Dois jovens acusados do homicídio de um rapaz de 15 anos, em outubro de 2020, quando os três estavam ao cuidado de uma instituição particular de solidariedade social (IPSS), confessaram hoje o crime perante o Tribunal de Setúbal.
No primeiro dia do julgamento, o coletivo do tribunal de júri começou por ouvir os arguidos Leandro Vultos, agora com 19 anos, e Ricardo Cochicho, de 18, principais suspeitos da morte de Lucas Miranda, que confessaram a prática do crime e a maior parte dos factos de que estão acusados, embora sem esclarecerem alguns pormenores.
Os dois arguidos, que, tal como a vítima, estavam ao cuidado do Centro Jovem Tabor, IPSS sob a dependência da Diocese de Setúbal da Igreja Católica que acolhe jovens com dificuldades de inserção na sociedade, admitiram que se disponibilizaram para ajudar o Lucas a morrer, correspondendo ao desejo manifestado insistentemente pela vítima.
Leandro Vultos, que terá aplicado um golpe de mata-leão (uma técnica de estrangulamento) ao jovem Lucas, afirmou que, no Centro Jovem Tabor, “quase todos os jovens acolhidos na instituição sabiam do desejo de morrer manifestado repetidamente pelo jovem Lucas”, mas que tal não terá sido valorizado pelos colegas nem pelos funcionários que, entretanto, também terão sido alertados.
Toda a gente sabia que o Lucas queria suicidar-se”, corroborou pouco depois o arguido Ricardo Cochicho, reiterando que ele e Leandro se disponibilizaram para ajudar o jovem Lucas Miranda a morrer e que consumaram o crime na manhã do dia 15 de outubro de 2020.
Segundo Ricardo Cochicho, essa vontade de morrer manifestada pelo jovem Lucas foi reiterada um dia depois de Leandro Vultos lhe ter aplicado um primeiro golpe de mata-leão, numa espécie de ensaio macabro da forma como iriam concretizar o crime.
De acordo com o arguido Ricardo Cochicho, nesse ensaio, o golpe de mata-leão fez com que o jovem Lucas Miranda perdesse os sentidos, só tendo recuperado “depois de lhe darem algumas chapadas e deitarem água na cara”.
Os dois arguidos admitiram também perante o tribunal que, depois de consumarem o crime, tentaram criar um cenário que desse a ideia de um suicídio por enforcamento, mas posteriormente, decidiram esconder o cadáver, atirando-o para o interior de um poço seco.
Neste primeiro dia de julgamento, o Tribunal de Setúbal questionou também os dois arguidos sobre o momento de eventuais agressões violentas que terão provocado várias lesões graves no crânio de Lucas Miranda – que não se coadunam com a versão dos factos que ambos apresentam -, mas nenhum deles admitiu ou soube explicar essas agressões.
O Ministério Público acusou Leandro Vultos dos crimes de homicídio qualificado, profanação de cadáver e ameaça agravada, e Ricardo Cochicho como cúmplice da prática do crime de homicídio qualificado e como coautor de um crime de profanação de cadáver.
No despacho de acusação, o Ministério Público refere também que a morte do jovem Lucas Miranda terá ocorrido por asfixia mecânica, depois de o arguido Leandro Vultos lhe ter aplicado um golpe de mata-leão, mas a mãe adotiva do jovem assassinado tem outro entendimento.
A mãe adotiva de Lucas Miranda e assistente no processo deduziu acusação particular, em que acusa os dois arguidos dos crimes de “homicídio qualificado e profanação de cadáver”.
A acusação da assistente sustenta ainda que, depois de o arguido Leandro ter aplicado um golpe de mata-leão que deixou Lucas Miranda inanimado, “os arguidos agrediram violentamente o crânio de Lucas Miranda, com socos, com paus e outros objetos contundentes, tirando-lhe, desse modo, a vida”.