação efetiva”, em detrimento da tese portuguesa da titularidade baseada nas descobertas.

Ou seja, mais uma manobra para ocuparem os territórios portugueses em Africa. Doravante não bastava um país fazer a reivindicação nominal de possessões territoriais para obter reconhecimento internacional. Era preciso estar no terreno convertendo os direitos históricos em presença política, económica e militar. 

A premência foi acentuada em 1898 com a assinatura de um acordo secreto entre Berlim e Londres para a partilha entre si de Angola e Moçambique. O Ultimato inglês gerou a revalorização épica do Ultramar.  Ser “progressista” era ser colonialista e ser “nacionalista” era vibrar com a Africa remota de que se só conhecia o litoral.

A crise do Ultimato marcou o início da “ocupação efetiva” através da Campanha de África, uma mobilização de recursos tendo como objetivo uma viragem total das políticas. Entre esses objetivos conta-se com a pacificação das tribos sendo ainda tão precário o cação militar. Mouzinho de Albuquerque, Paiva Couceiro João de Almeida, entre outros, enfrentaram corajosamente nos sertões de África as tribos armadas pelos ingleses.

Além das ações bélicas investiu-se na penetração do interior e no fomento económico. Mas em 1913, antes da 1ª Guerra Mundial, era ainda tão precário o poder ultramarino que ingleses e alemães firmaram de novo a partilha de Angola e Moçambique. A participação de Portugal no conflito decorreu das necessidades de preservar o património ultramarino e de ter voz nas redistribuições do pós-guera.

O Estado Novo trouxe continuidade e prosperidade ao Império Colonial, novo léxico oficial. O Acto Colonial (1930) uma espécie de subconstituição proíbe expressamente todo o tipo de escravatura e regula salários justos para todos. 

“Sobre o sangue e as ossadas dos missionários, dos soldados e dos colonos, constrói-se um império onde as cores de Portugal são amadas e aclamadas por milhões de indígenas. (Marcello Caetano, viagem a África em 1935)

Coube ao Estado Novo prosseguir o desenvolvimento como nunca outro regime o fizera, mediante ameaças externas que foram uma permanente. Por exemplo, em 1943, analistas do Departamento de Estado dos Estados Unidos, diagnosticando o “parasitismo” dos portugueses defendiam que Portugal deveria ser desapossado das suas colónias.

Até Norton de Matos o disse: “À valorização das colónias devemos dar o nome de valorização da Nação: não há política colonial, há apenas política nacional.”

Não foram quinhentos anos de ocupação, como erradamente se ensina nas escolas. Foram cerca de noventa anos, entre as decisões tomadas em Berlim sobre a “ocupação efectiva” e a liquidação da portugalidade em 1974. Mas que grandiosa obra se fez, em noventa anos de ocupação efectiva.

O africanismo subsistiu em Portugal até 1974, como uma doutrina amplamente consensual. Reconhecer isto é dever de qualquer individuo que tenha obtido uma pontuação positiva num simples teste de inteligência.

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