O ministro dos Negócios Estrangeiros afirmou hoje que sobrestimou o currículo do ex-diretor-geral de Recursos da Defesa, atual arguido numa investigação judicial, e que foi “um erro” nomear Alberto Coelho para uma empresa pública.
“Eu sobrestimei os 19 anos de diretor-geral, sobrestimei aquilo que tinha sido todo o currículo do doutor Alberto Coelho, (…) sobrestimei essa análise, essa parte da análise, e sobrestimei a outra parte que vem presente no relatório da auditoria [da Inspeção-Geral da Defesa Nacional]. Portanto, há aí um erro, que eu reconheço a posteriori”, afirmou João Gomes Cravinho.
O governante, que tutelou a Defesa entre 2018 e 2022, falava na comissão parlamentar de Defesa, onde foi ouvido a requerimento do PSD, audição em que também participou o secretário de Estado da Defesa Nacional, Marco Capitão Ferreira.
Gomes Cravinho frisou que, na altura em que decidiu nomear Alberto Coelho para a empresa pública ETI – Empordef Tecnologias de Informação, o ex-diretor tinha “40 e tal anos de serviço, 19 anos como diretor-geral e um serviço prestado ao ministério”, a que acresce o facto de a Inspeção-Geral de Defesa Nacional (IGDN), numa auditoria à derrapagem das obras no antigo Hospital Militar de Belém, ter considerado que não estava “em causa a boa-fé” de Alberto Coelho nessas obras.
“A minha presunção naquele momento, e penso que do lado da IGDN terão pensado a mesma coisa (…) é que, na ânsia de mostrar resultados, de mostrar a obra, o diretor-geral tinha atropelado todos os procedimentos devidos e tinha produzido a obra, mas com muitas inconformidades legais, como diz o relatório da IGDN. Naquele momento não tinha razões para duvidar da boa-fé, e o relatório da IGDN também coloca nesses termos as suas conclusões”, salientou.
O atual ministro dos Negócios Estrangeiros disse que “lamenta muito” ter feito essa nomeação e reiterou que, se tivesse na altura a informação que tem hoje, “nunca a teria feito”.
“A avaliação que fiz na altura foi que o capital de conhecimento, o percurso do doutor Alberto Coelho, teriam utilidade. Não tinha elementos que permitissem pensar em má-fé e, portanto, a nomeação para a ETI seguiu o seu percurso. Agora, se foi um erro? Claro que foi um erro”, reconheceu, em resposta à deputadoa do Bloco de Esquerda Joana Mortágua.
Questionado pelo deputado do Chega André Ventura sobre se a ideia de nomear Alberto Coelho para a Empordef partiu de Marco Capitão Ferreira, na altura presidente da idD – Portugal Defence, Gomes Cravinho respondeu que ambos tinham “um diálogo regular, corrente” e que o nome de Alberto Coelho surgiu nessa discussão.
“Agora, quem se lembrou em primeiro momento, em que momento da conversa, em qual conversa das muitas que a gente vai tendo? Não lhe sei dizer, até porque não tem importância nenhuma. Eu assumo a minha responsabilidade, e o senhor Marco Capitão Ferreira também seguramente que a assume”, frisou.
Gomes Cravinho reconheceu que não discutiu a nomeação de Alberto Coelho para a Empordef com o então secretário de Estado Adjunto e da Defesa Nacional Jorge Seguro Sanches, salientando que ambos falavam “com grande regularidade” sobre várias matérias, mas essa, “por acaso”, não foi discutida.
Durante a audição, o deputado do PS Diogo Leão mostrou-se “indignado” com o que considerou ser uma “flagrante hipocrisia” do PSD, acusando os sociais-democratas de terem integrado Alberto Coelho na lista de candidatos à Assembleia Municipal de Lisboa nas autárquicas de 2021, apesar de considerarem que não tinha “idoneidade” para assumir um cargo público.
O deputado do PS recordou ainda que Alberto Coelho foi nomeado durante o governo do PSD/CDS liderado pelo antigo primeiro-ministro Durão Barroso e sublinhou que, em 04 de setembro de 2015, o antigo ministro da Defesa Nacional Aguiar Branco publicou um louvor em que salientava a “lealdade, honestidade e frontalidade” de Alberto Coelho.
O ministro dos Negócios Estrangeiros referiu-se depois a este louvor público para salientar que correspondia “à imagem que havia do doutor Alberto Coelho” no ministério da Defesa Nacional.
“Lealdade, honestidade, são as palavras que, em relação ao doutor Alberto Coelho, pareciam apropriadas, indicavam a sua idoneidade para outras funções e é com grande surpresa, profunda desilusão, evidentemente, que hoje em dia digo que não posso falar de honestidade e de lealdade em relação ao doutor Alberto Coelho”, disse.
Perto do fim da audição, o deputado do PSD Carlos Eduardo Reis lamentou que os deputados do PS tenham andado “à volta da narrativa do louvor” e da inclusão de Alberto Coelho nas listas para as autárquicas, acusando-os de procurar “lançar alguma lama para cima desta audição”.