Portugal e a escravatura parte (1)

Numa altura em que se ouviu o Prof. Marcelo a falar das “culpas” dos portugueses pela escravatura, chegando ao ponto de exigir indemnizações pelo passado, cabe dar uns esclarecimentos, porque a história não é feita de emoções, nem é de plasticina para se moldar conforme as modas e conveniências politicas. 

A rejeição da escravatura está bem interiorizada na cultura Ocidental, pois foi ela que a aboliu. Não necessita de “motivações”. A classificação de “crimes contra as pessoas” está consignada em leis e tratados antiescravista sucessivamente aprovados de há 200 anos, em toda parte do ocidente. Não precisa ser reactivada. 

Afirma a extrema-esquerda que Portugal teve um papel pioneiro no tráfico de escravos. Teve sim, mas apenas no Atlântico, a partir do séc. XV. Ora o tráfico de escravos é muito anterior a esse período e extravasa esta zona do globo. A palavra “escravo” vem do eslavo, isto, é da gente que era vendida, incluindo brancos, no séc. IX, no mundo islâmico.

Antes dos portugueses se terem envolvido no comércio de escravos, já os muçulmanos o praticavam em larga escala através do Saara, do Indico e do mar Vermelho. Os egípcios construíram as pirâmides como? Com escravos negros.

É lembrar os ataques dos nómadas da estepe eurasiática às civilizações agrárias da periferia que duraram cerca de dois mil anos. Será que a Mongólia deve um pedido de desculpas à Rússia, Irão ou à China? O Médio Oriente vai exigir indemnizações ao Uzbequistão pelas campanhas de Tamerlão, que causaram 17 milhões de mortos?

Ora o tráfico de escravos teve dois protagonistas: os africanos, que já o praticavam antes da chegada dos portugueses e Portugal (e outras nações ocidentais, tais como a Inglaterra, por exemplo). A verdade é que à época, mesmo se quisessem, os ocidentais não tinham meios para capturar e acorrentar os habitantes de Africa. Não eram meia dúzia de marinheiros que se aventuravam por território adentro para capturar indígenas. Eram as próprias chefias africanas que os escravizavam e as vendiam. Que tal começar por exigir indemnizações aos seus?

Ora é preciso compreender a história segundo os padrões morais da época. Antes dos finais de setecentos, a escravatura não era crime em parte nenhuma do mundo. Todos a praticavam, incluindo os africanos que hoje tanto se queixam. Os homens bons e juntos podiam considerar a escravatura infeliz e lamentável, mas era admitida, quando não incentivada, pelo costume, pela política e pela lei.

Poderão dizer: mas a escravatura era considerada crime pelos próprios escravos? Será? Os factos provam o contrário. Não sabemos como os escravos pensavam mas sabemos como agiam. Quem estudar a história da escravatura encontrará escravos e libertos que tinham os seus próprios escravos. Escravos que uma vez libertados, iam traficar escravos para as costas de Africa. E escravos que fugiam e que, uma vez livres, possuíam escravos nos territórios que dominavam em Africa.

Mas os que nos séculos XV a XVIII praticaram a escravatura (ou pactuaram com ela) tanto em África como na Europa, Ásia e América, agiram porque em nenhuma parte do mundo a escravatura era considerada crime.  

Portanto, os escravos também consideravam a escravatura legítima e agiam em conformidade com o resto do mundo. Eram os africanos que forneciam pessoas já escravizadas aos compradores ocidentais. O que se traduz no seguinte: Não eram comprados homens livres. Aquela ideia romântica que antes da chegada dos portugueses viviam todos livres e felizes é totalmente errada. Eram violentos uns com os outros, matavam-se, escravizavam e vendiam-nos sem dó nem piedade.

Dito isto, não podemos aplicar a classificação de crime a práticas que à época, não eram classificadas como tal. E também não podemos onerar e responsabilizar os actuais descendentes de putativos crimes que não o eram. Se, por absurdo, decidíssemos criminalizar determinadas práticas retroactivamente, quais e como escolheríamos?

Só começou a ser crime a partir de finais do século XVIII e graças ao advento e triunfo de uma nova ideologia e de um movimento nascido pelos Brancos do ocidente: o abolicionismo.

Artigos do mesmo autor

Está envolto em polémica a condecoração a António de Spínola a título póstumo, não por ter sido o primeiro Presidente da Républica pós 25 de Abril, mas por ter sido membro da Junta de Salvação Nacional. Entretanto passaram pela presidência, antes de Marcelo Rebelo de Sousa, em mandatos de 10 anos cada um, Ramalho Eanes, […]

Pergunto porque uma democracia actual e pluralista insiste em festejar e fazer feriado nacional em memória de um regime que foi um autêntico desastre quando hoje a República que existe em Portugal nada tem a ver com aquela que foi implantada a 5 de Outubro de 1910. Os republicanos derrubaram um regime que honrava os […]

A percepção de que a escravatura era uma coisa injusta sempre existiu na cultura ocidental. A forma como se lidou com isso é que foi mudando. Entendamo-nos bem: o tráfico negreiro e as relações de escravatura foram abominações. Mas é preciso perceber que foram as nações ocidentais as primeiras que as estigmatizaram e proibiram. Portugal […]

No dia 28 de Dezembro de 1979 foi apresentada na Secretaria da Polícia Judiciária uma queixa crime por um grupo de 18 portugueses por nascimento e na plenitude dos seus direitos legais, encabeçada pelo General na reserva Silvino Silvério Marques, e constituída por militares, professores, jornalistas e outros profissionais contra: 1º – Mário Soares (que […]

A 25 de Abril de 1974 deu-se em Portugal um golpe de Estado. Não foi uma revolução como erradamente se ensina nas escolas e se propagandeia na comunicação social. Porque dizem os manuais de ciência política nos seus mais elementares ensinamentos que para haver revolução tem de haver doutrina e revolta popular. Os únicos que […]