O calendário marcava a data quando o Ministério da Saúde anunciou a escolha do médico militar António Gandra d’Almeida como Diretor executivo do Serviço Nacional de Saúde (SNS), para substituir Fernando Araújo que apresentou a sua demissão em abril de 2024 para não ser “obstáculo” às políticas do novo Governo. Passados oito meses, Gandra d’Almeida seguiu o exemplo do seu antecessor e apresentou a demissão. Mas, neste caso, os motivos eram outros.
António Gandra d’Almeida demitiu-se do cargo de Diretor executivo do Serviço Nacional de Saúde, a 17 de janeiro de 2025, após a SIC ter noticiado que o Diretor executivo do SNS demissionário tinha acumulado, durante mais de dois anos, as funções de diretor do INEM do
Norte, com sede no Porto, com as de médico de Cirurgia Geral no Hospital de Gaia. Já se sabia que tinha feito o mesmo no Algarve e em Gaia. A ministra da Saúde, Ana Paula Martins, aceitou o pedido de demissão apresentado.
“Muito duvidoso”, começou por acusar André Ventura. Isto porque, para o líder do CHEGA, tanto o primeiro-ministro, Luís Montenegro, como Ana Paula Martins deveriam ter conhecimento dos
dados públicos profissionais de António Gandra d’Almeida quando este foi nomeado diretor executivo do SNS.
“Desafio o primeiro-ministro a dizer publicamente que não conhecia esta acumulação ou outras que decorrem no SNS”, incitou Ventura, e continuou: “Desafio publicamente o primeiro-ministro e a ministra da Saúde a desmentirem que tinham conhecimento.
Constava dos elementos públicos deste profissional a acumulação e tinha de estar acessível ao Ministério da Saúde à data da nomeação”, arrematou o Presidente do CHEGA.
Em declarações aos jornalistas, Ventura sustentou que a demissão de Gandra d’Almeida “demonstra a fragilidade e a falta de sustentação com que o Governo tem feito as nomeações para os diversos cargos na administração pública, escolhidos mais pela cor do cartão partidário
do que pela competência, pela isenção ou pelo currículo que apresentam.”
Nesta senda, o Presidente do CHEGA pediu a intervenção da Justiça neste caso e exigiu uma auditoria global na Saúde sobre situações análogas de acumulação de funções e de salários por
parte de dirigentes.
“A demissão do diretor executivo do SNS deve levantar questões ao Parlamento e à Justiça. Deve levantar questões à Justiça pela acumulação indevida de rendimentos em valores absolutamente brutais, na ordem das centenas de milhares de euros”, justificou.
O líder do CHEGA defendeu, também, a extinção do cargo de diretor executivo do SNS, argumentando que “é um cargo desnecessário”. André Ventura fez ainda sobressair que para apurar este caso, “o CHEGA exigirá ao Governo toda a documentação relativamente a esta nomeação [de Gandra d’Almeida], os critérios que a nortearam e como é possível que não se tivesse conhecimento de um serviço que também foi prestado ao SNS numa acumulação indevida de funções”. Para o Presidente do CHEGA, “o Governo não sabia ou não quis saber e olhou para o lado, num caso que era de absoluta ilegalidade gritante e evidente”. “Foi também
tornado público que a Inspeção Geral de Atividades de Saúde (IGAS) levará a cabo uma auditoria. É importante perceber que outros dirigentes, também da área da Saúde, podem estar nas mesmas circunstâncias”, acrescentou. De acordo com a Lusa, a IGAS anunciou na segunda-feira uma inspeção à eventual acumulação de funções públicas e privadas de Gandra d’Almeida nos períodos em que foi diretor do INEM do Norte e diretor executivo do SNS. Além dessa inspeção, a IGAS vai realizar uma auditoria, desdobrada em vários processos, ao “desempenho organizacional das entidades do Serviço Nacional de Saúde e do Ministério da Saúde” relativa ao cumprimento das normas que regulam a acumulação de funções públicas com funções ou atividades privadas.
“Os processos de auditoria têm como objeto a acumulação de funções públicas com funções ou atividades privadas pelas pessoas que ocupam os cargos de direção nas entidades do Serviço Nacional de Saúde e do Ministério da Saúde”, adiantou a IGAS em comunicado. Um dia depois, a ministra da Saúde admitiu que conhecia o relatório da Comissão de Recrutamento e Seleção para a Administração Pública (CReSAP) sobre o currículo de António Gandra d’Almeida, mas recordou que o parecer do organismo sobre a adequação do seu perfil para liderar a direção executiva do SNS foi positivo.
Contudo, a ministra aceitou a demissão de Gandra d’Almeida — que insistiu, em comunicado, ter sido uma decisão “individual”, para “proteger o lugar, o SNS e a sua família” — e agradeceu o trabalho do diretor executivo do SNS demissionário.
Agora, já está escolhido o nome do sucessor — Álvaro Santos Almeida — e o Diário de Notícias sabe que a ministra deixou claro que o Executivo se vai querer focar na “transformação” da organização da direção executiva que já queria promover quando elaborou o seu programa de Governo.
Segundo Ana Paula Martins, a escolha de Álvaro Almeida assenta no perfil do economista e ex-presidente da ARS Norte e da Entidade Reguladora da Saúde (ERS).