Jorge Avelar Froes é Engenheiro Agrónomo desde 1982 e tendo-se dedicado ao Planeamento e Projetos Hidráulicos e Hidroagrícolas de outras Infraestruturas Rurais. Tem inúmeros trabalhos desenvolvidos nesta área e desde 2018 que faz parte da direção da Associação +Tejo, organismo criado para a promoção do Projeto Tejo e da Autoestrada da Água, a nível nacional.
Assistimos cada vez mais a curtos períodos de chuvas intensas e longos períodos de seca, que depois provocam constrangimentos no abastecimento de água, nomeadamente no que diz respeito às culturas de regadio. Qual a solução para este problema?
De acordo com o Plano Nacional da Água 2015, Portugal dispõe, em média, de 12 vezes mais água do que a que consome na rega, abastecimento, industrial, etc. (56.000 milhões m3/ano de disponibilidades, 30% vindas de Espanha, 4.500 milhões m3/ano de consumos).
A longo prazo as disponibilidades reduzir-se-ão (no pior cenário, para 39.000 milhões m3/ano) e os consumos podem subir (até 6.000 milhões m3/ano). Mesmo assim, o País fica a dispor de 6,5 vezes mais água do que a que necessita. No futuro, vai haver menos abundância.
A solução passa por guardá-la no Inverno, quando chove, em barragens, para a distribuir no Verão, quando se rega, e por transferi-la do Norte para o Sul deficitário, através duma “Autoestrada da Água” nacional.
Que modelo de gestão da água deveríamos seguir, de forma a otimizarmos o seu armazenamento?
Face à situação futura expectável, só os grandes sistemas, como Alqueva, Castelo de Bode ou Baixo Sabor, permitem fazer a regularização interanual de caudais.
Existe, assim, a necessidade de integração das grandes barragens num sistema nacional, ligadas por uma rede de adutores e estações elevatórias que permitam a transferência entre elas.
O custo de levar água a todos os Concelhos do País poderá rondar os 10.000 a 15.000 milhões €, mas a verba do PRR Português não chega a 1.000 milhões para a água, enquanto Espanha tem mais de 20.000 milhões €.
É frequente vermos associações ambientalistas manifestarem-se contra a construção de barragens e contra as culturas de regadio, argumentando perda de biodiversidade. Esta posição tem sustentação científica?
As albufeiras das barragens são conhecidas por promoverem fortemente a biodiversidade, muito mais do que as zonas de sequeiro. A questão que os Ambientalistas acabam por pôr é a da alteração dos ecossistemas locais, que passam de sequeiro a zona húmida.
Considero que o problema é mais uma questão de mentalidade “conservadora” e sem soluções, na lógica “o que está, está, não se mexe”, porque quando questiono se podemos “implodir” a barragem do Alqueva ou de Castelo de Bode, a resposta é “não”.
A dessalinização da água é uma solução economicamente viável para ser usada em rega de culturas agrícolas? Ou temos outras soluções mais baratas e exequíveis face à nossa realidade?
A água dessalinizada é uma boa solução para o abastecimento urbano e industrial, que consome água durante todo o ano a um ritmo constante e igual ao da central dessalinizadora e que consegue pagar a água a um custo elevado, vaiável entre os 0,6 e os 1,2 €/m3.
Para a Agricultura este custo é incomportável, e será mesmo maior neste caso, pois só se rega de Abril/Maio a Setembro/Outubro, o que corresponde a cerca de 30% do da produção de água dessalinizada. Os restantes 70%, produzidos nos restantes meses do ano e outros períodos mortos, terão de ser armazenados em barragens, para posterior aproveitamento.
Como classifica a atuação dos sucessivos governos relativamente à gestão da água, nomeadamente da água destinada ao regadio, nos últimos 50 anos?
Se não fosse a importantíssima obra do Alqueva, ainda em construção, mas que é a exceção à regra, diria que o Pais parou há 50 anos, pois a grande maioria dos regadios nacionais foi construída nas décadas de 50 e 60 do seculo passado.
Depois disso, já assisti, regularmente, a fases onde se diz que “agora é que vai ser”, se fazem estudos, se inquire as populações rurais, se organizam grandiosos programas de financiamento, se estabelecem prioridades e depois … ou a crise, ou a mudança de governo, ou, ou, ou … pára tudo! Passados uns anos, recomeça-se do Zero …
Atualmente estamos na fase final dum desses períodos. Já se fizeram os estudos e se inquiriram os agricultores, já existem alguns projetos e outros estão em elaboração, produziram-se grandes quadros de excel com os financiamentos e a respetiva programação mas, “pelo andar da carruagem”, vai tudo acabar em nada! Cai o governo, o dinheiro é desviado para áreas mais necessitadas, os ambientalistas bloqueiam a tomada de decisões, e nada se fará.
Os governantes têm sabido negociar os acordos relativamente aos caudais dos rios que nascem em Espanha, nomeadamente o acordo de Albufeira, ou estes acordos devem ser revistos?
Portugal tem, de facto, o dobro da água per capita relativamente a Espanha, só que mais de 90% vai para o mar.
No dia em que negociarmos o acordo de Albufeira, ficamos pior do que estamos atualmente. Mais uma “fantasia” dos Ambientalistas, que querem que as águas que Espanha armazena de Inverno e nos anos mais húmidos nas suas barragens, pagas pelos espanhóis, seja libertada quando os portugueses precisam … o que respondem eles? Façam as vossas barragens!
E como o clima se agrava, chovendo menos, e os acordos de Albufeira definem os caudais transitados de lá com base na precipitação em Espanha, o que vai acontecer é uma eventual negociação levar à redução desses caudais transitados!
Quantos hectares temos hoje é qual o potencial agrícola português total para culturas de regadio? Qual o impacto no PIB que esse incremento traria ao país?
A agricultura de regadio gera receitas 6 vezes superiores às da agricultura de sequeiro, permitindo que pequenos agricultores subsistam e fixando as populações rurais. Exemplo disso é, entre outras, a região Oeste, com as suas hortícolas e pomares, mas que atualmente está no limite das disponibilidades hídricas, que só podem ser reforçadas a partir do rio Tejo, como se prevê o Projeto Tejo, sobe pena de colapsar, trazendo para Lisboa largos milhares de pessoas.