18 Abril, 2024

Tráfico de influências no governo? CHEGA denuncia teia de cumplicidades

A comissão de inquérito à TAP ainda está no seu início, mas as declarações bombásticas da CEO que foi demitida pelo Governo, Christine Ourmières-Widener, e de Alexandra Reis, ex-administradora daquela companhia aérea, ouvidas na comissão, são já suficientes para ‘pôr a nu’ uma verdadeira teia de promiscuidade entre o Governo, o Partido Socialista e a administração da TAP.

Comecemos pela audição da ainda CEO da TAP, Christine Ourmières-Widener, que disse ser “um mero bode expiatório” no caso da indemnização a Alexandra Reis e acusou o Governo de fazer um despedimento “ilegal e pela televisão”, sem respeito por uma executiva sénior.

“Eu fui demitida pela televisão, por dois ministros com um processo ilegal”, acusou a gestora que confirmou que fez uma reunião convocada pelo ministro João Galamba e que envolvia o deputado do PS presente na comissão de inquérito, Carlos Pereira, na véspera de ir ao parlamento, em janeiro, de forma a ser instruída nas explicações que iria dar sobre a indemnização à ex-administradora Alexandra Reis.

Christine Ourmières-Widener adiantou também que o secretário de Estado das Infra-estruturas à data, Hugo Mendes, a ajudou a redigir um esclarecimento pedido pelo ministério da Finanças e pelo próprio ministério a que Hugo Mendes pertencia, de forma a dar esclarecimentos sobre a indemnização e que foi Pedro Nuno Santos a autorizar a mesma.

Fez também a declaração surpreendente que o mesmo Hugo Mendes lhe sugeriu que a TAP alterasse um voo comercial de Maputo porque o Presidente da República teria de voltar mais cedo. No e-mail enviado à CEO, Hugo Mendes escreveu que “ele é o nosso principal aliado, mas pode tornar-se no nosso principal pesadelo”.

Christine Ourmières-Widener referiu que teve uma reunião com Fernando Medina na véspera do anúncio da sua demissão e em nenhum momento foi informada de que seria demitida com justa causa, apenas que a “situação estava complicada”.

Já Alexandra Reis afirmou que teria renunciado aos cargos na TAP, sem contrapartida, se o ex-ministro das Infraestruturas, Pedro Nuno Santos, ou o ex-secretário de Estado, Hugo Mendes, lhe tivessem dito que preferiam que renunciasse.

Adiantou ainda não ter dúvidas que foi a vontade da CEO da TAP que levou à sua saída, embora tenha dúvidas quanto às razões, e que o então secretário de Estado do Tesouro, Miguel Cruz ficou “muito surpreendido”.

“Entretanto li o relatório da IGF, onde li divergências irreconciliáveis, ouvi falar de organização, ouvi falar de perfil, por isso para mim não são claras as razões. O que posso dizer é que, relativamente à minha atuação na empresa, sempre tive uma relação cordial e de trabalho com todos os membros do Conselho de Administração e da Comissão Executiva”, salientou.

A ex-secretária de Estado disse não considerar “de todo verdade” que aquelas divergências tivessem que ver com o plano de reestruturação, sublinhando que participou na sua elaboração.

No entanto, admitiu ter expressado preocupações sobre a operacionalização de um aumento de 30% das receitas e que não acreditava que fosse possível voar a toda a capacidade inscrita no plano, revista em alta em dezembro de 2021.

“Tinha havido uma alteração ao plano de reestruturação que me deixava preocupada e que, por isso, eu de forma muito transparente e entendendo que eram aqueles os meus deveres e responsabilidades, naturalmente, levantei as minhas dúvidas e deixei claro que a empresa tinha de ter um mecanismo de flexibilidade e gestão de risco adequados”, explicou.

Questionada sobre se a razão para Oumières-Widener querer que deixasse a TAP se prendia com a rejeição de uma proposta comercial apresentada à TAP por uma empresa do marido da CEO, Alexandra Reis disse não ter “nenhuma evidência disso” e que o assunto nunca foi discutido com a presidente executiva.

Alexandra Reis protagoniza a polémica que estalou no Natal, quando era secretária de Estado de Tesouro e o Correio da Manhã noticiou que tinha recebido uma indemnização de meio milhão de euros para sair da TAP, onde era administradora, dois anos antes do previsto.

Depois de deixar a companhia aérea, em fevereiro de 2022, a ex-governante assumiu a presidência do Conselho de Administração da NAV Portugal — Navegação Aérea, antes de ser nomeada pelo ministro das Finanças, Fernando Medina, para secretária de Estado.

André Ventura denuncia teia de tráfico de influências no Governo e no Partido Socialista

André Ventura fala numa “teia de tráfico de influências” do Governo e do Partido Socialista e pede consequências políticas. “Hoje podíamos estar a falar de um Presidente da República enredado numa teia de tráfico de influências absolutamente lamentável”, atirou.

