Assistir impávidos e serenos, como é apanágio deste povo, a um sentimento progressivo de insegurança.
A segurança constitui um pilar fundamental do Estado de Direito Democrático e contribui, decisivamente, para uma sociedade mais democrática e tolerante, sendo um garante da liberdade dos cidadãos, na medida em que ninguém pode ser verdadeiramente livre se não se sentir seguro.
Janeiro de 2023
Indivíduo que agrediu de forma brutal um militar da Guarda Nacional Republicana de Alcanena, desfigurando-o, ficou em liberdade.
Fevereiro de 2023
Indivíduo agrediu dois militares da Guarda Nacional Republicana em Caminha, tendo um dos militares a necessidade de ser assistido na Unidade de Saúde local, sai em liberdade.
Agosto de 2023
Na Quinta do Conde, Sesimbra, um individuo agrediu um militar da Guarda Nacional Republicana e foi colocado em liberdade, já em Vila Real de Santo António, outros dois indivíduos, por «tentarem» furtar duas lanchas rápidas atracadas no cais do Subdestacamento de Controlo Costeiro da Guarda Nacional Republicana, é-lhes aplicada a medida de coação mais gravosa – prisão preventiva.
Na maior parte dos casos, trata-se de indivíduos já referenciados e, até, com registo da prática de crimes.
Moralmente, tanto numa situação, como na outra, se devia aplicar a medida de coação mais gravosa!
Mais curiosa é a forma de como se aplica a Justiça neste país, Segundo Aristóteles, Justiça é dar a cada um o que é seu, com base na equidade, e suprindo as desigualdades.
Pergunto, quantos Códigos Penais existem neste país (tão pequeno, comparativamente à maioria Mundial)?
Não existe um “guião” (determinações/jurisprudência/pareceres) de forma a colmatar a aplicação das leis pelos nossos Magistrados, essa classe insigne e primordial?
Ainda que a legislação possa ter díspares interpretações, será que faz sentido que exista tanta diferença na sua aplicação?
Os elementos das forças de segurança sentem um absoluto e constante desprezo, mesmo sendo eles quem garante a segurança do país. Atuam com grande descontentamento e desmotivação, ao constatarem que quem atenta contra eles vive impunemente, reiterando na prática desses mesmos crimes.
Segundo a última edição do Global Peace Index, Portugal é um dos países mais pacíficos e seguros do mundo, embora esteja a descer pelo terceiro ano consecutivo e esteja na sua pior posição desde 2015, segundo o Índice Global da Paz 2023, constituindo a segurança interna um ativo estratégico.
Dados da Organização das Nações Unidas (ONU) indicam que, atualmente, 55 % da população mundial vive em áreas urbanas, sendo expectável que até 2050 essa percentagem atinja os 70 %.
Entre nós, a realidade não é diferente. De acordo com os Censos 2021, 4,6 milhões de pessoas (44,5 % da população total) vivem nas áreas metropolitanas de Lisboa e do Porto (em 1960, apenas 29,8 % da população vivia nas áreas metropolitanas de Lisboa e do Porto), sendo que, em 1960, 48,0 % da população residia no Litoral do país, percentagem que em 2021 aumentou para 61,2 %.
Enquanto em 1960, 2,9 % da população vivia só, em 2021 essa percentagem subiu para 9,9 %; de igual forma, o número de idosos em 1960 correspondia a 8,0 % da população, quando em 2021 atingiu os 23,4 %. Em suma, temos mais cidadãos a viver nos principais centros urbanos, mais cidadãos idosos e mais cidadãos a viverem sozinhos.
Nesta fase sensível, entre um país com a população cada vez mais envelhecida e com o acordo de mobilidade (Regime de entrada de imigrantes em Portugal – que prevê uma facilitação de emissão de vistos para os cidadãos da CPLP, no âmbito do Acordo sobre a Mobilidade entre Estados-Membros), com o objetivo primordial na procura de mão de obra e face a um quadro demográfico negativo, deve estar patente e é impreterível uma nova centralidade nas políticas públicas de segurança.
De acordo com o Global Peace Index, Portugal tem sido considerado como um dos países mais pacíficos e seguros do mundo. Não obstante, o combate à criminalidade mantém-se, alegadamente, como prioridade política do Governo, investindo e reforçando as medidas de prevenção que creem ser adequadas aos novos desafios decorrentes da concentração humana.
