“Javier Milei saiu da primeira volta enfraquecido pelo segundo lugar. Umas das principais críticas que lhe fazem é sobre a irrealidade das suas propostas, o impraticável de algumas medidas sem maioria parlamentar e a falta de governabilidade, a partir de uma profunda fraqueza estrutural: sem quadros para governar, para formar equipas, para preencher estruturas do Estado. O acordo com Mauricio Macri permite-lhe capitalizar um ativo”, indica à Lusa a analista política, Shila Vilker, diretora da consultora Trespuntozero, uma das quatro que previram a vitória parcial de Sergio Massa.
No domingo passado (22), o peronista de centro-esquerda Sergio Massa, aliado da ex-presidente Cristina Kirchner, venceu a primeira volta com 36,7% dos votos, enquanto a direita de Javier Milei obteve 30%. O vencedor em 19 de novembro deve sair de quem for capaz de seduzir os eleitores da candidata de centro-direita Patricia Bullrich, aliada do ex-presidente Mauricio Macri, que terminou com 23,8% dos votos.
Na quarta-feira, Patricia Bullrich, numa decisão concertada com Mauricio Macri, anunciou o apoio a Javier Milei por representar a mudança, em contraposição a Sergio Massa, por representar a continuidade.
A decisão, sem consultar as bases do próprio partido nem as demais forças que compõem a principal coligação opositora, Juntos pela Mudança, provocou um terramoto político que abriu fendas nos demais aliados para os quais Milei é um radical.
“Milei torna-se Macri por outros meios e isso permite-lhe manter a disputa aberta. A sociedade ainda não se inclinou por um dos dois. Esta é uma partida que ainda deve ser jogada”, avalia Vilker, para quem, “se a jogada de Milei e Macri der certo, Milei chega ao poder, enquanto Macri fica com mais da metade do governo Milei”.
“É uma jogada arriscada, mas, ao mesmo tempo, é uma forma de Macri materializar poder”, observa Vilker.
A aproximação entre Milei e Macri também acalmou os mercados, temerosos de duas propostas radicais do libertário: eliminar o Banco Central e dolarizar a economia, substituindo o peso argentino pelo dólar norte-americano.
Milei garante que as suas propostas são coincidentes em 90% com as de Bullrich, que a candidata derrotada não impôs nenhuma condição para o seu apoio e que a dolarização é irreversível. Porém, o mercado entende que, ao depender do bloco de centro-direita para aprovar reformas, agora sob a tutela de Macri, a dolarização não deve sair do papel. A corrida cambial, prevista para depois das eleições, por enquanto, ficou limitada.
“O dólar tinha subido muito antes da primeira volta devido a uma combinação entre péssimos fundamentos macroeconómicos e a ameaça de dolarização que propunha Milei. A expectativa de uma forte desvalorização levou as pessoas a fazerem enormes filas, desesperadas por comprarem coisas como uma forma de livrarem-se dos pesos. O resultado eleitoral não foi o que os mercados esperavam e a sensação agora é de que esse salto para o abismo não é tão provável”, explica à Lusa o analista económico Marcelo Elizondo.
“Macri entende que Milei carece de equipa para tomar decisões e que Milei é um fenómeno ‘outsider’. Macri vê uma oportunidade de construir governo e manter-se em vigência. E Milei vê uma oportunidade não só de ganhar a Presidência, mas de ter governabilidade”, aponta Cristian Buttié, diretor da consultora CB Opinião Pública.
Horas antes do anúncio de apoio de Patricia Bullrich e Mauricio Macri a Javier Milei, a consultora CB, outra das quatro que acertaram as previsões, divulgou a primeira sondagem para a segunda volta. Javier Milei tem 41,6% de intenções de voto, enquanto Sergio Massa soma 40,4%. Sem os votos brancos e nulos, a projeção fica em 50,7% para Javier Milei e 49,3% para Sergio Massa, com uma diferença dentro da margem de erro de 2,5 pontos percentuais.