Todos os anos, o ritual repete-se para milhares de jovens: setembro aproxima-se, os resultados do concurso nacional de acesso ao ensino superior confirmam a colocação numa cidade diferente e, então, começa a procura de casa.
A falta de camas em residências públicas obriga milhares de estudantes a procurar alternativas, mas a oferta reduzida e o elevado custo das rendas empurra muitos para um mercado paralelo de arrendamento ilegal, sem contrato e sem recibos.
Aquela que, para alguns, é a única solução, acaba, no entanto, por excluí-los dos apoios ao alojamento, alerta o presidente da Federação Académica do Porto (FAP).
“Temos um complemento ao alojamento, mas, sem recibo, os estudantes não conseguem usufruir deste apoio”, disse à Lusa Francisco Porto Fernandes.
O complemento de alojamento é um apoio pago aos estudantes bolseiros deslocados que não obtenham vaga nas residências públicas e varia entre 264,24 euros e 456,41 euros, em função da cidade.
A partir do próximo ano letivo, os estudantes deslocados sem bolsa, cujo rendimento ‘per capita’ da família varie entre 836 euros e 1.018 euros mensais, vão também receber um apoio ao alojamento correspondente a 50% do valor do complemento atribuído a bolseiros.
Neste caso, o Governo prevê que a medida, com um custo anual de 32 milhões de euros, possa chegar a mais de 13.000 estudantes não bolseiros.
No entanto, o regulamento exige a apresentação de recibos de renda, que muitos não têm.
Já em 2022, um inquérito realizado pela FAP revelou que 52% dos estudantes deslocados não tinham contrato de arrendamento e essa realidade mantém-se.
“A solução não é o Estado ser conivente com a evasão fiscal. O Estado tem de investir em fiscalização”, defendeu o presidente da federação académica.
Uma auditoria de desempenho ao controlo tributário no âmbito do arrendamento imobiliário, realizada pela Inspeção-Geral de Finanças em 2023, mostrou precisamente que essa fiscalização está a falhar.
De acordo com o relatório divulgado em julho, a Autoridade Tributária e Aduaneira não tem um plano abrangente de controlo do arrendamento ilegal que integre as denúncias e a informação sobre os contratos de água e energia que as empresas fornecedoras estão obrigadas a enviar-lhe, nem conhece o universo de denúncias recebidas.
Por outro lado, Francisco Porto Fernandes entende que não existem incentivos suficientes para que os proprietários disponibilizem as casas para alojamento estudantil e dá o exemplo da sua cidade.
“No Porto, temos cerca de 750 camas para estudantes e 10 mil alojamentos locais. É um bocado chocante”, classifica o representante dos estudantes, que fala ainda em “preços proibitivos”.
No dia em que são conhecidos os resultados da 1.ª fase do concurso nacional de acesso, as rendas médias dos quartos rondam os 386 euros no Porto e chegam aos 480 euros em Lisboa, segundo o Observatório do Alojamento Estudantil.