O antigo ministro Mário Centeno disse hoje que quando saiu do Governo, em 15 de junho de 2020, a expectativa era que a TAP usasse 900 milhões de euros, dos 1.200 milhões aprovados por Bruxelas cinco dias antes.
“No dia em que saio do Governo, a expectativa era que fossem usados 900 milhões de euros, ainda que na empresa já se falasse em 1.400 milhões de euros”, afirmou o antigo ministro das Finanças Mário Centeno, que saiu do Governo em 15 de junho de 2020, cinco dias depois de a Comissão Europeia ter aprovado um auxílio de emergência à TAP no valor de 1.200 milhões.
O atual governador do Banco de Portugal respondia a perguntas do deputado do PSD João Barbosa de Melo, sobre o auxílio prestado em 2020, na sequência da pandemia de covid-19, que, tratando-se de um empréstimo, pressupunha a sua devolução, o que não aconteceu.
“Tudo estava previsto, tudo o que aconteceu estava previsto no dia 10 de junho, não houve nenhuma surpresa, nenhuma. Era possível, se fosse esse o caminho da pandemia, que a TAP pudesse devolver algum daquele empréstimo. Não era a expectativa”, acrescentou o antigo governante.
Mário Centeno detalhou que se tratou de um empréstimo “ao abrigo de um artigo muito específico do tratado de funcionamento da União Europeia” e, segundo comunicação da Comissão Europeia, a “expectativa base” era que o valor fosse devolvido, mas, não sendo, desencadearia um processo de reestruturação, como veio a acontecer.
“Este não era um empréstimo qualquer, era um empréstimo que tinha uma sequência no caso de ele não ser devolvido e a empresa sabia disso e o Estado, naturalmente, também”, apontou Mário Centeno.
O antigo responsável pelas Finanças apontou ainda que, enquanto foi ministro, a exposição do Estado ao risco da TAP, em termos de garantias, “reduziu-se drasticamente”, de 465,9 milhões de euros em junho de 2017, para 141,9 milhões em 2020.
“Era este o caminho que estávamos a seguir dias antes de a pandemia aparecer e não há nada que deixe mais satisfeito um ministro das Finanças do que reduzir a exposição do Estado ao risco de uma empresa, qualquer que ela seja”, sublinhou.
O PSD perguntou também sobre a comissão paritária de acompanhamento à TAP que estava prevista no processo de privatização, mas que não chegou a ser constituída.
“O facto da dita comissão paritária não existir, mas ela ser tão importante como o senhor deputado aqui releva, talvez justificasse que na pasta de transição pudesse ter sido sinalizada a premência absoluta de estabelecer essa comissão paritária e não foi isso que aconteceu”, respondeu Mário Centeno, que já tinha dito antes que na pasta de transição que recebeu da anterior ministra Maria Luís Albuquerque não constava qualquer referência à TAP, reiterando que no dia em que tomou posse como ministro, em 16 de novembro de 2015, não tinha informação sobre o tema.
E acrescentou: “a urgência não era suficiente para incluir um ponto na pasta de transição ao ministro das Finanças que se seguia. A TAP não era privada, totalmente privada. A TAP tinha capital público ainda e, portanto, talvez houvesse aí alguma contingência adicional para se poder fazer menção disso ao ministro das Finanças”.
Apesar disto, Mário Centeno considerou que entre uma comissão paritária, que faz um acompanhamento externo, e ter sete membros no Conselho de Administração, como fez o Governo que integrou, o segundo modelo “era muito mais eficaz” para efeitos de monitorização da empresa.
“A importância de estar sentado num Conselho de Administração, mesmo quando se é não-executivo, é incomensuravelmente maior, face à alternativa de não estar lá”, defendeu.
No período de inquirição da deputada Rita Borges Madeira, do PS, sobre os chamados fundos Airbus, usados pela Atlantic Gateway para capitalizar a empresa, na sequência da privatização concretizada pelo Governo PSD/CDS-PP, Mário Centeno disse não conseguir responder a perguntas sobre a operação.
“Não consigo responder porque ainda não consegui perceber muito bem o que se passou. […] Soube da existência desse mecanismo, vamos chamar assim, muito recentemente e acho que quando mais ou menos todos tivemos conhecimento”, referiu.
Já questionado pelo deputado do BE Pedro Filipe sobre os 55 milhões de euros pagos ao ex-acionista David Neeleman para sair da companhia aérea, Mário Centeno lembrou que naquele momento não tinha qualquer responsabilidade governativa.
“Não tenho nenhuma visibilidade sobre esse processo e, portanto, seria especulativo. Não lhe consigo ajudar”, respondeu o antigo ministro.