A TAP Air Portugal
Há duas maneiras de analisar a importância da TAP num país como o nosso. Deixando as explicações e as justificações para os especialistas, para os políticos intervenientes e para os comentadores e os seus tró-la-rós, vou tentar explicar e até certo ponto “justificar” a atração dos políticos, os verdadeiros atores do sistema, pela transportadora nacional.
A sua história começou quando o General Humberto Delgado, seu mentor, resolveu avançar com este projeto nacional. Começou a sua vida com dois DC3 DAKOTA e em setembro de 1946 inaugurou a sua primeira linha regular Lisboa – Madrid. Em 31 de dezembro foi a vez da famosa Linha Aérea Imperial, Lisboa – Luanda – Lourenço Marques – Luanda – Lisboa e volta com a duração de 15 dias e de numerosas escalas. Outros tempos, outras gentes e extraordinários feitos por tempos que já lá vão. O resto é história a acompanhar o fantástico desenvolvimento de uma indústria, sempre à frente nos desígnios dos visionários de então.
Era o começo de uma nova era e estávamos, na altura, a par do mundo desenvolvido no que diz respeito à aviação, facto a que não era estranho a dependência de uma Secretaria de Estado dedicada em exclusivo à causa. Mas isso são outros pensares, outros 25 tostões.
Os anos foram passando até que, após o 25 de abril de 1974 e perante um estado de calamidade que sucedeu à revolução, o mundo exigia garantias aos sucessivos empréstimos que Portugal, de mão estendida, pedia para manter o país a funcionar. E eu lembro-me, que a TAP servia de garantia a muitos empréstimos pedidos, pois a credibilidade que o país e os seus “responsáveis” tinham perante os credores, não era das melhores.
Abreviando, cometeram-se na altura enormes e verdadeiras atrocidades, atentados vis contra o património da transportadora e na obrigatoriedade do respeito pelos compromissos assumidos, a TAP vendeu as suas joias da coroa, os seus 2 Boeings 747 que tantas e extraordinárias missões tinham efetuado aquando do repatriamento dos milhares de portugueses despojados das suas identidades e bens nos territórios abandonados de além-mar.
Era o começo doutra nova era. Da era que só trouxe instabilidade à companhia e ao país. À companhia porque ninguém mais se entendeu internamente e porque a imagem passada aos portugueses não correspondia à credibilidade conquistada ao longo dos anos. Ao país, porque os políticos e os ditos responsáveis pelas sucessivas administrações que se sucederam em catadupa e conforme as cambalhotas políticas, descobriram o negócio das compras e vendas de aviões, associadas ou não, aos apoios devidos a partidos políticos. Tudo, claro está, a bem da nação.
Em silêncio, as “falcatruas” foram-se sucedendo e os silêncios ouvindo-se ao sabor dos jogos de bastidores e dos interesses então por instalar. Os mais descarados e bem posicionados presidentes direta ou indiretamente, faziam-no “à fartazana” lucrando milhões. Os “administradores passageiros” lucravam com chorudos ordenados, cartões, carros e com anos “fictícios” na segurança social, enquanto outros preferiam o ocupar cargos importantes e o manobrar com sindicatos e as centrais sindicais. Todos, à conta mãe vaca. Todos pendurados nas já magrinhas e gastas tetas da desgraçada TAP.
Sempre apoiada por um estado conveniente, por políticos gananciosos e a quem lhe agradava o esquema, a TAP foi resistindo ao longo dos anos a sucessivas e estranhas intrusões. Ele foi a “obrigação” da Airbus em relação à Boeing, ele foi a quase submissão à Swissair por um “visionário” estrangeiro, ele foi a compra das falidas empresas brasileiras que ninguém queria, elas foram as sucessivas tentativas de privatização do tipo, “agora privatizo eu, depois reprivatizas tu”, velho e conhecido jogo sempre recreado entre PS e PSD, bem na nossa frente e sempre acreditando que nós, os do povo, somos completamente idiotas.
Falei só de alguns exemplos de como, ao longo dos anos se serviram de uma companhia que já foi a menina dos olhos dos portugueses, mas não me esqueço de como mais um estrangeiro que também queria “ganhar algum”, e aqui chega, com dinheiro que não era dele, e com a garantia da própria TAP, compra a mesma TAP e, na dança da reprivatização, ainda sai daqui com 55 milhões de euros. Convenhamos que foi obra!
