“É importante termos em conta as variações que possam ocorrer durante os próximos meses, relacionadas com planos de contingência que têm de ser implementados na sequência da maior procura que é própria do inverno, ou até tendo em conta a situação mais complexa de alguns serviços”, alertou o presidente da Associação Portuguesa de Administradores Hospitalares (APAH), Xavier Barreto.
O responsável falava à Lusa a propósito de uma portaria, sobre a qual o Diário de Notícias hoje escreve, que prevê que os hospitais públicos definam, até final do ano, a lista de doentes que ultrapassaram o Tempo Máximo de Resposta Garantido (TMRG) nas cirurgias não urgentes e que conseguem operar até agosto, encaminhando os restantes para os setores privado ou social.
Como exemplo, Xavier Barreto aponta um serviço que tenha perdido muitos cirurgiões nos últimos meses e que tenha, ao mesmo tempo, uma grande lista de espera: “Seria muito injusto responsabilizá-los por essa lista de espera e pedir-lhes que paguem essas cirurgias ao setor privado”.
“Nunca podemos perder de vista que quem define salários, condições contratuais e condições de carreira não são os hospitais. É a tutela”, disse o responsável, acrescentando: “Se os hospitais têm dificuldade em recrutar médicos isso deve-se também àquilo que não foi feito pela tutela nos últimos anos”.
Xavier Barreto diz que a medida, tal como está explicada na imprensa, “corre o risco de descapitalizar o Serviço Nacional de Saúde” e avisa que “a situação de alguns serviços é muito complicada”.
Segundo o Diário de Notícias, a portaria, que terá de ser publicada em Diário da República, diz ainda que, a partir do momento em que os hospitais fecharem a lista, ela não pode sofrer alterações com novos doentes.
À Lusa, o presidente da APAH diz que este compromisso “inamovível” é impossível de estabelecer, por causa dos planos de contingência dos hospitais: “Se durante o inverno tivermos de realocar cirurgiões, retirando-os da atividade programada para a urgência, ou até se tivermos de adiar cirurgias para ter camas para internar doentes do serviço de urgência, os hospitais não podem ser responsabilizados por isso, porque estão a responder a doentes mais urgentes”.
Lembra igualmente que uma das medidas dos planos de contingência dos hospitais — “de último recurso, mas que existe” — é parar a atividade programada para responder aos doentes da urgência, se necessário, e defende que o plano de cirurgias não urgentes a definir pelos hospitais deve ser passível de alterações.
Recorda igualmente que, tal como acontece com os vales cirurgia emitidos quando os doentes ultrapassam os TMRG e que podem ser usados no privado, a opção do doente deve prevalecer e muitos utentes preferem manter-se no hospital onde habitualmente são acompanhados.
“Temos de esperar para ver qual é exatamente a reação dos utentes a isto, pois geralmente preferem ficar com a equipa que já conhecem, em quem confiam e que lhes fez o diagnóstico”, lembrou.
Os dados divulgados em outubro pela Entidade Reguladora da Saúde indicavam que apenas um em cada quatro vales cirurgia emitidos no primeiro semestre foi usado.
Na altura, o regulador admitia que a baixa utilização se deva à distância do hospital sugerido para a cirurgia ou à confiança no hospital de origem.
Este ano, os vales cirurgia estão a ser emitidos, pela primeira vez, quando se atinge 75% do TMRG e o hospital de origem não garante a realização ou o agendamento da cirurgia dentro deste tempo. Até 31 de agosto, foram emitidos 134.418 vales cirurgia, 55,37% dos quais acabaram recusados pelos utentes.