O fadista António Pinto Basto nasceu em Évora a 6 de maio de 1952.
O seu primeiro EP, ‘Povo Sagrado’, data de 1970 e, desde então, só fez uma pausa na carreira no pós-25 de Abril porque, explica, nessa fase “tudo foi feito para denegrir o fado”.
Aproveitando este interregno, António Pinto Bastos teve a oportunidade para terminar o curso de Engenharia Mecânica no Instituto Superior Técnico e, ainda, trabalhar 10 anos como engenheiro.
Como é ser fadista no século XXI? As novas gerações continuam a gostar de fado?
Se falamos de quem é, de facto, fadista, direi que é igual ser fadista no séc. XIX como ser no séc. XXI. Um verdadeiro fadista canta fado e sente-se um elo de uma corrente. O que acontece, mais modernamente, é encontrarmos muito quem cante fados e seja um aro desgarrado. Mas nas novas gerações há muitos jovens que gostam, de facto, de fado.
O fado continua a ter capacidade para se reinventar?
Sim, o fado vai-se reinventando. Sobretudo nas letras, uma vez que se vai continuando a cantar os velhos fados (que se adoptou chamarem-se tradicionais) com novas letras e isso é uma das riquezas do fado. No outro fado, o chamado fado canção ou fado musicado, também vão sempre surgindo inovações. Aqui é que se pode discutir o que se vai afastando dos cânones fadistas.
Considera que o fado é bem promovido no estrangeiro, nomeadamente junto da diáspora?
No estrangeiro, junto da diáspora, é onde vai acontecendo mais fado porque são as próprias comunidades a contratarem os fadistas e não por qualquer tipo de apoio. Quanto ao fado ser, ou não, bem promovido no estrangeiro, francamente, nem dou por essa possível promoção. Apenas posso encontrar como mencionáveis as acções individuais de um ou outro agente, promovendo um ou outro artista.
Na sua opinião, o fado, enquanto Património Cultural e Imaterial da Humanidade e parte integrante da cultura portuguesa, é devidamente valorizado e apoiado pelo Estado?
Um pouco na sequência da resposta anterior, confesso que não me apercebo de qualquer tipo de valorização e/ou apoio do Estado. O fado é, efectivamente, um valor da cultura de Portugal e repare-se que é, no campo musical, a única expressão exclusivamente portuguesa (e mais algum folclore, é certo) e eu diria, mesmo, no campo de todas as artes (as sete, em que a música é apenas uma) que o fado é a única arte exclusiva e genuinamente portuguesa sem imitar, seguir ou apenas ser paralela a outras artes de qualquer espécie. Como tal, deveria ter uma protecção especial e cuidada por parte do Estado.
Para além dos apoios que já existem, que outros incentivos deveriam ser concedidos aos músicos de língua portuguesa?
Não existe qualquer tipo de protecção a nível de Segurança Social. No IVA existe uma mínima protecção para os chamados recibos “verdes” mas, se o artista quiser ter a chamada “escrita organizada”, já tem que estar sujeito ao IVA, de 23%. Não há qualquer tipo de protecção no caso de doença (excepto para alguns – poucos – casos de fadistas com contracto). Não existe qualquer tipo de “licença de paternidade” ou coisa que o valha. Por tudo isto, os escalões de IRS dos fadistas poderiam ser “especiais” mas não, são iguais a qualquer outro que tenha as regalias que não têm os fadistas. A reforma de um fadista que tivesse provas claras de uma carreira ao serviço do fado e, portanto, da cultura portuguesa, poderia e deveria ter uma “gentileza” do Estado. E mais haverá, seguramente…
Já tem mais de 50 anos de carreira dedicados ao fado. Que planos tem para o futuro?
É verdade, já passei dos 50 anos de carreira! Ainda que tenha tido um período de interregno pois, como sabemos, após o 25 de Abril, tudo foi feito para denegrir o fado e este fez o que podemos chamar uma “travessia do deserto”. O fado quase que atingiu o estatuto de clandestinidade! O que é certo é que, por aqueles que se mantiveram activos e pela força que o fado tem, de verdade, na tal cultura portuguesa, nos anos 80 os portugueses voltaram a “lembrar-se” de que tínhamos o velho fado e, a partir daí não mais deixou de crescer. Esse tempo de “clausura” em relação ao fado (sempre o fui cantando, em diversas tertúlias e um ou outro contracto – até cheguei a estar, cinco semanas, em 1979, nos Estados Unidos) permitiu-me terminar o meu curso de Engenharia Mecânica no Instituto Superior Técnico e, ainda, trabalhar 10 anos como engenheiro. E foi em 1988 que gravei o L.P. ‘Rosa Branca’ que levou a que o engenheiro ‘arrumasse as botas’ e passasse a ser fadista a tempo inteiro. Desde então, não parei nem interrompi a minha carreira. Respondendo, pois, mais directamente à pergunta, apenas posso dizer que os meus planos são de… continuar! Assim, já estou a pensar na próxima gravação e vou fazendo os meus espectáculos, nomeadamente o que tenho agora bem preparado que é o espectáculo de comemoração dos 50 anos da carreira.