Relativamente à inconstitucionalidade dos decretos-lei apresentados pelo Executivo de António Costa, cabe referir que já em junho passado a Procuradoria-Geral da República requereu a fiscalização da constitucionalidade do diploma do Governo que determina o aumento do limite anual do trabalho suplementar para os médicos. Esta iniciativa pretende que os médicos possam fazer mais de 150 horas de trabalho extraordinário anualmente.
Mas existem mais queixas de inconstitucionalidade. A Federação Nacional dos Médicos (FNAM) já requereu ao Presidente da República que peça a apreciação preventiva do diploma que aprova o novo regime de dedicação plena para os médicos a exercer no Serviço Nacional de Saúde.
“Em ofício enviado ao Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, a FNAM concretizou o pedido de fiscalização preventiva da constitucionalidade da legislação que o Governo pretende aplicar relativa à dedicação plena”, anunciou o sindicato em comunicado de imprensa divulgado nesta terça-feira.
A FNAM acusa ainda o Ministério da Saúde de não cumprir a lei, uma vez que a tutela não tem respondido às suas tentativas de contacto.
“Apesar de ter solicitado ao ministro da Saúde, no passado dia 15 de setembro e novamente no dia 29, a versão final do texto legal aprovado em Conselho de Ministros, a FNAM não recebeu, até à presente data, o documento em causa, não obstante o prazo legal de 10 dias fixado para o efeito”, lê-se no comunicado, no qual a Federação acrescenta ainda que, “se nada for feito para travar as intenções do Ministério da Saúde, a Dedicação Plena vai ser conhecida como o que faltava para a Destruição Plena do Serviço Nacional de Saúde”.
Quem também já anunciou que vai apresentar uma queixa em várias instâncias contra o Governo e contra o ministro da Saúde foi o CHEGA.
“Vamos avançar com uma queixa formal, quer ao Tribunal Constitucional, quer à Provedoria de Justiça, por violação do direito dos cidadãos à saúde” que é um direito consagrado na Constituição da República Portuguesa no seu artigo 64º, explicou André Ventura.
O Presidente do terceiro maior partido português explicou que esta “era uma ideia que já vinha sendo amadurecida no grupo parlamentar” e que surgiu por “sugestão do nosso deputado da comissão de saúde, Pedro Frazão”.
“É algo que decidimos dar entrada quando vimos que, apesar de todas as contingências, o Governo simplesmente promove e prolonga negociações de forma artificial”, acrescentou.
André Ventura sublinhou que a forma como o Governo, e em especial o ministro da Saúde, tem gerido o caos na Saúde, é “uma verdadeira violação do direito à saúde”, nomeadamente devido ao encerramento de urgências.
“É importante que os tribunais e a senhora provedora deem um sinal ao Governo de que isto não vai ser tolerável muito mais tempo. O Governo tem de agir e nós estamos dispostos a ir até às últimas consequências para que o Governo proteja a saúde dos seus cidadãos, o que, neste caso, manifestamente não está a fazer”, vincou.
André Ventura anunciou também que o partido vai voltar a propor “chamar de urgência ao parlamento” o diretor executivo do Serviço Nacional de Saúde, Fernando Araújo.
“A situação começa a ficar absolutamente insustentável. Esperamos que o PS não rejeite a audição do senhor diretor executivo do SNS”, finalizou.
As negociações falhadas com os vários sindicatos do setor da Saúde têm criado vários constrangimentos de norte a sul do país.
O Sindicato Independente dos Médicos já anunciou que vai ser prolongada, até dia 24 de novembro, a greve à prestação de trabalho suplementar. Em causa, a “incompreensível e desrespeitosa proposta” apresentada pelo Governo.
As greves já levaram, inclusivamente, o presidente do INEM a admitir que estas poderão ter consequências também na prestação do INEM porque levará a que existam “meios ocupados durante mais tempo”, o que terá como consequência o alargamento do tempo de resposta do INEM, disse Luís Meira ao Jornal de Notícias.
E quem também já alertou para a situação “muito grave” que se vive foi a diretora do serviço de urgência do hospital da Guarda.
Em declarações aos jornalistas, citada pela agência Lusa, Adelaide Campos, alertou para o facto de a situação no hospital da Guarda poder vir a ser “catastrófica” se os médicos se continuarem a mostrar indisponíveis para realizar mais horas extraordinárias.
Por seu turno, o bastonário da Ordem dos Médicos pediu uma reforma urgente na estrutura do SNS.
“Precisamos de um novo SNS. A estrutura da população mudou. Temos uma população muito mais envelhecida e mais exigente do ponto de vista do cuidado. Temos uma ciência, uma tecnologia e uma medicina que evoluíram muito nas últimas décadas, mas parece que os nossos governantes olham para o SNS como há 40 anos”, afirmou à Lusa Carlos Cortes.
Este caos que impera nos hospitais portugueses mantém-se há mais de um ano. Recorde-se que foi esta situação, agravada pela morte de grávidas e recém-nascidos, que levou à demissão da anterior ministra da Saúde, Marta Temido.
A mudança de ministro não trouxe mudanças significativas ao SNS e continuam a ser noticiados casos de pacientes que morrem por falta de atendimento hospitalar devido ao encerramento de diversos serviços de urgência em todo o país.