“O que se passa é que as equipas são exíguas, são poucos profissionais para o nível de necessidades. Há parte do território que está a descoberto. Ao nível dos cuidados paliativos pediátricos a situação é também dramática”, disse à Lusa a presidente da Associação Portuguesa de Cuidados Paliativos (APCP), Catarina Pazes.
A responsável falava dias depois de a APCP ter apresentado um conjunto de propostas à Comissão Parlamentar da Saúde, entre as quais a criação de equipas comunitárias de suporte em todas as Unidades Locais de Saúde (ULS) e a facilitação da mobilidade de médicos, enfermeiros, psicólogos e assistentes sociais para estas equipas.
“Em todas as ULS tem que haver uma equipa comunitária que possa fazer um acompanhamento e um suporte dos doentes com alguma dificuldade na deslocação, mas que precisam de um apoio ao longo do tempo de doença, adaptado à sua necessidade em cada momento, quer vivam em casa, em lares de idosos ou em estruturas sociais”, defendeu a responsável.
Catarina Pazes apelou também ao reforço das respostas para cuidados pediátricos, especialmente nas regiões do Alentejo e Algarve, lembrando que “continuam desprovidas de qualquer apoio”.
Apontou igualmente as assimetrias regionais, afirmando: “Há locais do país que têm equipas comunitárias, mas que não abrangem toda aquela área onde estão implementadas. E isso não é só em regiões mais remotas. Por exemplo, em Lisboa, isso também acontece”.
Disse que é preciso uma aposta mais forte nos profissionais e, nas equipas onde estes existem, perceber de que formação precisam e dar-lhes condições para a poder fazer: “Temos vários colegas a tentar fazer formação paga pelo seu bolso, sem depois terem a dispensa de serviço para poderem fazer estágios”.
Insistiu na necessidade de melhorar a articulação entre a Rede Nacional de Cuidados Continuados e a Rede Nacional de Cuidados Paliativos, “cuja coordenação se encontra inativa desde o final de 2023”.
“Precisamos de uma monitorização e de um apoio técnico efetivo da parte da Comissão Nacional de Cuidados Paliativos, que é inexistente”, afirmou Catarina Pazes, acrescentando que os profissionais no terreno se sentem abandonados.
“Há mais de um ano, desde o final de 2023, que não há qualquer ação da Comissão Nacional. Portanto sentimo-nos um pouco abandonados do ponto de vista da organização e da gestão, porque não temos (…) a estrutura que foi criada para isto a funcionar e a monitorizar, apoiar, avaliar o ponto da situação e estabelecer prioridades”, afirmou.
A APCP considerou que a ausência de coordenação está a comprometer o acesso equitativo aos cuidados paliativos.
Num relatório divulgado no ano passado, a Entidade Reguladora da Saúde revelou que quase metade (48%) dos doentes referenciados em 2023 para unidades de cuidados paliativos contratualizadas com o setor privado ou social morreram antes de ter vaga, uma situação que Catarina Pazes lembrou ser apenas “uma parte do problema”.
A responsável da associação pediu que a Direção Executiva do Serviço Nacional de Saúde tenha conhecimento do que se passa no terreno e, em conjunto com os profissionais, encontre soluções.
Entre as várias propostas que a APCP deixou aos deputados estão também a criação de uma equipa de cuidados paliativos pediátricos em cada serviço de pediatria “que garanta resposta efetiva”, alertando que a região do Alentejo e Algarve está, neste momento, sem qualquer resposta.
Sugeriu igualmente uma aposta no atendimento telefónico (por médico e/ou enfermeiro) 24 horas por dia, sete dias por semana, como estratégia de redução de deslocações desnecessárias a serviços de urgência e internamentos hospitalares.
A APCP considerou “incipiente” o compromisso do Plano de Recuperação e Resiliência nesta área e lembrou que o último relatório da Comissão Nacional de Cuidados Paliativos (2024) reconheceu que a maioria das equipas “não tem a dotação de recursos humanos prevista no Plano Estratégico de Desenvolvimento para os Cuidados Paliativos (PEDCP)”, sublinhando que “as dotações previstas já são reconhecidamente insuficientes para uma resposta de qualidade”.
“Tem que haver um olhar para isto pela injustiça que causa, pelo desgaste que causa aos próprios profissionais, mas principalmente pelo sofrimento dos doentes e das famílias que não é atendido”, insistiu Catarina Pazes.