Vivemos um tempo de confusão conceptual, em que as palavras perderam o peso que outrora lhes dava substância. Nacionalismo tornou-se insulto, o patriotismo foi reduzido a emoção efémera (evocada com cuidado e sempre de forma plural, perdendo o seu sentido, como em eventos desportivos) e Estado é hoje pensado como uma máquina administrativa, destituída do seu propósito fundamental. No entanto, uma comunidade só sobrevive enquanto se entender a si própria.
Se recuperarmos o sentido de povo e a sua definição enquanto existência, podemos defini-lo como um conjunto de indivíduos que através de uma seleção natural, isolamento ou vontade, estão unidos por uma semelhança biológica. Enquanto conceito podemos afirmar que é uma expressão natural de conjuntos de população que se encontra num espaço e evolui em conjunto. Mesmo existindo contacto com outros povos e populações com o avançar do tempo consolida-se numa existência própria. A confusão que atualmente existe é causada pela incoerência e revisionismo histórico. Essa infeliz tendência que tenta demonstrar que esta realidade não existe. Contudo, na mera observação é passível de se compreender ao redor do mundo e da sua história que é um facto. Um qualquer povo terá sempre em si um singularidade biológica e natural.
A Nação enquanto conceito é a vontade do povo – conjunto de populações unidos pela sua realidade biológica – que enquanto conscientes de si mesmo, reuniram-se numa só comunidade política. Confirmando uma existência e organização própria e única, consolidada numa cultura própria, com ideias civilizacionais e uma moral cristalizada que molda a sua existência.
O nacionalismo, antes de ser ideologia, é consciência. É o reconhecimento de que um povo não é um conjunto de indivíduos, mas uma comunidade moral e histórica que partilha a moral, cultura e ideais civilizacionais. Ser nacionalista, no sentido verdadeiro, é afirmar que Portugal existe como entidade espiritual anterior ao Estado, e que o Estado só é legítimo quando serve essa consciência. O nacionalismo enquanto ideologia, é reconhecer-se a si própria como entidade política e governar-se segundo a sua identidade.
A pátria é o solo e o símbolo dessa pertença e realidade histórica. É o espaço onde a memória se torna visível. A pátria é mais do que o território: é o lugar moral onde o português se reconhece como tal. O patriotismo, por sua vez, é o sentimento dessa ligação, o território que nos prende ao que nos deu forma. Mas se o patriotismo é emoção e memória, o nacionalismo é a consolidação. A pátria é físico, a Nação etérea. São diferentes dimensões de uma mesma realidade: a nossa.
Portugal é o resultado dessa unidade. Desde a sua fundação a Nação nasceu da consciência dos portugueses e foi sempre a sua base e apoio. Não nasceu de tratados ou acordos internacionais, mas da vontade coletiva de um povo que se soube distinto. E o “estado” sempre fez parte da sua realidade. E por isso, o “estado” português não é uma invenção técnica, mas a formalização de uma consciência nacional. A nossa história política sempre assentou na relação orgânica entre a identidade nacional e a forma de governo.
O problema do nosso tempo é que o Estado deixou de servir a Nação e passou a servir-se dela. A moral cedeu à ideologia, a cultura à conveniência e a soberania à administração. Esquecemos que a política, em sentido próprio, tem como objetivo ordenar a vida coletiva segundo a natureza moral e civilizacional do povo. Quando essa natureza e moralidade é ignorada, o Estado torna-se estéril e a sua substituição é necessária.
A moral, a cultura e os ideais civilizacionais são a realidade da vida nacional. São eles que distinguem um povo e dão sentido à sua existência.
A moral é a orientação da conduta social; a cultura é a sua expressão prática e visível; os ideais civilizacionais são a realidade social e política. Todas estas realidades foram consolidadas no exercício da experiência do processo evolutivo histórico de um povo que ao consolidar-se fez nascer uma Nação – a portuguesa. E renegar essa verdade, é renegar a nossa própria existência.
O Portugal político só poderá renascer quando a nossa moralidade, cultura e civilização não forem rejeitadas e forem o seu início, meio e fim.
O Estado-Nação é, por isso, a forma natural da nossa liberdade política coletiva. É nele que a soberania nacional se constitui e se protege. O Estado-Nação português não é uma invenção recente, é a própria história de Portugal convertida em ordem política. Sempre fez parte da nossa história. Na sua ausência, a nossa existência enquanto Nação é ameaçada. E com a multiplicidade de realidades, existências e culturas não existe um sentido político concreto. Deixa de existir um caminho em conjunto, para passar a haver várias. É neste caos sem rumo que o espírito nacional desaparece. E o indivíduo, independentemente da sua realidade histórica, se isola e repugna a sua sociedade e comunidade.
Restaurar o Estado-Nação é restaurar a coerência entre quem somos e o que somos. É devolver à política o seu propósito e sentido. Portugal não precisa de reinventar-se. Portugal precisa de recordar-se.
Este caminho não nega a modernidade, mas reencontra nela a nossa verdade: a de um povo que, sendo pequeno, soube sempre ser inteiro. Se o Estado voltar a servir a Nação, e a Nação voltar a acreditar no Estado, então Portugal voltará a ser destino.