Espanha tem eleições em 23 de julho que poderão traduzir-se na mudança de um governo de esquerda para um de direita quando o país preside ao Conselho da União Europeia, algo que analistas e políticos desvalorizam.
“Os objetivos já estão definidos. Além disso, não são objetivos que estabelece apenas a presidência espanhola, são partilhados pelo resto dos Estados-membros e pela Comissão Europeia”, afirmou o primeiro-ministro espanhol, o socialista Pedro Sánchez, no dia 05 de junho, uma semana depois de ter antecipado as eleições legislativas que estavam inicialmente previstas para dezembro.
Entre esses objetivos estão, afirmou Sánchez, avanços nas negociações do pacto de imigração e asilo da UE e das novas regras orçamentais para os Estados-membros, assim como o aprofundamento da designada “autonomia estratégica” da Europa, para diminuir a dependência de fornecedores externos, como a China.
Fontes da Moncloa (sede do governo espanhol) insistiram esta semana na “absoluta normalidade” de haver eleições num país que tem a presidência semestral da UE, como já aconteceu por diversas vezes.
Além de tudo isto, o professor universitário de Ciência Política e diretor da representação em Espanha do Conselho Europeu das Relações Externas (ECFR, na sigla em inglês), José Ignacio Torreblanca, acrescenta que a presidência espanhola da UE ocorre quase no final da atual legislatura europeia (há eleições em maio de 2024), quando todas as iniciativas “em cima da mesa” estão já “muito maduras”, numa fase final de trabalhos e negociações.
Neste contexto, o papel das presidências semestrais é fechar dossiês já avançados, diz José Ignacio Torreblanca, que acrescenta que organismos no governo espanhol com a tutela europeia ou a representação permanente de Espanha em Bruxelas são “máquinas muito oleadas” e totalmente preparadas para “fazer a gestão” necessária, em qualquer cenário.
Este académico sublinha ainda que não são o primeiro-ministro e o ministro dos Negócios Estrangeiros do país que tem a presidência semestral que presidem ao Conselho Europeu ou aos conselhos de ministros de relações externas, dois organismos “já totalmente europeizados”. Charles Michel é o presidente do Conselho Europeu e Josep Borrel é o chefe da diplomacia europeia.
Pelos mesmos motivos, José Ignacio Torreblanca desvaloriza também o impacto substancial que poderia ter a entrada da direita radical, do partido VOX, no governo espanhol durante a presidência semestral da UE.
As sondagens das eleições de 23 de julho dão a vitória à direita, ao Partido Popular (PP), e a derrota do Partido Socialista (PSOE).
No entanto, mesmo que saia derrotado, Sánchez pode manter-se como primeiro-ministro até ao final da presidência espanhola da UE, caso se repitam bloqueios na formação de um novo governo, como aconteceu por duas vezes na última década em Espanha.
As sondagens dão a vitória ao PP, mas sem maioria absoluta, que poderá eventualmente conseguir se negociar com o VOX.
Após as eleições de 23 de julho, a lei espanhola dita a formação das Cortes (Congresso e Senado) em 17 de agosto. Caberá ao Congresso (parlamento) eleger o novo primeiro-ministro, seguindo determinados prazos e rondas de votações até haver uma maioria de deputados suficiente que dê posse ao novo chefe do executivo.
Se dois meses após a primeira votação para eleger um novo primeiro-ministro não houver uma decisão das Cortes, são convocadas novas eleições, como aconteceu em maio de 2016.
Em dezembro de 2015, Mariano Rajoy, do PP, venceu as eleições sem maioria absoluta e em 03 de maio não tinha ainda conseguido ser eleito primeiro-ministro pelas Cortes, pelo que o parlamento foi dissolvido nesse dia pelo Rei Felipe VI e voltou a haver legislativas em 26 de junho.
Anos depois, aconteceu o mesmo com Pedro Sánchez, que não conseguiu ser investido primeiro-ministro pelos deputados após ganhar as eleições de abril de 2019, tendo-se repetido as legislativas em novembro do mesmo ano.
Se o PP vencer com maioria absoluta ou conseguir chegar a um acordo rápido com o VOX para a viabilização de um novo governo no parlamento, é possível que Espanha tenha um novo executivo, de direita, antes do final do verão.
Mas se as negociações do PP com o VOX ou entre partidos de esquerda forem mais complicadas, toda a presidência espanhola poderá desenrolar-se com o atual governo em funções e assistir à convocatória de novas eleições.