Do programa da Festa do Livro Independente da freguesia de Arroios constava um último painel cujo título era ‘2023: Odisseia no Espaço’ e que previa uma conversa com José Pacheco Pereira e Jaime Nogueira Pinto sobre “banda- -desenhada, ficção científica e outros géneros tantas vezes considerados ‘menores’ mas que contribuem para a nossa formação enquanto leitores”.
A simples presença do politólogo e historiador Jaime Nogueira Pinto neste evento foi o suficiente para espoletar a fúria e raiva dos partidários da cultura woke, tendo havido ameaças de protestos e boicote que acabaram por não se confirmar. De acordo com a organização, apenas duas editoras em mais de 70 aderiram ao protesto, mas o evento acabou por decorrer com normalidade.
Em declarações ao Folha Nacional, Jaime Nogueira Pinto referiu ser “curioso que esta dita nova esquerda, que se clama defensora dos novos fracos e oprimidos, pratique estes métodos inquisitoriais iguais aos da Velha Esquerda totalitária”. “Vá lá que reconheceram que eu, apesar de ser ‘extrema-direita’, penso, o que só deve ser uma circunstância agravante para futuro auto- de -Fé, por pecados mortais vários contra os mandamentos das Letras, pronomes, géneros inclusivos e exclusivos”, acrescentou o historiador.
Na senda da polémica, a presidente da junta da Freguesia de Arroios, Madalena Natividade, em declarações ao Observador referia que “este é um espaço de inteira liberdade, aqui ninguém pode contar com autores proibidos ou censuráveis, há muitos anos que, felizmente, a censura acabou. Não aceitamos lápis azuis ou vermelhos, ou de qualquer outra cor política.”
Até o insuspeito colega de painel José Pacheco Pereira, acabou por vir em defesa da presença de Nogueira Pinto, de quem é amigo.
“Nunca me passou pela cabeça deixar de vir (…) Conheço melhor as ideias dele [JNP] do que a maioria das pessoas que fizeram este protesto”, referiu, acrescentando que é “completamente contra qualquer tentativa de censura que se tente fazer com um ou outro pretexto”.
Esta não é a primeira vez que o professor de ciência política é censurado. Em 2017 viu uma conferência sobre populismos à esquerda e à direita, na qual participaria e que decorreria na Faculdade de Ciências Sociais e Humanas (FCSH) da Universidade Nova de Lisboa, ser cancelada depois de os alunos terem votado uma moção exigindo o cancelamento do evento, não tendo sido este autorizado pela direção da FCSH/NOVA.
Os exemplos de cancelamento têm sido cada vez mais abundantes no nosso país, tendo o fundador da Prozis, Miguel Milhão, experienciado na pele isso mesmo, depois de se ter manifestado a favor da decisão do Supremo Tribunal dos EUA, que revogou a lei do aborto, vendo muitas personalidades atacarem o seu nome e o nome da sua empresa. Personalidades públicas como a apresentadora da RTP, Rita Belinha, e as atrizes Jéssica Athayde e Marta Melro consideraram as declarações de Miguel Milhão como um atentado aos seus princípios, razão pela qual terminaram a sua relação com a marca.
Na resposta, o fundador da Prozis deixou claro que, “isto não é a Coreia do Norte”, explicando ainda que as “minhas ideias são as minhas ideias”. “A Prozis não tem ideias – é uma empresa que vive para produzir bens e serviços, que tem como objetivo produzir lucro”, acrescentou, sem recuar naquela que tinha sido a sua posição que tanta polémica gerou. “O que me é exigido pela multidão é que peça desculpa e mude de opinião. Querem controlar a minha mente. Não o permitirei”, acusou, declarando ainda não ter medo de retaliações.
Até Eça de Queiroz, um dos nomes maiores da literatura portuguesa, começa a ser alvo de uma tentativa de lavagem literária. Isto porque uma investigadora cabo-verdiana, professora de Português nos Estados Unidos, identificou em ‘Os Maias’ várias passagens que descreveu como “racistas”, razão pela qual considera que a obra deve conter uma nota pedagógica a alertar para as mesmas referências.
A verdade é que, passo a passo, a cultura woke está a deixar um rasto de destruição notável e é um verdadeiro atentado à liberdade de expressão, ancorando-se na sua grande maioria em forças de extrema-esquerda que recorrem a todos os expedientes para calar quem pense diferente, um pouco à semelhança do que acontecia no Estado Novo com o chamado ‘lápis azul’ da censura.