Segundo apurou o Página UM, o organismo liderado pelo socialista Manuel Jorge Valamatos adjudicou, por ajuste direto, um contrato de 362.850 euros ao Instituto Politécnico de Tomar (IPT) para a realização de um suposto “estudo técnico especializado” sobre energias renováveis e sustentabilidade. O problema é que o contrato não explica absolutamente nada sobre o que será feito ao longo dos dois anos de vigência. Não define metas, não apresenta plano de trabalhos, não prevê relatórios, metodologia ou indicadores. É, na prática, um cheque em branco académico pago com dinheiros públicos.
O ajuste direto, assinado a 18 de novembro, resume o objeto do contrato a uma única frase: “Estudo no âmbito das energias renováveis e da sustentabilidade.
”Não existe calendarização, não há entregáveis, não há critérios de avaliação. Apenas uma formulação vaga que não permite perceber o que será concretamente produzido com os mais de 360 mil euros transferidos para o Politécnico de Tomar, explica o Página UM. Para evitar um concurso público, a CIMMT invocou a norma excecional do Código dos Contratos Públicos, alegando que apenas um operador económico teria capacidade técnica para executar o estudo. E quem seria esse operador exclusivo?
O Instituto Politécnico de Tomar. Uma ideia difícil de sustentar num país com algumas das melhores instituições de ensino e investigação na área energética — IST, FEUP, Universidade de Coimbra, Évora, Aveiro, Minho, Nova, INEGI, LNEG e muitas outras. Todas ignoradas. Para a CIMMT, nenhuma delas teria capacidade. Só o IPT. A ironia cresce quando se constata que o Politécnico de Tomar tem apenas um CTeSP em Energias Renováveis, um curso técnico de curta duração, e não uma estrutura académica de referência que justifique tamanha exclusividade científica e financeira.
O episódio torna-se ainda mais intrigante quando se recorda que, no início de 2025, a própria CIMMT lançou um concurso público para um estudo semelhante, com preço-base inferior. Esse procedimento desapareceu sem explicação: não há adjudicação, relatório final ou despacho de anulação. Simplesmente deixou de existir. Meses depois, surge este ajuste direto — mais caro, mais opaco e entregue a uma instituição localizada dentro do mesmo círculo político-administrativo da CIM. A justificação de “capacidade exclusiva” passa assim de frágil a absurda. A lei exige prova técnica, documental e metodológica para recorrer a tal mecanismo. Aqui, não há prova alguma.
A CIMMT limitou-se a declarar e adjudicar. E o contrato é ainda mais anómalo: em dois anos de execução, o IPT não tem de apresentar marcos, relatórios, objetivos ou métricas de avaliação. Não há forma de medir, monitorizar ou validar o que será feito.
O contrato é, literalmente, uma folha em branco com prazo de dois anos e custo superior a 360 mil euros. A proximidade institucional e geográfica torna tudo mais sensível. O Politécnico de Tomar está sediado num dos 11 municípios que integram a CIM Médio Tejo.
Quando uma entidade pública adjudica centenas de milhares de euros a uma instituição local, integrada no mesmo ecossistema político, a fundamentação e o escrutínio deveriam ser máximos.
Aqui, são inexistentes. A situação levanta também questões de concorrência e conformidade legal. Especialistas em contratação pública consultados pelo Página UM consideram improvável que esta adjudicação preencha os requisitos legais de exclusividade técnica, frisando que “a ausência total de fundamentação pode configurar violação do Código dos Contratos Públicos” e justificar intervenção do Tribunal de Contas.
A própria entidade fiscalizadora tem, nos últimos anos, emitido pareceres críticos sobre o uso arbitrário de ajustes diretos por parte de autarquias e comunidades intermunicipais, alertando para riscos de favorecimento, ausência de mercado e falta de transparência.