Cluny diz que é preciso repensar funcionamento do MP e intervenção do juiz de instrução

O magistrado António Cluny defendeu hoje que é necessário repensar algumas normas do processo penal, a organização dos tribunais de instrução criminal, os poderes do juiz titular do inquérito, mas também o funcionamento do Ministério Público.

© DR

 

Em declarações à agência Lusa nas vésperas do Congresso do Sindicato dos Magistrados do Ministério Público, que começa na quinta-feira em Ponta Delgada, o procurador-geral adjunto jubilado e ex-presidente do sindicato comentou os efeitos na Justiça do processo Influencer e do caso da Madeira, que suscitaram críticas das magistraturas, dos advogados e da classe política.

Para António Cluny, deve analisar-se “com atenção aquilo que aconteceu” e iniciar-se uma reforma que permita à justiça “dar uma imagem mais segura e coerente de si própria e, ao mesmo tempo, mais eficiência e maior rapidez no tratamento dos processos”.

O magistrado defendeu também um maior rigor na definição dos diversos tipos legais de crime, nomeadamente da criminalidade económico-financeira, e critérios mais rigorosos e apertados na escolha de magistrados para lidar com tais processos, propondo uma formação ou especialização prévia em domínios que abrangem a corrupção e a criminalidade mais complexa.

“Era importante que, não só os magistrados do Ministério Público (MP), como os juízes que vão integrar os tribunais, onde estas questões se colocam com mais acuidade, tivessem essa formação”, disse.

No caso dos juízes de instrução criminal (JIC), devido ao seu “duplo papel” de “juiz das liberdades” e “juiz de instrução”, só deviam ser admitidos a concurso aqueles que tivessem formação especial nesta área.

Na sua perspetiva, é também preciso rever e repensar o funcionamento do Ministério Público, nomeadamente com uma autorreflexão sobre metodologias , sobre as leituras que se fazem da prova, sobre a maneira como se articulam os factos nos processos e sobre a capacidade que o MP tem ou não tem de, a partir do processo de inquérito e da formulação da acusação, apresentar a julgamento casos suficientemente sólidos e bem estruturados.

“Muitas vezes fico com a sensação de que quem deduz a acusação, e o fez convictamente e com algum rigor, o fez na perspetiva da peça literária que acabou de escrever, sem a pensar como instrumento para a reprodução da prova em julgamento”, observou.

Segundo Cluny, face ao figurino do Código de Processo Penal (CPP) é “muito mais importante a maneira como a produção da prova se vai realizar em julgamento do que a lógica interna da acusação para si própria”.

Ou seja, explicou: “Todo o inquérito, toda a acusação não pode servir para formar apenas a convicção de quem acusa, mas para convencer o tribunal onde o julgamento vai ocorrer”.

“Temos de repensar a maneira como fazemos as acusações para que elas não se limitem a ser entendidas como uma fase terminal de uma determinada fase processual (instrução, inquérito), mas tem de ser pensada como algo que vai ser escrutinado num determinado tribunal de julgamento e nesse teatro de julgamento a peça tem de fazer sentido”.

Questionado sobre o papel da hierarquia do MP nessa problemática, ou o défice dessa intervenção, Cluny alertou que “tem havido um excesso de autoconfiança das estruturas internas do MP”, assinalando que “o relacionamento interno entre magistrados é muito fundado nessa autoconfiança que cada um tem sobre o seu próprio trabalho”.

O magistrado recordou que, quando esteve no Tribunal de Contas e teve de “dar uma acusação muito complicada”, pediu ao Procurador-Geral que lesse o processo para ver “se tinha razão ou não”.

“Eu próprio achei que o processo era demasiado importante para ser só eu a ler o processo e só eu a optar pela decisão que me parecia a mais curial”, lembrou.

Desde essa altura, referiu, entende “ser importante que os magistrados mais experientes (…) funcionem junto das equipas que fazem a investigação” para “suscitarem o contraditório”, evitando surpresas na fase de julgamento.

Últimas do País

As burlas foram responsáveis no ano passado por um prejuízo patrimonial superior a 65 milhões de euros, menos 41% face a 2023, uma diminuição que acompanha o decréscimo das denúncias deste tipo de crime em 2024, revela a PSP.
Recusou abandonar o hospital após alta clínica, intimidou profissionais de saúde e chegou a exigir casa e cirurgia inexistente. O caso arrastou-se durante meio ano no Hospital Amadora-Sintra e só terminou com intervenção policial.
A PSP deteve nos últimos dias no Aeroporto Humberto Delgado, em Lisboa, três cidadãos estrangeiros procurados internacionalmente por crimes sexuais, fraudes e burlas transnacionais, e captação indevida de depósitos, anunciou esta sexta-feira a força de segurança.
Portugal registou um aumento de infeções respiratórias graves, sobretudo nos maiores de 65 anos, e excesso de mortalidade na região Norte em pessoas de 75 a 84 anos, revelam dados do Instituto Nacional de Saúde Ricardo Jorge (INSA).
Agentes da PSP foram alvo de apedrejamento no Bairro da Cova da Moura, depois de tentarem intercetar uma viatura em fuga. Os suspeitos escaparam, mas deixaram para trás indícios de crime.
Dezenas de repartições de Finanças estão encerradas durante a manhã de hoje, até às 13h, e outras enfrentam constrangimentos no atendimento, enquanto decorre uma reunião ‘online’ de trabalhadores da Autoridade Tributária e Aduaneira (AT) para discutir reivindicações salariais e laborais.
Uma mulher de 60 anos foi constituída arguida pela GNR por utilização indevida de cartão bancário na aquisição de vários bens, num valor superior a 3 mil euros, no concelho do Sabugal.
O segundo dia de greve dos trabalhadores da função pública estava às 09:00 de hoje a ter uma adesão elevada, com 75% na educação e 90% nas cantinas das universidades e politécnicos, disse à Lusa fonte sindical.
Os doentes classificados como urgentes no hospital Amadora-Sintra enfrentaram hoje de manhã tempos de espera que rondava as 12 horas para a primeira observação, segundo dados do portal do SNS.
O desaparecimento de uma bebé no Hospital de Gaia não mostrou apenas uma falha de segurança: revelou um mercado milionário sem escrutínio, contratos feitos à porta fechada e sistemas supostamente infalíveis que afinal podem ser contornados.