“Este trabalho integra os desafios atuais deste exercício individual e coletivo, expondo casos de alegados abusos de direitos humanos no decorrer do usufruto do direito de manifestação”, refere a AI.
Os resultados do inquérito mostram que 90% das pessoas não participou em qualquer manifestação desde 2018, estando aqui incluídos não só protestos mais tradicionais, como desfiles e greves, mas também reuniões de assembleias de freguesia, por exemplo.
“A participação neste tipo de eventos, contudo, não é equivalente para todas as categorias sociais neste inquérito, sendo muito mais elevada entre as pessoas mais escolarizadas (17% entre os que têm ensino superior) do que entre as pessoas menos escolarizadas (3%). Também é maior entre os votantes de partidos à esquerda do que entre votantes de partidos ao centro e à direita no espectro político português”, lê-se no documento.
Por outro lado, quase metade dos inquiridos (47%) acha que estas ações têm que ser autorizadas, apesar de a Constituição Portuguesa ser clara quando refere que “os cidadãos têm o direito de se reunir, pacificamente e sem armas, mesmo em lugares abertos ao público, sem necessidade de qualquer autorização”.
O motivo estará relacionado com o facto de ainda estar em vigor legislação de 1974, segundo a qual “as pessoas ou entidades que pretendam realizar reuniões, comícios, manifestações ou desfiles em lugares públicos ou abertos ao público deverão avisar por escrito e com a antecedência mínima de dois dias úteis o presidente da câmara municipal”.
Ainda assim, 82% afirmou que nunca sentiu os seus direitos enquanto manifestante serem limitados.
Entre os temas que mais têm motivado ações de protesto, os direitos dos trabalhadores/emprego/desemprego (3%), a educação (2%) e a habitação (2%) figuram no topo da lista.
Se 84% acredita que as manifestações são importantes para o debate de ideias numa democracia, as opiniões dividem-se quando a questão é a desobediência civil, em que entram ações como o corte de estradas, o bloqueio de aviões ou a pintura de fachadas de edifícios.
Prova disso está no facto de quase metade dos inquiridos (49%) entender que os atos de desobediência são ilegítimos, ao mesmo tempo que 59% defende a sua criminalização, uma posição com maior expressão “entre as pessoas mais instruídas e com idade entre os 25 e os 54 anos”.
Relativamente à atuação policial, 37% acha que “há parcialidade no tratamento” de manifestantes, consoante quem organiza a manifestação, e a própria investigação da AI inclui casos de alegados abusos de autoridade relativamente a ativistas, sobretudo mulheres.
Em conclusão, a AI sugere, entre dez propostas, a revisão do decreto-lei de 1974, que os requisitos para a notificação de manifestações sejam tratados como avisos, que todos os municípios publiquem dados sobre o número de manifestações, que seja revista a formação das forças policiais ou que o policiamento garanta a segurança de jornalistas ou outros observadores.