Na noite de 27/28 de Setembro de 1974 e nos dias seguintes foram presas centenas de pessoas, civis e militares, a maior parte surpreendidas a dormir em suas casas. Era a esquerda revolucionária em acção, a agir da mesma forma que tanto criticaram a PIDE. Entre os presos estava Kaúlza de Arriaga. Os mandatos de captura, emitidos por Otelo, Vasco Gonçalves e Costa Gomes, muitos assinados em branco referiam o crime de “associação de malfeitores”, criação do Dr. Salgado Zenha.
A maioria dos presos foi conduzida para o Forte de Caxias, tendo quase todos os militares sido transferido para a Prisão Militar de Trafaria. Na generalidade dos casos não houve culpa formada, nem interrogatórios formais.
Com esta prisão o General viu as suas contas congeladas, o que o obrigou a enviar os filhos para Paria, por uma questão de segurança.
Kaúlza de Arriaga, à data do 25 de Abril era General no activo, em comissão na Presidência do Conselho de Ministros exercendo o importante cargo de Presidente da Junta de Energia Nuclear. Era também membro do Conselho Ultramarino no Ministério do Ultramar e administrador por parte do Estado na companhia de petróleos “Angol”. Desempenhava ainda as funções de vogal do Conselho da Ordem de Cristo.
Foi comandante das Forças Terrestres em Moçambique (1969-1970) e foi Comandante em Chefe das Forças Armadas em Moçambique (1970/1973).
Como militar, esforçou-se na reforma dos sistemas de recrutamento e de treino, preocupou-se com a modernização dos transportes aéreos militares e incentivou o Corpo de Tropas Paraquedistas e a sua integração na Força Aérea. Ficou conhecido principalmente pelas campanhas militares que comandou em Moçambique, durante a Guerra do Ultramar, sobretudo na grandiosa Operação Nó Górdio (1970), que resultou num enorme sucesso militar que chegou a ser publicamente admitido pela FRELIMO que como consequência dessa operação moveu o seu esforço de guerra para a zona de Tete.
Antes, logo após o golpe de estado do 25 de Abril, a Junta de Salvação Nacional nas pessoas de Costa Gomes e Spínola, determinaram a sua passagem compulsiva à reserva vulgo “saneamento”, sem nunca ter sido apresentado qualquer razão para tal saneamento.
Após mais de 14 meses preso, o Conselho da Revolução não pode deixar, embora tardiamente, de reconhecer que o General estava detido sem culpa formada. Pretendeu libertá-lo com a condição de partida imediata para o estrangeiro. De acordo com os seus princípios éticos e apesar de tão absurda e longa prisão, o General recusou em absoluto uma liberdade condicionada, continuando detido.
Por fim e mais de 41 dias de prisão, em 21 de Janeiro de 1976, foi libertado, sem quaisquer explicações ou reparações. O tempo total de prisão perfez cerca de 16 meses. Durante esse período o general esteve isolado em cela individual 43 dias, depois em cela colectiva mas impedido de contactar quem quer que fosse do exterior, incluindo mulher e filhos e sem assistência jurídica.
Considerada a iniquidade, arbitrariedade e prepotência da sua prisão e na ausência de qualquer explicação ou reparações, após a sua libertação o General decidiu propor uma acção judicial contra o Estado, a 15 de Março de 1977, pedindo a condenação do estado e uma indemnização de 100.001$00, que era à época o minino que se poderia exigir. Só após 6 anos e 1 mês, em1983, veio o Supremo Tribunal Administrativo reconhecer ao Tribunais Administrativos competência para julgarem a causa.
O Estado perdeu a acção e recorreu para o Supremo. O que alegou? “que provado ter o General Kaúlza de Arriaga capacidade, vontade e prestígio bastantes para liderar um movimento contra a descolonização de Angola e Moçambique, se verificava uma situação de necessidade que tornava lícita a prisão do General pelo tempo indispensável para evitar que aquele movimento realmente surgisse”.
O Supremo Tribunal Administrativo, declara improcedente o recurso do Estado e mantém a responsabilidade do Estado pelos danos causados ao General.
E conclui: “Considera ter sido provado que o General Kaúlza de Arriaga tinha realmente capacidade, vontade e prestígio para liderar um movimento contra a descolonização…”.
Silenciaram-no!
“Por outro lado, também involuntariamente, acabaram de me conferir, mantendo-me preso até se consumarem aquelas descolonização e marxização, o privilégio de, com vontade, poder proclamar ser eu uma das poucas pessoas e dos pouquíssimos militares que, nem por acção, nem por passividade ou omissão, tiveram qualquer responsabilidades, directas ou indirectas, na execução do desastre nacional.” Kaulza de Arriaga