11 Maio, 2024

Milei ganhou… e agora?

Javier Milei venceu as eleições da Argentina com uma margem sólida de votos. Na reação portuguesa à vitória ficou visível que a esquerda e o centro, incluindo muitos liberais, preferiam o ministro da economia argentino que contribuiu para uma das piores evoluções inflacionistas da Argentina, ou seja, uma continuação do status quo kirschnerista.

No seguimento dos resultados eleitorais, a comunicação social tentou caracterizar Milei como um louco de extrema-direita e libertário. Podemos admitir que Milei pode ser considerado um “louco” à beira do político padrão pela forma efusiva como fala, porém, além da personagem, o que nos interessa são as ideias.

Quanto às pautas sociais não me convence. Se facilitar o acesso de armas ao povo, tendo em conta que a criminalidade tem aumentado na opinião do povo argentino, já seria um bom progresso. Por outro lado, a sua oposição negativa face ao aborto e eutanásia não me transmite confiança de que serão materializadas, especialmente quando o próprio Milei aceita pautas esquerdistas como o casamento gay. Demonstra a sua ótica materialista perante uma instituição tão importante como o casamento ao afirmar que não passa de um contrato. É essa visão liberal que intoxica a instituição enquanto garante da sustentação moral do crescimento demográfico.

Não preciso de ir a fundo noutros temas como a liberalização de drogas, mesmo sabendo que a adição é destrutiva para a boa saúde de um povo que não se quer com vícios, tal como a própria relativização de uma vida digna ao não se importa com a prostituição e a “morte voluntária” de um ser humano quando afirma: “não me importo se cometeres suicídio, não tenho nenhum problema. Drogar-se é cometer suicídio”. Enquanto fanático individualista faz todo o sentido que pense assim, mas qualquer nacionalista e cristão que se preze não o é.

O nosso vizinho não é um concorrente de classe. Não pode ser um átomo estranho ao qual nós negamos uma ligação de entreajuda. Não é um meio para eu enriquecer às custas do seu consumo. O vizinho tem de ser um compatriota que rema no mesmo sentido que eu para que o nosso barco siga num caminho de interesse comum. É alguém que tem uma ligação não só espiritual, mas também física por partilhar dos mesmos antepassados e história que eu.

Numa outra face, a posição radical de Milei face a uma diminuição do Estado, cortando nas gorduras atuais e acabando com o excesso de burocracia governamental, seria bastante positiva. A própria eliminação da subsidiodependência é umas das grandes tarefas que Milei terá de enfrentar se quiser conciliar este projeto com um discurso atrativo para atração de investimentos. Nesse caso, é possível perspetivar que a Argentina ficará melhor do que está, o que não é muito difícil.

Por outro lado, Milei quer dolarizar a sua moeda e destruir o banco central. Existe uma falta de consenso à direita quanto ao uso desta arma para atacar a atual inflação, o que é compreensível devidos às consequências que implica, mas, no geral, apenas reconhece o seu próprio fracasso em fazer da Argentina “grande”. O fim da soberania no controlo da própria política monetária, com as taxas de juros e a quantidade de moeda em circulação a não serem mais decididas por autoridades argentinas, é uma armadilha de longo prazo na qual Portugal também caiu.

O tema dos bancos centrais é evidentemente complexo, mas considero que um Banco central privado ou afastado da esfera soberana vai contra o interesse nacional. A construção piramidal de uma economia fundada em grandes corporações privadas que dominam direta ou indiretamente os vários setores económicos, chegando ao ponto de condicionar o poder político, é o pior que o capitalismo tem a oferecer. Se Milei enveredar por esse caminho, teremos uma Argentina com as pernas já cortadas pela esquerda, porém, sem vontade de estancar o sangue que se perde na cultura política e económica argentina a cada dia que passa.

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