“A França é um exemplo. Começa num dos hemisférios, destrói o que existia desse hemisfério, passa a haver uma realidade diferente, e depois atinge o outro hemisfério. Isso não aconteceu em Portugal, mas é bom que não aconteça”, declarou Marcelo Rebelo de Sousa, na Fundação Calouste Gulbenkian, em Lisboa.
O chefe de Estado fez este alerta a meio de um discurso no Congresso Nacional dos Economistas: “É bom que não aconteça. É bom que no termo deste ciclo que estamos a viver, e é um ciclo presidencial e parlamentar que termina praticamente ao mesmo tempo, não se inicie um ciclo marcado pela fragmentação nos dois hemisférios político-partidários”.
“É um problema real, que existe, não vale a pena negá-lo. Só tem solução se realmente o sistema partidário souber enfrentar, nomeadamente aqueles que têm a obrigação de liderar os respetivos hemisférios, lidar com as novas realidades, que surgiram, que emergiram”, considerou.
Marcelo Rebelo de Sousa acrescentou que “não seria bom, em termos de planeamento estratégico, nomeadamente económico, que a um ciclo de tendencial estabilidade, apesar das várias crises externas sofridas, se sucedesse um ciclo composto por miniciclos governativos com fragmentações partidárias e imprevisibilidade no funcionamento do sistema político”.
No seu entender, tem havido “estabilidade no sistema político, no geral, no geral, quer no sistema político-partidário, quer estabilidade na coabitação, que já vai em oito anos e o normal é que dure dez anos”, mas “há sinais preocupantes”.
“Fica expressa a minha preocupação, que já é antiga, vem de 2018, mas que é cada vez mais evidente. E há pouco tempo, porque estamos a dois anos do fim deste ciclo – mais coisa, menos coisa, uma vez que a parte final do ciclo é um enorme ciclo eleitoral marcado naturalmente por todas as incidências desse ciclo eleitoral”, concluiu.
Antes, o Presidente da República lembrou que já há algum tempo vem alertando para a importância das alternativas em democracia. “Esbocei o primeiro sinal preocupante em 2018”.
“Só há democracia se houver alternativas”, reiterou, sustentando que quando partes do sistema “sistematicamente entram em fragmentação e em deterioração”, então “todo o sistema é atingido, mais tarde ou mais cedo”.
Neste discurso no Congresso Nacional dos Economistas, depois de ouvir o ministro das Finanças, Fernando Medina, o chefe de Estado voltou a elogiar a proposta de Orçamento do Estado para 2024, que qualificou como “um exercício subtil, lúcido, limitado, condicionado, num período dos mais complicados das últimas décadas, mas salvaguardando dentro do possível o presente e pensando dentro do viável o futuro”.
No seu entender, nesta matéria quem está “num dos partidos moderados do hemisfério que não está no poder” confronta-se com “o apelo de propor alternativas muito diferentes, e depois sentir que a conjuntura, as circunstâncias do momento não permitiriam muito diverso daquilo que está a acontecer”.