“Uma coligação parece-me inevitável”, disse em entrevista à Lusa Virginie Martin, politóloga francesa e professora investigadora na Kedge Business School, que defende que um governo mais radical com a França Insubmissa (LFI, esquerda radical) pode ser “um pouco estranho e contraproducente”.
A grande questão é se “o Partido Socialista vai manter a aliança que fez com a LFI de Jean-Luc Mélenchon”, no âmbito da plataforma eleitoral Nova Esquerda Popular (NFP), porque pode querer avançar com soluções de coligação e “até ao momento, a LFI e os Ecologistas não querem realmente uma coligação, querem cumprir apenas o seu programa, o programa da LFI”, segundo a politóloga.
A coligação de esquerda NFP, que elegeu o maior número de deputados (193) nas eleições legislativas em 07 de julho, tem vindo a pressionar o Presidente francês a formar um novo governo e nomear a economista Lucie Castets como primeira-ministra.
“Não acho que Lucie Castets seja uma ideia muito boa”, afirmou Virginie Martin, referindo que é “um nome estranho”, sem legitimidade política, “que saiu da estranheza que é a NFP, onde tudo passa pela LFI”. A nomeação da economista pode resultar em “levar pessoas que não têm muito conhecimento e pouca experiência política” para o governo, adiantou.
Relativamente à pressão feita sobre Macron, a investigadora considera que estão a “jogar de má-fé”, já que “os mesmos [membros da NFP] que pedem que Macron acelere, quando não conseguiam encontrar um potencial primeiro-ministro diziam que tinham o direito de levar o seu tempo”.
Com o fim da ‘trégua’ devido à realização dos Jogos Olímpicos de Paris, Macron convocou os presidentes dos grupos parlamentares da Assembleia Nacional e do Senado para uma “série de discussões” em 23 de agosto para tentar formar governo.
“Nunca devemos esquecer que em França é o Presidente da República que nomeia o primeiro-ministro. É um poder que lhe pertence (por si só) graças ao artigo 8 da Constituição e nada neste artigo especifica o prazo a que está vinculado”, disse à Lusa Émeric Bréhier, politólogo francês e diretor do Observatório da Vida Política da Fundação Jean-Jaurès.
Sem uma maioria clara, “é necessário encontrar uma coligação eleitoral para se aproximar do limiar fatídico de 289 lugares”, o que pode não significar a escolha de Lucie Castets, porque não “promete estabilidade governamental”, afirmou Émeric Bréhier.
“Nesta fase, estamos perante mais hipóteses do que respostas, muito simplesmente porque em França não temos a cultura do compromisso parlamentar”, referiu.
Segundo o politólogo, pode estar em causa uma nomeação apoiada pela direita e centro-direita, incluindo a maioria presidencial, ou então “um primeiro-ministro de esquerda, mas recusando a NFP”.
“Salvo uma reviravolta espetacular, que não é de excluir, é de esperar que todas as forças políticas reafirmem as suas posições na sexta-feira: a NFP argumentará que existe uma ‘negação democrática’ se o candidato que escolheu meticulosamente [Lucie Castets] não for selecionado; a direita clássica apresentará o pacto legislativo que adotou antes das férias de verão; a maioria presidencial dirá que está pronta para formar uma coligação”, afirmou Émeric Bréhier.
Para o politólogo, é provável que estas reuniões não resultem na nomeação imediata de um primeiro-ministro, sendo que os próximos dias também constituirão “um elemento de tensão suplementar na vida política francesa”.
Já Virginie Martin considera que a nomeação “pode acontecer durante os Jogos Paralímpicos, talvez um pouco antes ou depois”, até ao início de setembro, na medida em que se aproximam prazos orçamentais cruciais em França.