O anúncio foi dado pelo líder do partido, André Ventura, em comunicado enviado às redações, no passado domingo, que salientou que irá “propor que os artigos a rever sejam limitados e, sobretudo, concentrados na reforma do sistema político português, nomeadamente em termos de composição dos órgãos, regras de transparência, imunidade e competências.”
O objetivo desta nova revisão constitucional passa, igualmente, pelo foco “na obtenção de consensos entre os três maiores partidos para uma alteração cirúrgica à Constituição da República que permita a modernização institucional e jurídica de que o país precisa”. O processo deverá ter início “logo que terminem os trabalhos orçamentais”, que se estendem até final de novembro, tentando assim contornar o que aconteceu na última legislatura, quando ocorreu “uma interrupção súbita, bem como a falta de vontade evidenciada pelo PS, que impediram a conclusão de uma reforma constitucional que é necessária e fundamental a Portugal”, vinca Ventura.
Note-se que, na última legislatura, iniciou-se um processo de revisão constitucional, interrompido a novembro de 2023, após o anúncio de dissolução do Parlamento e eleições antecipadas.
Esse 12.º processo de revisão da Constituição da República Portuguesa (só sete foram concluídos com sucesso) tinha sido desencadeado também com a apresentação de um projeto do CHEGA, em outubro de 2022, seguido por todas as bancadas e deputados únicos, num total de oito projetos e 393 propostas de alteração, revogação e aditamento de artigos à lei fundamental.
Devido à dissolução do Parlamento, aquela que seria a oitava revisão da Constituição – quase 20 anos depois da anterior mudança (2005) – ficou mais uma vez pelo caminho, sendo possível uma revisão ordinária na atual legislatura.
Sobre este assunto, o presidente da Assembleia da República, José Pedro Aguiar-Branco, debruçou-se apenas sobre a importância da “existência de uma maior proximidade entre os deputados e os cidadãos das diferentes regiões”, sendo “essencial para reforçar a qualidade da democracia”.
Segundo o jornal Público, o presidente do Parlamento defendeu que uma representatividade mais próxima traduz “um Parlamento interessado nas políticas de proximidade” e “ajuda, por via do exemplo, a aproximar os eleitos dos eleitores”, reforçando a “qualidade da democracia”.
Em concreto, sobre a intenção do CHEGA, Aguiar-Branco descartou, respondendo que “quando [o pedido] entrar será constituída nos termos processuais uma comissão eventual, que avaliará o pedido. Depois haverá um mecanismo processual que se desenvolve em função desse pedido e que terá também de ser aprovado o processo de revisão por dois terços dos deputados.”
Mas esta intenção do CHEGA, de avançar com uma nova revisão constitucional e reduzir o número de deputados no Parlamento, não surge de agora. Em 2020, o partido liderado por Ventura já havia anunciado a sua intenção de querer mudar a Constituição da República para reduzir o número de deputados no Parlamento. O CHEGA entregou, há cerca de quatro anos, uma proposta no Parlamento para que a Constituição da República permitisse “uma redução mais drástica do número de deputados”. “Não precisamos de 230 deputados. Cem cumpririam perfeitamente essas funções. Alguns deputados servem apenas para fazer distribuição de favores”, disse André Ventura, em declarações ao Jornal i, na altura.
O líder do CHEGA considerava que um Parlamento com menos deputados poderia ser “mais forte, mais dinâmico”, e com “menos custos”.
“O Parlamento, como está montado, é muito caro”, acrescentou André Ventura. O projeto de revisão constitucional do CHEGA, em 2020, defendia que “um Parlamento com menos deputados não representava nunca, ao contrário do que muitos afirmavam, um Parlamento menos capaz, menos representativo ou mais distante do povo. Muito pelo contrário, exigirá dos seus deputados um comprometimento muito maior com as suas funções”, justificou.
A proposta referia ainda que a redução do número de deputados acompanharia os sacrifícios feitos pelos portugueses: “Os portugueses não compreenderão, por muito mais tempo, que quem os representa e lhes exige, diariamente, sacrifícios pelo país, não implemente, no Parlamento, o mesmo paradigma e postura: menos gastos, menos excessos, menos quantidade e maior eficiência”.
Saliente-se que, de acordo com a Constituição, a Assembleia da República pode rever a Lei fundamental decorridos cinco anos sobre a data da publicação da última lei de revisão ordinária e a iniciativa pode partir de qualquer deputado.
“Apresentado um projeto de revisão constitucional, quaisquer outros terão de ser apresentados no prazo de trinta dias”, diz ainda a Constituição, que determina que qualquer alteração tenha de ser aprovada por maioria de dois terços.
Na atual legislatura, tal como na anterior, apenas PSD e PS somam os dois terços dos deputados necessários para rever a Constituição, não sendo possível alterar qualquer artigo, se pelo menos um dos dois maiores partidos for contra.
No anterior processo de revisão, duas das áreas em que PS e PSD tinham registado consenso, era na possibilidade de incluir na Constituição o isolamento de doentes graves e contagiosos sem recurso ao estado de emergência ou o acesso pelos serviços de informações a metadados de comunicações, recorda o Observador.
O reforço dos direitos ambientais e dos animais ou a modernização da linguagem constitucional eram outras das mudanças à vista, num processo em que o PS até demonstrou abertura para algumas alterações pontuais no sistema político, área que tinha rejeitado à partida mexer.