Justiça: Do poder político e da corrupção

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“Quando Pedro me fala de Paulo, sei mais de Pedro do que de Paulo”. É assim o ditado que parece encaixar como uma luva no contexto da contenda entre altos representantes do poder político e a Procuradora-Geral da República, Dra. Lucília Gago. Se por um lado, temos um país onde os escândalos de corrupção se têm sucedido – desde alegados casos de favorecimento e abuso de poder em Câmaras Municipais, a cunha das gémeas luso-brasileiras e a demissão do ex-Primeiro-Ministro – por outro, há um grupo de 50 personalidades políticas, quase todas com fortes ligações, presentes e passadas, ao poder legislativo e executivo, que elaboraram um manifesto e, a pretexto de uma reforma da justiça, resumem a necessidade da referida reforma, não à corrupção, cujos referenciais de integridade política em Portugal são lastimáveis, mas antes, pasme-se, à “proliferação de escutas telefónicas prolongadas” e “buscas domiciliárias injustificadas”. Por seu turno, a Ministra da Justiça, a mesma que apresentou há pouco um pacote de medidas que visam um “combate sem tréguas” à corrupção, diz que é necessário “pôr ordem na casa”, referindo-se ao Ministério Público, o órgão que exerce a ação penal e responsável pela investigação criminal. A PGR quebrou recente- mente o silêncio para dizer aquilo que parece óbvio: Em Portugal ninguém está acima da lei. É mesmo assim e se assim não for, não está em curso nenhum combate efetivo à corrupção como ficou bem ao governo dizer. A separação de poderes é a garantia mor da democracia e não será à Assembleia da República enquanto poder legislativo, ao Governo enquanto poder executivo e muito menos aos 50 do manifesto, que caberá interferir por ação, omissão ou pressão, na investigação criminal de eventuais crimes de corrupção – e tecer juízos críticos sobre atos e diligências próprias do âmbito de competências que são exclusivas do MP diz muito mais de quem os tece, do que de quem é alvo dos mesmos. Se a pressão de agentes do poder político sobre quem investiga diz muito sobre as “reformas” que pretendem alguns manifestos, também a maneira como o CHEGA sempre abordou a corrupção diz muito do partido. Se houver um dia um manifesto anti-corrupção será certamente assinado por mais de 50 e o primeiro será quem sem- pre foi: André Ventura.

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