Vivemos num momento em que é muito mais importante as estatísticas (ainda que por vezes possam ser deturpadas) do que propriamente apostar numa estratégia real, que vá de encontro com as dificuldades que o País atravessa, podendo dando legitimamente “a Cesar o que é de Cesar” (a autoridade, e as ferramentas necessárias aos profissionais das Forças e Serviços de Segurança, e aos próprios Magistrados), tendo obviamente que se criar sinergia entre os Ministério da Administração Interna e o Ministério da Justiça, só assim podemos remar no mesmo sentido.
Curiosamente, e ainda relacionando-se com a mesma temática, temos vindo a assistir precisamente a uma oposição aquilo que o Governo tem vindo a anunciar sistematicamente, se não, vejamos:
Sobre a matéria mediática dos metadados,
O Tribunal Constitucional considerou que tais normas (que vigoraram durante quase uma década) violavam princípios como a proporcionalidade na restrição dos direitos à reserva da intimidade da vida privada e familiar ou o sigilo das comunicações, direitos consagrados na Constituição.
O Tribunal de Justiça da União Europeia (TJUE) confirmou a ilegalidade da conservação “generalizada e indiferenciada” dos dados de tráfego ou de localização. Considera, no entanto, que pode ser permitida uma conservação “seletiva e/ou rápida” quando o objetivo for lutar contra a criminalidade grave.
Obviamente que sem metadados será praticamente impossível evitar certos tipos de crimes, que por inerência só podem ser evitados e investigados caso seja permitida a conservação de dados de tráfego das telecomunicações, ainda que esta prática tanja num impacto sobre as restrições nos direitos, liberdades e garantias dos cidadãos e, consequentemente, no Estado de direito democrático.
Na minha ótica num Estado de Direito deve haver um equilíbrio significativo e adequado entre os direitos fundamentais, e os deveres que cada cidadão tem, sem aviltar a dignidade humana, que é o valor basilar da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia.
Na ausência de segurança e garantia jurídica dos quadros jurídicos nacionais em matéria de conservação de dados, existe o risco de os órgãos de polícia não conseguirem aceder a provas importantes necessárias para identificar, prevenir, investigar e reprimir crimes – e por isto, como pode o Governo dar como prioridade o investimento em medidas de prevenção?
É irrefutável que a prevenção é o melhor instrumento de combate à violência e à prática de ilícitos, o que significa reduzir as causas que lhe dão origem, atuando ao nível do indivíduo, das suas relações familiares e sociais, da comunidade local e da sociedade em geral.
Ao longo das últimas décadas, foram sendo criados e implementados diversos instrumentos de prevenção, impondo-se, face aos desafios atuais, a adoção de uma visão mais integrada, holística e sistémica, reforçando a sua implementação e potenciando os seus impactos.
Nesta perspetiva, a tutela das Forças de Segurança deu primazia à valorização das funções policiais, designadamente aquelas que implicam uma maior proximidade com o cidadão, no quadro de um modelo de policiamento proativo, no entanto, em consequência da falta de aposta na formação contínua, por via das parcas condições socioeconómicas que os agentes vivem no seu quotidiano, das más condições dos locais de trabalho, e da falta de lideres capazes, nota-se uma enorme frustração e letargia, que leva alguns (num aumento gradual) a abandonar as fileiras, e que retrata e espelha para os jovens uma profissão em nada recompensante, perdendo por isso futuros candidatos.
A prevenção criminal não pode funcionar somente através de um modelo de policiamento de proximidade, ainda para mais, sem meios humanos disponíveis para essa finalidade, atente-se que hoje em dia só temos patrulhas apeadas (que sempre foram a melhor forma de
policiamento de proximidade com a população) nas capitais (essencialmente realizadas pelas Polícias Municipais), ou no interior do País.
Da teoria redigida pelos Governos à prática/realidade…
Iniciado com o Programa Escola Segura, o policiamento de proximidade envolve hoje largas dezenas de efetivos em ambas as Forças de Segurança, que não são em número suficiente para acompanhar crianças, jovens, idosos e outros cidadãos particularmente vulneráveis, os elementos das Forças de Segurança não são em número suficiente para conseguirem desenvolver as ações de sensibilização e reforçar as relações de confiança com as populações que protegem.
Aliado a estas problemáticas, não podemos postergar a questão da morosidade dos Tribunais, que tendo em conta o próprio conceito de tempo que é complexo, a expressão morosidade acaba por se traduzir, justificado no âmbito do Direito, num “conceito jurídico indeterminado e abstrato”, contudo este atraso tem contribuído para a deslegitimação social da máquina judicial portuguesa, a qual é encarada mais como um obstáculo do que um apoio na defesa de direitos.
Vivemos num País com uma cultura de impunidade, nepotismo e amiguismo, que tem feito de Portugal um país pobre e subdesenvolvido.