Será que Portugal tem um serviço de emergência pré-hospitalar de acordo com standards internacionais? Na minha opinião não, passo a explicar.
Atentes demais temos que perceber quem faz parte do SIEM (sistema integrado de emergência médica), são elas a PSP, a GNR, o INEM, os Bombeiros, a Cruz Vermelha Portuguesa e os Hospitais e Centros de Saúde, sendo o INEM (que é o organismo do Ministério da Saúde), responsável por coordenar o funcionamento do sistema em território de Portugal Continental. O Sistema começa quando alguém liga 112, o Número Europeu de Emergência. O atendimento das chamadas cabe à PSP e à GNR, nas centrais de emergência. Sempre que o motivo da chamada tenha a ver com a área da saúde, a mesma é encaminhada para os Centros de Orientação de Doentes Urgentes (CODU) do INEM.
Sempre que o CODU aciona um meio de emergência procura que o mesmo seja o que está mais perto do local, independentemente da entidade a que pertence (INEM, Bombeiros e CVP), de acordo com uma tiragem feita no atendimento telefónico, atribuído assim uma prioridade (P1, P3, P5 e outras prioridades)
Sendo a prioridade P1 de actuação exclusiva do INEM, ou seja, por meios INEM tais como meios VMER, (viatura médica emergência e reanimação), SIV (viatura de suporte imediato de vida) e Helicópteros, meios esses com tripulação exclusiva composta por trabalhadores INEM como médicos, enfermeiros e TEPH. Estes meios são acionados para ocorrência que comporta risco imediato de vida e assim sendo necessário cuidados de emergência médica de nível Suporte Avançado de Vida e/ou Suporte Imediato de Vida, (se considera que vítima emergente/crítica que carece de intervenção imediata). Esta prioridade é atribuída com menos frequência, sendo que em 2020 teve uma incidência de 11%. Importa também referir que os parceiros do SIEM, neste caso os Bombeiros e Cruz Vermelha também são chamados a intervir.
Sendo prioridade P3, ocorrência que origina o envio de meio(s) de emergência médica de nível Suporte Básico de Vida (considera vítima urgente que carece de intervenção dentro de uma janela temporal ligeiramente superior à anterior). O plano de resposta é o envio de meio(s) de nível SBV (Ambulância/MEM), ou seja, as ditas ambulâncias normais que vemos por aí as AEM dos Bombeiros, CVP e INEM.
Sendo prioridade P5, chamadas em que a triagem não determine o envio de meio(s) de emergência nem a transferência da chamada para o CIAV ou para o Centro de Apoio Psicológico e Intervenção em Crise, são reencaminhadas para o SNS24. Neste caso não é enviado qualquer meio de socorro.
Por último temos as outras prioridades, ou seja, Informação às autoridades, ao Comando Nacional ou Regional de Operações de Socorro (CNOS ou CROS), conferência com CIAV (Centro de Informações Antivenenos) ou Centro de Apoio Psicológico e Intervenção em Crise (CAPIC). A resposta pode ser variável, nomeadamente pode haver envio de meio(s), em função da situação (como a UMIPE do INEM, por exemplo).
Pois bem, sendo que 80% a 90% do socorro é realizado pelos parceiros do SIEM, nomeadamente Bombeiros e CVP, estamos a falar de doentes P3, sejam eles doença súbita ou trauma. Assim sendo a grande maioria do socorro é prestado por elementos que possuem uma formação mínima de TAT (Técnico Ambulância Transporte curso de 50 horas) ou TAS (Técnico de Ambulância Socorro curso de 210 horas), o que manifestamente é insuficiente de acordo com standards internacionais do EMS.
Convém também referir que a carga horária do curso TEPH (Técnico Emergência Pré-hospitalar) dos colaboradores não médicos ou não enfermeiros do INEM é de 910, ou seja, são 700 horas a mais de formação.
Assim sendo, posso concluir que existe uma grande diferença de cuidados de saúde prestados em Portugal, ou seja, existe um socorro de assente em protocolos de intervenção definidos e invasivos praticados pelo INEM, e outro de um mero transporte ao hospital praticado pelos parceiros.
Por outro lado, temos a agravante da entrega do doente à triagem do hospital de destino, ou seja, muitas das vezes a espera pode ser mais de 30 minutos, confesso que uma vez no CHU Coimbra estive 1h30 para entregar um doente, vítima de trauma.
Em conclusão, 80% a 90% dos utentes do pré-hospitalar não pode ser considerado emergência pré-hospitalar, não só pela formação de quem presta socorro mas também pela falta de capacidade de resposta atempada na recepção do utente no hospital.