No “Relatório de Acompanhamento da Contratação Pública abrangida pelas Medidas Especiais previstas na Lei n.º 30/2021”, hoje divulgado, o TdC dá conta da “expressão pouco significativa” do regime das medidas especiais de contratação pública (MECP) – criado para simplificar e agilizar procedimentos pré-contratuais – e do “prejuízo do recurso a procedimentos concorrenciais abertos” em que se traduz.
Segundo refere, este prejuízo “está ligado, não a situações de urgência imperiosa, mas antes a prioridades políticas e económicas delimitadas de forma genérica e, na grande parte dos casos, de aplicação ilimitada no tempo, sendo contrário aos princípios constitucionais e administrativos, à jurisprudência do Tribunal de Justiça da União Europeia (TJUE), às boas práticas e às recomendações nacionais e internacionais em matéria de contratação pública”.
Neste contexto, o TdC reitera os riscos identificados nos seus dois relatórios anteriores sobre a matéria e defende uma reponderação acerca da “justificação e utilidade” do regime das MECP.
De acordo com o Tribunal, esta reavaliação “deve incluir o regime especial de conceção-construção (pouco utilizado) e medidas especiais sem qualquer aplicação”, assim como a eliminação das dispensas de fundamentação previstas no MECP e a clarificação do regime de proibição de adjudicações sucessivas não concorrenciais aos mesmos adjudicatários e entidades adjudicantes.
Entre 20 de junho de 2021 e 30 de junho de 2024, o Tribunal recebeu informação relativa à celebração de 1.582 contratos ao abrigo de MECP, envolvendo um montante global de 238,8 milhões de euros, a que acrescem 50 contratos submetidos a fiscalização prévia, no montante global de 89 milhões.
Até 30 de junho de 2024 foram ainda comunicadas 79 modificações a 62 contratos MECP, com um montante total de 2,1 milhões de euros, o que representou um acréscimo de despesa de 12% relativamente à decorrente dos contratos iniciais.
Segundo salienta, estes dados revelam que este regime “continua a aplicar-se a um número muito reduzido de contratos” (cerca de 0,38% dos contratos públicos de valor inferior a 750 milhões de euros registados no portal dos contratos públicos no mesmo período), sendo a sua utilização nas regiões autónomas “praticamente nula”.
O TdC detalha que 86,82% dos contratos MECP e 86,50% do montante contratado respeitam a projetos financiados ou cofinanciados por fundos europeus, incluindo no âmbito do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR), sendo que estes últimos respeitam, sobretudo, a aquisições de serviços e foram maioritariamente adjudicados por entidades da administração central a empresas de média, pequena ou micro dimensão.
Da análise do tribunal resulta ainda que o novo regime especial de contratação de empreitadas na modalidade de conceção-construção “foi utilizado num número reduzido de casos, embora de montante elevado” (10 contratos no valor total de 23,9 milhões de euros), e que a utilização de procedimentos não concorrenciais na contratação de MECP “continua preponderante, abrangendo 87,1% dos casos e 64,2% do montante contratado”.
“A aplicação de MECP conduziu a que 39,38% dos contratos tenham sido adjudicados sem o concurso a que haveria lugar nos termos do regime geral”, nota o TdC.
Foram ainda apuradas pelo Tribunal “insuficiências de documentação e fundamentação das decisões”, nomeadamente quanto às necessidades a satisfazer, à escolha das entidades a convidar em consultas prévias e ajustes diretos e à justificação e justeza do preço aceite, sendo que, em 19,97% dos casos, não foi identificada a existência das declarações sobre a inexistência de conflitos de interesses dos intervenientes nos procedimentos de contratação pública.
O TdC refere também que, embora os procedimentos de consulta imponham o convite a cinco entidades para apresentação de proposta, “continuam a ocorrer muitas situações em que parte das empresas convidadas não apresentam proposta”.