Da Rede Nacional de Cuidados Continuados fazem parte instituições públicas e privadas. O Estado tem cumprido as promessas feitas nos últimos anos com o financiamento a estas unidades? Esse financiamento tem acompanhado a inflação?
Não e não. Entre 2011 e 2018 não houve qualquer atualização de preços, em 2019 foi de 2,2%, em 2020 e 2021 voltou a não haver (apenas a Longa Duração em 2021), aumentaram preços em 2022 (insuficiente) e em 2023 voltaram a não atualizar preços quando todos sabemos que o salário mínimo subiu. De realçar que durante a pandemia nem 1 cêntimo nos foi dado de reforço; na crise energética houve apoios para as empresas e nós ficámos de fora; há legislação de 2007 que obriga o Governo a atualizar preços com base na inflação e o Governo em 2023 não cumpriu, mas aumentou os preços das PPP Rodoviárias em 7,8% (precisamente o valor da inflação de 2022). Isto é uma discriminação.
Como classifica a capacidade de resposta ao nível da Rede Nacional Cuidados Continua- dos no nosso país? E o que esperar das promessas de novas vagas 100% públicas ao abri- go do PRR? São exequíveis?
A resposta é de grande qualidade na sua esmagadora maioria, mas insuficiente face às necessidades do país. Não serão exequíveis por diversos motivos e o principal é que muitas entidades que se vão candidatar ao PRR já têm centenas de camas ao serviço da RNCCI pelo que não serão camas novas (o PRR permite candidaturas a retroagir a 2020), pelo que a meta das mais 5500 camas nunca será atingida. Depois, descontando estas e as camas públicas, mesmo assim serão mais de 3 mil as camas que sobram e, tendo em conta o subfinanciamento, haverá poucas entidades interessadas em investir milhões sabendo que terão prejuízo à partida e não recuperarão esse dinheiro. Num contexto de subida de taxas de juro, aumento do custo dos m2 (a verba a fundo perdido representa apenas 40% do total do investimento) e de muitas organizações já estarem a construir ao abrigo do PARES e em grande esforço, duvido que haja candidaturas suficientes.
Portugal é o terceiro país da UE com população mais envelhecida, o que coloca uma pressão extra nos cuidados continuados. O setor está preparado para aumentar a resposta a este tipo de cuidados?
Não está, precisamente devido ao subfinanciamento. Em vez de o Governo atrair investimento neste sector, desincentiva por não atualizar preços nem cumprir a legislação. O Governo causou, devido ao subfinanciamento, o encerramento de mais de 300 camas em pouco mais de dois anos. Qual a lógica de construir camas novas se encerram muitas das existentes?
Cerca de 40% das vagas da rede de cuidados continuados são ocupadas por ‘casos sociais’, isto é, por utentes sem necessidade clínica, que acabam por sobrecarregar estes serviços. O que poderia ser feito para resolver este problema?
Uma boa liderança e gestão centralizada de colocação de pessoas em Cuidados Continuados, Lares de Idosos, Apoio Domiciliário e, naturalmente, boa articulação com os hospitais, que infelizmente não existe.
Em seu entender, quais as medidas mais urgentes que de- vem ser tomadas para fazer face às dificuldades que as Unidades de Cuidados Continuados enfrentam?
Em primeiro lugar aumentar os valores em 2023 com base na inflação de 2022 (com retroativos a Janeiro). Posteriormente (no espaço de 1 ou 2 meses) analisar os recursos humanos necessários para o bom funcionamento de uma UCCI, quanto custam bens e serviços e depois pagar em conformidade. As UCCI não querem enriquecer com o dinheiro dos contribuintes, mas não querem estar subfinanciadas. Apenas receber o valor justo para fazer bem o seu trabalho sem constrangimentos.
Qual o principal desafio dos prestadores em encontrar recursos humanos?
Há falta de profissionais no mercado de trabalho em áreas como auxiliares de ação médica, pessoal de limpeza, lavandaria e cozinhas a que acresce profissionais mais qualifica- dos como enfermeiros, terapeutas da fala e ocupacionais. Os problemas são a falta de salários atrativos, mas também o facto de muitas pessoas preferirem viver de subsídios ao invés de trabalhar.