A Arte é de Esquerda?

O conceito de arte, como o conhecemos atualmente, é fruto de uma vasta transformação genealógica. Desde os primórdios da civilização, a arte desempenhou papéis essenciais de evangelização, culto e gratificação, quer no contexto da mitologia greco-romana, quer, mais tarde, no período medieval. Como Platão afirma na República, “a arte é um distanciamento da realidade, por isso, é bela”. Para São Tomás de Aquino, “a arte é bela, logo, a arte é de bem”. Durante séculos, prevaleceu essa visão de que a arte servia para exaltar valores superiores: a gratificação divina, a ostentação social e, por vezes, a simples decoração. Até que este distanciamento que hoje em dia conhecemos entre o belo e a arte surge com a Revolução Industrial e o Modernismo. Os acontecimentos mais relevantes e catastróficos da Europa do século XX levaram a uma nova conceção de arte quer para os artistas e quer para os admiradores de arte. A arte passa a ser um instrumento de crítica e provocação por parte do artista.

Enquanto reacionários, ser contra esta transformação nada mais seria do que uma atitude hipócrita, uma vez que, desta metamorfose, surgiu vanguardistas como Fernando Pessoa e Almada Negreiros, autores que ainda hoje admiramos.

Contudo, o problema surge da aliança entre os movimentos artísticos do século XX. e as ideias progressistas que surgem de um período de guerra e opressão. O progressismo assume-se como uma doutrina que visa romper as condutas sociais estabelecidas durante séculos e infelizmente a arte não seguiu imune a esta parasita.

Um exemplo notório é o surrealismo, uma corrente artística frequentemente associada ao marxismo. Artistas como Diego Rivera e Frida Kahlo usaram a sua arte para promover críticas à classe burguesa e enaltecer a luta do povo. A arte passou, assim, a ser vista como um espaço de resistência, rompendo com a noção tradicional do “belo” para explorar o desconforto, o grotesco e o provocador. Essa rutura foi celebrada pela esquerda, que tradicionalmente se posiciona como opositora das hierarquias estabelecidas.

Mas será que a arte deve abdicar da sua vocação de exaltar o belo? A provocação e a crítica têm, sem dúvida, o seu lugar. Contudo, a beleza possui um poder transformador que transcende ideologias. É na harmonia, no equilíbrio e na celebração do sublime que a arte pode elevar o ser humano acima do caos e da banalidade.

Talvez seja hora de refletir sobre o rumo tomado pela criação artística. Em tempos marcados pela fragmentação e pelo ruído, o belo oferece um porto seguro. Retomar à beleza como propósito da arte não significa negar a crítica ou a inovação, mas sim reconhecer que a arte, em última análise, deve servir ao bem e ao engrandecimento do espírito humano.

Assim, conclui-se que a arte pode e deve ser plural, mas não deve esquecer a sua essência: ser bela. Porque é na beleza que a humanidade encontra sentido, inspiração e, muitas vezes, redenção.

 

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