Os pormenores destas festanças, destas calamidades a que alguns políticos se referem como absolutamente legais, estão em todo o lado. Nos DCIAPs, nas Finanças, nos ministérios e por aí fora mas só para quem, verdadeiramente quer ver alguma coisa. Para quem finge que sabe ou não quer ver, não vale a pena insistir ou vir a público agora, passado algum tempo, chamar à atenção de águas passadas quando, na devida altura, nem os moinhos por onde as águas passavam, conseguiam ou queriam ver.
Já sabe, mais ou menos, o que é o sistema? Mais coisa, menos coisa, funciona assim. Quando por lapso ou por falta de jeito a “marosca” é tornada pública, a imprensa aparece e a resposta é que o caso está entregue à justiça. A justiça por sua vez demora o que demora e todos sabem que não é pouco. Como, apesar de dizerem o contrário, funciona a mando e a compasso dos políticos, no devido tempo vem a lume e é então, que o povo idiota, mas já desconfiado, toma conhecimento das atrocidades cometidas. Se a coisa interessa, vai-se para a frente. Senão, deixam-se ir os outros que depois se acusam de irresponsáveis extremistas, sempre contra o bom funcionamento da democracia.
Mas o sistema é muito mais do que isso. Em Portugal funciona a irmandade PS/PSD há muito instalada e considerada a plataforma de um equilíbrio dito necessário. A porta que separa o inferno de um purgatório que ainda assim consideram razoável, tendo em conta os pecados cometidos. Tal como a constituição, feita por cabeças doutros tempos e que à partida ditaram procedimentos, normas e leis de índole socialista que impedem quem pense diferente, de alterar seja o que fôr. Tudo, claro, a bem da nação e em benefício do sistema.
Não queria deixar de me referir aos quadros dos trabalhadores da TAP. Sujeitos às necessidades, aos desvarios e estratégias dos seus responsáveis, são verdadeiramente o sustento da transportadora e salvo algumas exceções, a razão da sua existência e continuidade.
Neste exaustivo jogo de privatizações e reprivatizações, serão porventura os que mais sofrerão, enquanto de fora ou por fora, não faltarão as mais variadas opiniões dos que nos martirizam todos os dias com as mais sortidas parvoíces em opiniões pagas, para distrair os incautos.
Verdade, “verdadinha” é que vem aí mais uma manobra que fará tremer famílias e destabilizar o que parecia estabilizado. Tudo por conta do dinheiro que, efectivamente não dá para tudo mas que, em nome da economia exige uma solução que mais uma vez sairá das privilegiadas e doutas cabeças em detrimento dos idiotas que a tudo assistem sem se queixar. Estranho é que em nome da mesma economia, se continue a distribuir dinheiro e obrigações por estranhos, que em nome de sabe-se lá o quê, se continue a distribuir à tripa forra dinheiro por fundações, observatórios e apoios vários a causas estranhas. Tudo em nome da economia? Claro que não! Tudo em nome da confusão em cabeças impreparadas, e que funciona há quase meio século.
E o sistema, já sabe o que é? Ou à semelhança de muitos continua a precisar que lhe façam um desenho ou que toque a si a desgraça dos outros?
Para terminar, não cesso de perguntar a mim mesmo, se esta é a última tentativa de privatização de 20% da companhia que ainda há pouco tempo recebeu do estado 3200 milhões de euros. Que segundo as minhas contas recebe uma oferta alemã de 200 milhões por uma fatia que vale no mínimo 3 vezes mais e que esconde dos portugueses outras ofertas que devem ser no mínimo ofensivas. Ou será que nestas manobras e a julgar pelos atos políticos anteriores, existem outras vias, outra distribuição de proventos que não consigo agora vislumbrar? São na realidade estranhos os caminhos deste sistema que quase todos percebem como funciona, mas que, na sua essência, só é verdadeiramente entendível pelo PS ou pelo PSD.
Daqui a uns tempos a privatização voltará à baila e os portugueses pagarão, como de costume, outros milhões. Os mesmos milhões que o sistema distribuirá pelos do costume.
E diga-me, sabe agora o que é o sistema?
Ou quer mesmo que eu lhe faça um desenho?