“É avisada a possibilidade de criarmos alternativas nos cuidados de saúde primários. Só pode acontecer em certos locais por médicos que aceitem fazer essa consulta e recebam formação para o fazer. Um processo destes não pode ser de nenhum automatismo. Tem de ser algo feito com rigor técnico”, disse Manuel Pizarro.
O ministro da Saúde falava na Assembleia da República em resposta aos deputados numa audição da Comissão de Saúde que ainda decorre e sobre o tema — “os contínuos obstáculos colocados no SNS para o acesso à IVG [Interrupção Voluntária da Gravidez]” — por requerimento do Bloco de Esquerda.
Manuel Pizarro disse que o Governo reconhece que “há casos pontuais de dificuldades de acesso” que têm de ser resolvidos “casuisticamente”.
“Globalmente é inequívoco que o sistema funciona”, sublinhou.
Sobre a realização deste procedimento em centros de saúde, Manuel Pizarro referiu que “em algumas zonas pode vir a ser útil”, mas frisou que o processo terá de obedecer a normas da Direção-Geral da Saúde (DGS) e por profissionais que recebam formação e estejam disponíveis.
“O direito à objeção de consciência é inquestionável”, afirmou.
Sobre esta matéria, o ministro da Saúde referiu que existem centros hospitalares em que todos os profissionais são objetores de consciência, “um direito inalienável” que não está disponível para ajudar a transpor.
“Da mesma forma que as mulheres têm direito inalienável ao acesso à IGV, os profissionais de saúde têm direito a manifestarem a sua objeção de consciência. Estamos a tratar de uma matéria em que as minhas convicções não têm de se sobrepor às convicções dos outros”, afirmou.
Manuel Pizarro apontou que a realização de IVG em centros de saúde “não é inovadora”, dando o exemplo de Amarante, onde, disse, “há meia dúzia de anos se realizava”.
“Esta medida tem complexidade técnica? Tem, mas não é uma complexidade intransponível. Como tudo pode haver alguma resistência inicial é preciso preparar para que o processo corra bem”, acrescentou.
Pizarro acrescentou que a criação de novas Unidades de Saúde Local (ULS) que está prevista para janeiro pode ser “um contexto favorável” a uma “certa complementaridade” entre os hospitais e os centros de saúde em matéria de IGV.
O ministro da saúde também foi questionado sobre se em Portugal deixará de se realizar o período de reflexão, algo em discussão atualmente já que a Organização Mundial de Saúde não aponta para a utilidade deste período.
“Estamos a trabalhar tecnicamente para ver se há utilidade em modificar os atuais procedimentos”, disse Manuel Pizarro sem entrar em detalhes.
Na audição de hoje, Manuel Pizarro apresentou números que fazem parte dos relatórios recentes da DGS e da Entidade Reguladora da Saúde, entidades que já foram ouvidas pela Comissão da Saúde anteriormente, e além de responder às perguntas dos deputados entrou em discussão com a bancada do CHEGA, quando esta apresentou uma notícia que dava conta da alegada morte de uma mulher no hospital de Cascais devido a uma IVG mal conduzida.
“Não há nenhum registo, desde que foi despenalizado o acesso à IVG em Portugal, de fatalidades ocorridas com o que se chamava de aborto clandestino que antes vitimava todos os anos centenas de mulheres”, garantiu Manuel Pizarro.
Além deste tema, o ministro está a ser ouvido sobre outros como a falta de acesso das grávidas às ecografias obstétricas no SNS (requerimento da IL), a grave situação nas urgências hospitalares (requerimentos do BE) e a reforma do Serviço Nacional de Saúde (requerimento do CHEGA).