O presidente do Tribunal Constitucional (TC), João Caupers, considerou esta quarta-feira que “não vai ser fácil a tarefa” da Entidade para a Transparência e recusou que este organismo vá “pôr fim à corrupção” ou às “fraudes e abusos”.
“Não vai ser fácil a tarefa que vos espera. Nunca é, de resto, quando se trata de criar algo novo. E, sobretudo, não o é na área em que vão operar e no contexto atual”, afirmou João Caupers na tomada de possa da direção da Entidade para a Transparência.
Ana Raquel Moniz tomou esta quarta-feira como presidente da Entidade para a Transparência, e terá como vogais Mónica Correia e Pedro Miguel Nunes. A cerimónia decorreu no Palácio Ratton, em Lisboa, e contou com a presença do Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, do presidente da Assembleia da República, Augusto Santos Silva, e da ministra da Justiça, Catarina Sarmento e Castro.
A Entidade para a Transparência, aprovada em 2019 e que aguarda instalação desde então, vai fiscalizar as declarações únicas de rendimentos, património e interesses dos titulares de cargos políticos e altos cargos públicos.
Na sua intervenção, o presidente do TC afirmou que “é previsível que a mudança de paradigma venha a gerar dúvidas, hesitações, erros e omissões por parte dos declarantes”, salientando que “nesta fase, a ação pedagógica da Entidade para a Transparência será indispensável” pois a “maioria dos declarantes tentará, como já faz hoje, cumprir a lei”.
João Caupers considerou igualmente que “a expectativa que a Entidade para a Transparência desperta é compreensível, mas largamente fruto do desconhecimento das suas atribuições“.
“Para uns, de pouco servirá, porque nada mais fará do que receber e guardar informação, para outros, servirá para quase tudo: irá finalmente pôr fim à corrupção, ao tráfico de influências, às fraudes e abusos, enfim, resgatar os pecados do mundo”, elencou, apontando que “nem uns nem outros estão certos“.
O presidente do TC sustentou que “a transparência, que dá o nome à nova entidade, não constitui um fim em si mesmo, é antes um instrumento, valioso, mas não o único, para prosseguir finalidades caras ao Estado de direito, quais sejam as de procurar garantir que os comportamentos dos decisores públicos respeitem a legalidade, a imparcialidade, a probidade e a moralidade administrativas”.
“A função primordial da Entidade para a Transparência vai desenvolver-se num quadro em que confluem dois valores, de um lado, a aplicação rigorosa e pontual da lei, do outro, o respeito pelos direitos das pessoas, de todas as pessoas”, defendeu, afirmando estar certo de que a direção da entidade saberá “equilibrar de forma inteligente, serena e sensata estes dois valores”.
O juiz reiterou que a previsão é de que ainda durante este mês a direção possa instalar-se em Coimbra, no Palácio dos Grilos, depois da conclusão da primeira fase da requalificação do edifício, mas apontou que será uma “ocupação precária” por não ser “apoiada em qualquer instrumento jurídico capaz de acautelar os interesses do Tribunal e da Universidade”.
“Confia-se que o Governo não deixará de cumprir a sua parte no que respeita ao edifício, possibilitando a instalação completa da entidade”, salientou.
O presidente do TC recordou ainda o processo de constituição da Entidade para a Transparência, considerando que “na parte que lhe competia”, nomeadamente “a conceção e operacionalização da plataforma eletrónica destinada a registar e tratar as declarações únicas de património e rendimentos”, o tribunal “foi dando os passos necessários” e recusou as críticas de que “demorou muito tempo”.