O voo da Air India xom destino a Londres, que se despenhou na quinta-feira passada em Ahmedabad, na Índia, resultou na morte de quase três centenas de pessoas. A bordo seguiam sete cidadãos portugueses que nunca terão estado em território nacional. Segundo avançou a Renascença, as sete vítimas mortais residiam no Reino Unido e terão adquirido a nacionalidade portuguesa sem qualquer ligação direta ao país.
O Ministério dos Negócios Estrangeiros (MNE) confirmou que os sete cidadãos em causa não têm família residente em Portugal e não possuem qualquer ligação ao país para além da nacionalidade adquirida. Cinco estavam registados no Consulado de Londres e dois no de Manchester. “Infelizmente, no acidente de aviação na Índia, vimos o que é ser realmente português”, afirmou, esta terça-feira, André Ventura, no primeiro dia do debate do Programa do Governo, na Assembleia da República.
“Pessoas que nunca tinham estado em Portugal, que não sabiam falar português, mal conseguiam dizer ‘bom dia’, mas chamavam-se a mas chamavam-se a si próprios ‘portugueses, culpa daqueles senhores que Ihes deram o passaporte e que andaram a vender passaportes nos últimos anos, como peras e maçãs nos supermercados”, reforçou o líder do segundo maior partido português.
Ao que a Renascença apurou junto da Polícia Judiciária, trata-se de pessoas que obtiveram a nacionalidade portuguesa mesmo sem nunca terem vindo a Portugal, todas residentes no Reino Unido. Os passaportes datam de 2024 e, entre as vítimas com dupla nacionalidade, estão quatro homens e três mulheres.
O mais velho tinha 58 anos e a mais jovem, 27. Perante este cenário, o Presidente do CHEGA admitiu avançar com uma Comissão Parlamentar de Inquérito, levantando suspeitas de “atribuição criminosa” da nacionalidade portuguesa.
“Quero também dizer ao país que não excluo – e reunirei o grupo parlamentar para isso – apresentar já nos primeiros dias da legislatura uma comissão parlamentar de inquérito” sobre a “atribuição de nacionalidade, de residência e de título de permanência em Portugal”, durante os governos de António Costa e Luís Montenegro, afirmou Ventura. Entre os passageiros que seguiam no avião, 169 são cidadãos indianos, 53 britânicos, um canadiano e sete portugueses, de acordo com informações da companhia aérea.
Em conferência de imprensa na sede do partido, no início da semana, em Lisboa, o líder da oposição considerou que “a partir de 2017 o número de atribuições de nacionalidade aumentou descontroladamente, pelo que vai propor que a comissão investigue desde esse ano até ao atual governo, liderado por Luís Montenegro. O Presidente do segundo maior partido adiantou que, se a iniciativa avançar, o partido quer ouvir o antigo primeiro- ministro e atual presidente do Conselho Europeu, António Costa, o atual primeiro-ministro, Luís Montenegro, o ministro dos Negócios Estrangeiros, Paulo Rangel, o antigo responsável pela pasta Augusto Santos Silva, e os anteriores ministros da Administração Interna, José Luís Carneiro – agora candidato à liderança do PS, “quem tem uma conversa sonsa” sobre imigração – e Margarida Blasco. Ventura sublinhou que o CHEGA poderá mesmo “avançar com uma comissão potestativa, se necessário, para investigar até ao último detalhe aqueles que foram responsáveis pela atribuição criminosa de nacionalidade e de residência em Portugal nos últimos anos”. Segundo o líder da oposição, podem estar em causa crimes como “falsificação de documentos, traição à pátria, branqueamento de capitais ou tráfico de influência”.
“Se temos pessoas que são nacionais portuguesas apenas de título, sem qualquer ligação ao território, às famílias, ao sangue ou ao povo, então tivemos crimes cometidos na atribuição da nacionalidade portuguesa. O Parlamento deve investigar isto, e deve fazê-lo sem receio dos interesses instalados”, defendeu, admitindo que o problema pode residir tanto na lei como na sua aplicação. Ventura argumenta que, nos termos da lei portuguesa, pode adquirir a nacionalidade quem tenha nascido ou residido no chamado “Estado Português da Índia” – que incluía os territórios de Goa, Damão, Diu, Dadrá e Nagar-Aveli – até determinadas datas, assim como os seus filhos e netos. O Presidente do CHEGA rejeita que esteja em causa uma regra semelhante à que vigorava para os judeus sefarditas, em que se permitia a atribuição d a nacionalidade portuguesa aos descendentes, mesmo sem residência no país. Neste contexto, o CHEGA solicitou ainda o agendamento de um debate de urgência para esta sexta-feira, “sobre as questões da residência, da imigração e da nacionalidade atribuídas em Portugal”; proposta que acabou por ser rejeitada. “O que aconteceu foi um verdadeiro mercadejar da nacionalidade portuguesa e da residência, sobretudo desde 2017”, concluiu Ventura. Sobre o Programa do Governo, que foi apresentado esta semana no Parlamento, André Ventura fez sobressair que se trata de um Executivo que “não é bom” e que não vai conseguir resolver os problemas de imigração, económicos e de corrupção que o país tem.