O líder do CHEGA afirmou que pode estar em causa um “crime de tráfico de influências” no caso que diz respeito ao pedido de alteração de um voo do Presidente da República, feito pelo ex-secretário de Estado das Infraestruturas Hugo Mendes à TAP.

Numa reação à audição de Christine Ourmières-Widener na comissão parlamentar de inquérito, André Ventura começou por falar numa “teia de influência” e de “cumplicidades, referindo-se à “forma de trabalho do Governo e de membros do Governo”, que “está ou esteve a capturar o Estado nos últimos anos”.

Destacando alguns aspetos particularmente “preocupantes”, para os quais pede “consequências políticas”, o líder do CHEGA referiu-se diretamente ao caso que envolve um voo do Presidente da República de Maputo para Portugal.

“A tentativa de alteração de um voo do senhor Presidente da República mostra bem a forma como o Governo e como o PS estão habituados a trabalhar, sem se preocupar com as pessoas que tinham voo marcado ou com as suas agendas. Houve um governante que procurou alterar uma data de voo, de forma unilateral, sendo depois bloqueado nessas intenções pela mesma CEO que foi exonerada pelo Governo”, afirmou.

“Vou dizer isto sabendo que certamente as autoridades já estão neste momento a fazer o seu papel. Tenho as maiores duvidas de que não estejamos perante um crime de tráfico de influências ou outros”, considerou.

Para Ventura, cabe agora ao Ministério Público investigar. “Esse é um papel que agora caberá ao Ministério Público e que não precisará de denúncia. Essa troca de mensagens, a tentativa abusiva de influenciar o funcionamento de uma companhia aérea, alterando um voo, apenas foi bloqueada pelo bom senso aparente da Presidência da República e da própria CEO”, disse.

“Se este bom senso não tivesse imperado, hoje podíamos estar a falar de um Presidente da República enredado numa teia de tráfico de influências absolutamente lamentável e isto mostra bem como o Governo e o Partido Socialista têm lidado com negócios do Estado”, atirou.

Outro caso preocupante para o presidente do CHEGA diz respeito a uma reunião, mantida em 17 de janeiro, na véspera de Christine Ourmières-Widener ir ao parlamento prestar esclarecimentos sobre a demissão da ex-administradora Alexandra Reis, em que terão estado presentes deputados do PS, nomeadamente Carlos Pereia, e assessores e chefes de gabinete de membros do Governo.

“Mostra bem a falta de ética e a cumplicidade que existe nesta investigação. É evidente que o PS tentou dizer à CEO da TAP com o que iria ser confrontada e a forma como deveria responder. É evidente que não houve nenhuma ética, mas é evidente também que Carlos Pereira não tem nenhumas condições para continuar na comissão parlamentar de inquérito”, defendeu Ventura, que afirmou ainda que também Eurico Brilhante Dias, líder parlamentar do PS, e António Costa, primeiro-ministro, devem “explicações” sobre este assunto.

De realçar que a iniciativa da reunião em causa partiu, de acordo com a CEO, do gabinete do ministro das Infraestruturas, João Galamba.

Questionado se acompanha o pedido de demissão do ministro das Infraestruturas, feito pela Iniciativa Liberal, o presidente do Chega respondeu que “tendencialmente sim”, mas ressalvou que é preciso “ouvir uma explicação dos governantes antes de fazer um pedido formal de demissão”.

“Se a resposta que o PS tiver para dar for a resposta que deu ontem à noite [terça-feira], de que foi apenas uma reunião de preparação, então sim, eu acho que ou há consequências políticas ou o país deixa de acreditar no que se passa aqui no parlamento”, defendeu.

A este propósito, o CHEGA pediu um parecer à Comissão da Transparência sobre a permanência do deputado socialista Carlos Pereira, coordenador do grupo parlamentar do PS na comissão parlamentar de inquérito à TAP, alegando eventual conflito de interesses.

Há “explicações que, quer Eurico Brilhante Dias, quer António Costa, têm o dever de dar ao país”, defendendo que o objetivo desta reunião era, “claramente, condicionar o depoimento” de Christine Ourmières-Widener no parlamento e que, por isso, o deputado socialista Carlos Pereira “não tem condições para continuar” a integrar esta comissão.

Ventura apontou que a situação dos ministros das Infraestruturas, João Galamba, e das Finanças, Fernando Medina “já estava difícil e fica cada vez mais periclitante”.

“Isto tudo junto mostra bem ao que chegámos – a um Governo que quis capturar uma empresa e que é uma forma de atuar no Estado, que provavelmente terá consequências até de forma penal”, rematou.

 

*Com Agência Lusa

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