Nos últimos dias, o Senado – de maioria democrata – conseguiu aprovar um pacote de ajuda de cerca de 80 mil milhões de euros destinados à Ucrânia e a Israel, mas bastou uma palavra crítica de Trump sobre essa medida para que a maioria republicana na câmara baixa do Congresso ameaçasse novo impasse sobre a matéria.
Também sobre política de imigração – onde o Presidente Joe Biden reconheceu a necessidade de introduzir modificações, perante uma escalada de entrada de imigrantes ilegais pela fronteira com o México – Trump tem dado instruções para que os republicanos não facilitem a vida à Casa Branca, criticando a forma como o líder da maioria na Câmara de Representantes tentou misturar esse tema com a ajuda à Ucrânia e, de novo, bloqueando ambos os temas.
“A verdade é que Trump é hoje o dono e senhor do Partido Republicano, como se viu recentemente no fracassado pacote de ajuda externa (a países como a Ucrânia) que continha leis e medidas mais duras contra a imigração ilegal”, explicou à Lusa Nuno Gouveia, especialista em política norte-americana.
Este analista recorda que o bloqueio foi meramente tático, para impedir que Joe Biden ganhasse pontos para a sua campanha de recandidatura às eleições presidenciais de novembro, sobretudo numa matéria que tem sido uma das bandeiras políticas dos republicanos.
A capacidade de controlo dos republicanos por parte de Trump explica-se com o seu forte enraizamento na base eleitoral do partido, o que lhe tem permitido anular qualquer adversário interno à sua própria recandidatura à Casa Branca.
“Todos têm receio de enfrentar algum oponente nas primárias que seja apoiado por Donald Trump ou de perder acesso à corte de Trump. Os custos de enfrentar Trump podem ser elevados, como viram Elizabeth Cheney ou vários outros que perderam os seus lugares”, explica Nuno Gouveia.
Trump tem pessoas de confiança nos lugares-chave do partido e controla ainda a sua máquina administrativa, para além de ter tomado conta dos principais financiadores e dos canais de comunicação, que são plataformas essenciais para uma campanha.
Ao mesmo tempo, como lembra Ana Isabel Xavier, investigadora de Relações Internacionais, Trump é um ativo muito útil para os republicanos, na sua tentativa de não perderem peso político no Congresso.
“Recorde-se que já em outubro de 2023, os republicanos procuraram o apoio de Trump para chegarem à liderança da Câmara dos Representantes, após 20 dias de paralisação. Foi mais uma ilustração clara de que Trump domina alguns estados e vários congressistas-chave”, explicou à Lusa esta analista, concluindo que “a polarização da América não se vai resolver com as próximas eleições”.
Este efeito de controlo de Trump sobre o Partido Republicano, contudo, tem bolsas de resistência, em particular no Congresso.
Nuno Gouveia deteta três tipologias de republicanos no congresso: “a minoria resistente”, que se encontra sobretudo no Senado, com figuras como Mitch McConnell, o líder da minoria nessa bancada, mas também Mitt Romney, Susan Collins ou Lisa Murkowski; os fiéis seguidores do ex-presidente, que constituem o núcleo duro da bancada da Câmara de Representantes; e uma terceira corrente, dos que contestam Trump e criticam as suas táticas, mas seguem a sua liderança, por motivos táticos.
Para este analista, apenas uma derrota de Trump nas eleições presidenciais de novembro poderá colocar em causa esta hegemonia do ex-Presidente sobre o Partido Republicano, mas sem fazer desaparecer o ‘Trumpismo’, porque esse já deixou as suas sementes.