O estudo, publicado hoje na revista Nature, representa um “avanço importante” na área da prevenção do cancro da mama porque “sugere que as mulheres com maior densidade mamária, um fator de risco conhecido, poderão ser as que mais beneficiam de um tratamento preventivo com um fármaco anti-progestina”, disse o investigador à agência Lusa.
Um ensaio clínico de que o artigo sobre o estudo dá conta avaliou se a inibição da progesterona com uma anti-progestina, o acetato de ulipristal, durante 12 semanas altera marcadores de risco reconhecidos em mulheres pré-menopáusicas com risco elevado.
A progesterona é uma hormona que promove o crescimento de células que podem tornar-se cancerígenas, pelo que bloquear o sua ação pode ser uma nova maneira de impedir o cancro da mama antes que este comece.
O acetato de ulipristal é um medicamento usado na contraceção de emergência, frequentemente apelidado de “pílula do dia seguinte”, e no tratamento de miomas uterinos.
A intervenção, testada em 24 mulheres entre 2016 e 2019, diminuiu a densidade do tecido mamário e alterou a sua estrutura, criando um ambiente menos favorável ao desenvolvimento de células cancerígenas, particularmente em mulheres com o fator de risco da maior densidade mamária.
Segundo o investigador português, o estudo revelou uma redução da proliferação celular e diminuição do número de células que estão na origem de cancros da mama agressivos, a remodelação do tecido da mama e uma redução da densidade mamária.
Estes resultados apoiam a linha de investigação de Bruno Simões, focada nos “primeiros eventos celulares e moleculares associados ao risco de cancro mamário e em intervenções que previnam a transformação das células iniciadoras de tumor”.
A ideia do estudo surgiu do conhecimento prévio sobre o papel da progesterona na expansão das células da mama e a sua suscetibilidade à transformação, e provas pré-clínicas de que anti-progestinas reduzem o número destas células.
Dado que o acetato de ulipristal é uma anti-progestina já utilizada clinicamente para outras indicações, o projeto consistiu na sua reutilização como intervenção preventiva.
O trabalho, financiado pelas fundações Breast Cancer Now e Prevent Breast Cancer, resultou de uma colaboração internacional entre as universidades de Manchester, Cambridge, Toronto (Canadá) e Calábria (Itália).
“O potencial impacto é significativo, pois identificámos uma intervenção farmacológica que modifica marcadores de risco biologicamente quantificáveis”, salientou Bruno Simões, cientista do Centro de Investigação do Cancro de Manchester.
Se forem confirmadas em estudos maiores e de longo prazo, as anti-progestinas podem “oferecer uma alternativa de prevenção para mulheres pré-menopáusicas com risco elevado, diminuindo a necessidade de cirurgia ou terapias hormonais prolongadas”, ambas com impacto na qualidade de vida, disse Bruno Simões à Lusa.
Os resultados atuais servem de base para estudos maiores e de seguimento a longo prazo para testar a eficácia na redução real da incidência tumoral e avaliar a segurança necessária à sua aprovação como terapia preventiva.
O cancro da mama continua a ser o cancro mais diagnosticado em mulheres em 164 países e a principal causa de morte por cancro em mulheres em 134 países, segundo um estudo publicado na revista The Lancet em outubro.
Estes dados “reforçam a urgência de desenvolver estratégias de prevenção eficazes sobretudo em mulheres jovens”, alertou Bruno Simões.