No último plenário da Assembleia Legislativa Regional dos Açores, foi aprovada a segunda alteração ao Decreto Legislativo Regional n.º 28/2011/A, de 11 de Novembro, que estrutura o Parque Marinho dos Açores. Este nome pomposo, no entanto, nada diz aos pescadores e até pode passar despercebido a alguns deles. Por isso, é meu dever, na qualidade de deputado, “traduzir por miúdos” o que está em causa e quais as consequências práticas para os pescadores açorianos após esta aprovação. É preciso que os nossos pescadores compreendam as consequências e o alcance do que foi aprovado com os votos favoráveis da coligação (PSD e os “apêndices”), do PS e do PAN, com a abstenção do BE e com os votos contra do CHEGA e da IL.
Por princípio, o CHEGA está de acordo com tudo aquilo que possa melhorar o rendimento dos pescadores e acautelar o seu futuro. Mas, também por princípio, o CHEGA nunca se vai vincular a políticas vãs, falácias e manipulações e, muito menos, vai permitir que os Açores sejam uma colónia da república e o quintal da Europa. Citando um extrato do poema de um poeta e famoso militante socialista (Manuel alegre): “Mesmo na noite mais triste, em tempo de Servidão, Há sempre alguém que resiste, há sempre alguém que diz não”. O CHEGA disse não.
Com esta legislação, foi actualizada a rede de áreas marítimas protegidas dos Açores, com a sigla “RAMPA”, que por coincidência, pode ser confundida por uma simples “rampa”, daquelas que usamos para subir, ou neste caso, para descer ao “fim dos infernos”, local para onde estamos a condenar a nossa pesca, onde vamos continuar a pagar pelos pecados do “cavaquismo” que desmantelou o nosso sector produtivo, nomeadamente a agricultura e as pescas.
Portugal, após a entrada na então CEE, entendeu que era melhor receber subsídios para abater barcos de pesca (a troco de cedência de quotas de pesca a Espanha e outros países) e pagar para não produzir, tal como fez com a agricultura em que se arrancaram milhares de hectares de vinha a troco de uns vinténs. As consequências e a factura destas políticas destrutivas já estamos a pagar com juros: Portugal atingiu um défice alimentar de 5.222,8 milhões de euros em 2022, registando um agravamento de 1.374,5 milhões de euros face ao ano anterior.
Portugal entrou para a CEE com uma auréola de suspeição pelo histórico de duas bancarrotas (1977 e 1983), e porque a Europa, na altura, exigia disciplina financeiramente – linguagem desconhecida na altura e ainda hoje não entendida pelos portugueses. Por isso, apesar de irmos esbanjando o dinheiro da Europa em betão, corrupção e má gestão, durante muito tempo fomos conhecidos como o “bom aluno da Europa”, situação que vista à distância de três décadas e no caso em concreto da pesca, podemos dizer que éramos “os idiotas úteis da Europa”. Enquanto os nossos “irmãos espanhóis” receberam fundos da Europa para construir novos barcos e plantar vinha e desenvolver a agricultura e as pescas, Portugal recebia dinheiro para abater barcos e arrancar a vinha, hipotecando desta forma o futuro.
Por isso, passadas três décadas, chegamos à situação que temos e que nos envergonha. Espanha tem apenas 60% da área marítima portuguesa. Os Açores têm 56% da área marítima de Portugal. Mas pelos vistos isto não interessa, senão vejamos as quotas de pesca de algumas das espécies mais importantes: Atum Rabilho: Portugal 350 toneladas; Espanha 6300 (18 vezes mais); Espadarte: Portugal 298,12 toneladas; Espanha 2525,88 (15 vezes mais) ; Carapau: Portugal 186 toneladas; Espanha 1878 toneladas (10 vezes mais); Atum patudo: Portugal 100 toneladas; Espanha 42 903 (429 vezes mais). E assim sucessivamente em todas as espécies. Ou seja, Portugal com uma Zona Económica Exclusiva (ZEE) de 1.727,408 km2 (a quinta maior da União Europeia) tem quotas miseravelmente mais baixas que a Espanha que tem de ZEE apenas 1.039.233 km2 – se isto não é uma vergonha, os pescadores portugueses que encontrem outra palavra para melhor descrever isto.
Por isso, os nossos pescadores quando esgotam as suas quotas e ficam em terra a ver passar navios (dos espanhóis, chineses e outros que por aí andam), vêm com estupefação, os barcos espanhóis a pescar nas nossas águas alegremente e a descarregarem o pescado nas nossas lotas. Estamos a criar reservas para servir de viveiros de peixe para os outros virem cá pescar. É esta a triste realidade, é este o nosso triste fado: vamos ser, mais uma vez, os “idiotas úteis da Europa”.
