Num despacho, a juíza presidente justificou a decisão com os motivos invocados por uma mandatária, além de que, ainda que o julgamento começasse não terminaria, dado não ser possível a inquirição de uma ofendida, por as autoridades de um país estrangeiro não terem disponibilidade à data de hoje.
Segundo o despacho de acusação, a que a agência Lusa teve acesso, no verão de 2017 ou 2018, na Marinha Grande, quando uma menor, à data com 8 ou 9 anos, se encontrava em casa de familiares, uma das quais era companheira do arguido, este, que também aí morava, dirigiu-se ao quarto onde aquela estava.
Então, o suspeito, de 35 anos, estrangeiro e atualmente em prisão domiciliária, tirou diversas fotografias com o telemóvel à zona genital da menor, tendo ainda tocado na sua vagina.
Uma segunda situação, no concelho de Leiria, ocorreu após o homem ter iniciado um relacionamento amoroso, em 2021, com uma mulher com dois filhos menores, passando a residir na residência destes no ano seguinte.
O Ministério Público (MP) explicou que, “no âmbito da relação criada, era muitas vezes o arguido que ia buscar os menores à escola e ficava a tomar conta deles”, sendo que os cuidados incluíam dar banho e alimentá-los “como se de progenitor se tratasse”.
Em dezembro de 2021, quando o menino com 5 anos tomava banho, o acusado, com o telemóvel, “efetuou 13 fotografias com planos aproximados da região anal”, lê-se no despacho do MP.
Já entre julho e outubro de 2022, o homem fotografou e filmou a menor, então com 8 ou 9 anos de idade, nua e seminua, “em planos aproximados da sua zona genital (vaginal e anal) e nádegas”.
Entre outros pormenores apresentados pelo MP destaca-se um, quando o “arguido filmou-se a masturbar-se, a ejacular para uma taça com cereais e iogurte, e, ato contínuo, a dar essa taça, que continha o seu esperma, à menor, e a menor a comer o descrito conteúdo”.
No telemóvel do arguido foram encontrados “vários ficheiros de imagem, com as fotografias e vídeos mencionados” destas duas crianças, assim como mais 21 ficheiros, “sendo 13 fotografias e oito vídeos, envolvendo crianças, apresentando nudez total ou parcial e/ou exibição lasciva dos órgãos genitais, alvo de condutas de natureza sexual sobre si infligidas por adultos, e que incluem a prática de coito oral e relação de cópula vaginal”.
Segundo o MP, o homem arguido agiu com o propósito concretizado de utilizar estas crianças em fotografias e vídeos de cariz pornográfico, para “satisfazer os seus instintos libidinosos”, consciente de que ofendia a liberdade de determinação sexual e colocando em causa o normal desenvolvimento sexual daquelas.
Por outro lado, ignorou e desprezou “a liberdade e autodeterminação sexual das crianças retratadas” nos ficheiros constantes no telemóvel, “ciente de que tais condutas propiciam a exploração efetiva das crianças usadas para a realização das imagens em causa”, demonstrando “uma personalidade avessa ao Direito” e violando, de forma grave, “valores sociais dominantes e fundamentais da sociedade portuguesa”.
Além da condenação por 11 crimes de pornografia de menores, 10 dos quais agravados, e três de abuso sexual de crianças, dois dos quais também agravados, o arguido incorre nas penas acessórias de proibição do exercício de funções por crimes contra a autodeterminação e liberdade sexuais, de proibição de confiança de menores e inibição de responsabilidades parentais, assim como a expulsão do país.
O MP, em representação dos três menores, deduziu pedido de indemnização civil contra o arguido nunca inferiores a 10 mil euros para uma das menores, a sete mil euros para outra e três mil euros para o outro menor.
O julgamento, à porta fechada, deverá começar em outubro por um tribunal coletivo.