A recente vitória da aliança de extrema-esquerda na França, que bloqueou a esperada ascensão do National Rally (RN), da direita unida, poderia, à primeira vista, parecer um triunfo para os valores democráticos e progressistas. No entanto, esta vitória pode ser menos sobre o apoio a uma visão coesa para o futuro e mais uma manobra estratégica do presidente Emmanuel Macron, destinada a fragmentar e, assim, neutralizar a sua principal rival, Marine Le Pen. A coligação de extrema-esquerda, apesar das suas diferenças profundas, surgiu como uma necessidade de urgência para bloquear a ameaça da direita unida, mas levanta questões sobre a sustentabilidade e viabilidade de longo prazo desta aliança.
Em Portugal, um cenário similar, envolvendo uma coligação que estendesse do CDS à extrema-esquerda do Bloco de Esquerda, abarcando o espectro político desde a direita moderada ao socialismo mais radical, ilustraria não só uma heterogeneidade alarmante mas também uma volatilidade que poderia ser desastrosa para a economia e o tecido social. A governação requer mais do que a união temporária de facções adversárias; necessita de uma visão partilhada e estratégias colaborativas de longo prazo.
O que a França enfrenta agora, e o que Portugal deveria procurar evitar, é a instabilidade política que tais alianças heterogêneas inevitavelmente trazem. Macron, embora tenha sido eficaz em atrasar o que muitos veem como inevitável — a chegada ao poder de uma direita mais forte — fez isso ao custo de possivelmente sacrificar a coerência política e a eficácia governativa a longo prazo. Estas manobras, embora estrategicamente astutas, podem acabar por desencadear uma desilusão ainda maior entre o eleitorado, aumentando a polarização e o descontentamento.
A França, com sua história rica e complexa de lutas políticas e revoluções, encontra-se mais uma vez num ponto de inflexão. As eleições recentes podem ter sido menos uma rejeição definitiva do RN e mais um suspiro coletivo de alívio, um adiamento temporário de uma decisão mais divisiva. Este tipo de solução política, se espelhada em Portugal, poderia igualmente resultar em uma paralisia política e em uma falta de resposta efetiva às necessidades urgentes do país, desde reformas económicas a investimentos sociais críticos.
Portugal, observando o exemplo francês, deve aprender que enquanto coalizões são muitas vezes necessárias, elas não substituem a necessidade de um projeto político consistente e de uma liderança que possa unificar mais do que dividir. A resposta para desafios nacionais complexos raramente pode ser encontrada na simples agregação de ideologias conflitantes, mas sim na busca de um terreno comum que vá além do oportunismo político.
A lição aqui é clara: coalizões amplas podem funcionar como um band-aid político, mas não curam as feridas subjacentes que afligem a sociedade. A França e, por extensão, qualquer nação, devem buscar soluções que façam mais do que apenas adiar confrontos políticos inevitáveis, devem promover um progresso real e sustentável.