Mas não se pense que não há culpados morais e políticos. Há culpados políticos, nomeadamente quem nos governou na década de 90 e que entendeu que a pesca não interessava ao país, todos os sucessivos governos que desprezaram o sector das pescas não investindo na modernização das frotas, não facilitando a exportação para os mercados internacionais onde o pescado seria mais valorizado e todos aqueles que em vez de ajudarem a desenvolver o sector acrescentaram mais burocracia e empobreceram o sector.
António Guterres é culpado moral, pois como Secretário-geral da ONU promoveu a “agenda 2030” que vai deixar a Europa na penúria, afundada em taxas de carbono e proibições enquanto os países mais poluidores (Estados Unidos, China e Índia), pouco ou nada fazem pelo clima. Vão continuar a poluir e a vender para outros países, como nós, que como “idiotas úteis“ destroem a sua economia, com taxas ambientais (em Portugal já são mais de 1000), com encerramento de centrais eléctricas e com perseguição ideológica à agricultura e pescas a tudo o que não alinhe nesta agenda globalista e empobrecedora.
A União Europeia é responsável pois caminha para o empobrecimento a passos largos, como ficou bastante evidenciado no “relatório Draghi “sobre o futuro da competitividade europeia“, o qual foi tornado público no passado mês de setembro do corrente ano. Numa área tão importante como a descarbonização (mais uma que estamos a dar “tiros nos pés “), diz o seguinte: “a descarbonização e a competitividade devem ser complementares, potenciarem-se mutuamente, evitando o risco de a descarbonização ser contrária à competitividade e ao crescimento “. Traduzido numa linguagem popular, “não podemos afogar o bebé com a água do banho “. Se a Europa continuar a ser a “idiota útil“ do mundo, vai continuar a empobrecer.
Outro culpado é António Costa que já pensando na sua carreira política na Europa, quis dar o exemplo do “bom aluno “e comprometeu-se a antecipar o alargamento até 30% das reservas marítimas protegidas para 2026 quando só o podia fazer em 2030. Nas pescas, como no clima, queremos dar o exemplo, ser o bom aluno, tal como disse o insuspeito socialista Alvaro Beleza há dias atrás: “Somos os totós do clima!”: Portugal suporta custos astronómicos com energias limpas para depois ficar dependente dos países mais poluidores da Terra “.
O governo de Montenegro também é culpado quando votou contra o projecto de resolução Projecto de Resolução 216/XVI/1 apresentado pelo Chega na república que recomendava ao governo que “priorize as negociações para o aumento das quotas de pesca portuguesas, assim como aprofunde conversações com vista à criação de quotas de específicas para as regiões ultraperiféricas. “, ou seja, o governo de Montenegro não quer mais quotas de pesca para os Açores.
O governo dos Açores e a coligação que os suporta são os maiores culpados pois deixaram-se enganar pelo governo da república e anteciparam para 2026 a implementação dos 30% de áreas marítimas protegidas, quando o podia fazer apenas em 2030, ou podia, pelo menos, exigir mais quotas, mais vigilância do mar dos Açores, ter um Plano Estratégico para a pesca credível e um robusto plano financeiro de apoio à pesca. Nada fez e nada tem. Decidiu primeiro proibir e logo se Vê, confiando no governo da república, ou seja “vendendo a alma ao diabo”.
Por isso, disse na assembleia e repito aqui. A RAMPA vai ser uma descida aos infernos. Usei na assembleia uma analogia com a alegoria dramática de uma das mais famosas obras do escritor Gil Vicente “O Auto da Barca do Inferno “, em que todos foram declarados culpados pelo diabo e acabaram por ir para o inferno com excepção dos 4 cavaleiros e do parvo. Com os 5 deputados do Chega a votar contra, disponibilizei-me, naturalmente, para “encarnar “a figura do parvo, em nome dessa suposta salvação, ou seja, do nosso voto contra – a IL também se salvou do inferno, mas não ganhou o céu – estará algures no purgatório por ter votado na especialidade favoravelmente algumas normas.
Mas tragicomédias à parte, o assunto é sério e, infelizmente, serão os pescadores e não os políticos que farão a verdadeira descida aos infernos, pelo empobrecimento, desânimo e abandono a que renegaram os pescadores, hipotecando o seu futuro, com o alargamento e antecipação das áreas marítima protegidas nos Açores.
Os políticos do sistema condenaram os pescadores ao inferno!