Os protestos surgiram após a divulgação de uma investigação jornalística de alegados planos de expulsão de estrangeiros no país, traçados numa reunião organizada por figuras influentes da direita radical, com a presença de membros do partido de direita radical Alternativa para a Alemanha (AfD), que ocupa o segundo lugar nas sondagens alemãs.
As manifestações, que têm reunido centenas de milhares de pessoas em toda a Alemanha, contaram com o apoio de membros do Governo alemão, nomeadamente o chanceler alemão, Olaf Scholz, e a ministra dos Negócios Estrangeiros, Annalena Baerbock.
Eis perguntas e respostas sobre o que está em causa com a chamada “Lei de Melhoria do Repatriamento”:
+++ QUAIS SÃO OS PRINCIPAIS PONTOS DA LEI APROVADA? +++
A polícia passa a ter novos poderes para procurar as pessoas identificadas para sair do país – pode, por exemplo, fazer buscas em quartos de alojamento partilhado e não apenas no quarto do indivíduo que está a ser deportado.
Este tem sido um obstáculo comum para as autoridades em caso de deportações falhadas devido à incapacidade de localizar as pessoas envolvidas. A falta de cooperação dos migrantes, que podem querer não fornecer documentos de identificação sabendo que isso pode dificultar o repatriamento, também pode atrasar ou impedir o processo.
Por outro lado, a duração máxima de retenção antes da expulsão passa de 10 para 28 dias, para dar às autoridades mais tempo para organizar as expulsões.
A lei prevê sanções mais severas para o tráfico de seres humanos, sejam as ajudas à viagem remuneradas ou não.
Além disso, os requerentes de asilo passam a poder começar a trabalhar após seis meses, em vez dos atuais nove meses. A duração dos benefícios será alargada de um ano e meio para três anos.
A regra também inclui que os crimes de ódio antissemitas podem ser considerados “graves” para efeitos de deportação. O mesmo se aplica ao racismo, à xenofobia, ao género ou à orientação sexual.
+++ O QUE DIZ A LEI SOBRE AS ORGANIZAÇÕES NÃO-GOVERNAMENTAIS (ONG)? +++
O diploma contém disposições que limitam os processos à assistência em terra, o que, segundo o governo, protege as organizações não-governamentais que ajudam os migrantes no mar.
+++ QUE IMPACTO TERÁ A LEI? +++
O governo estima que a nova lei vai afetar cerca de 50 mil pessoas e conduzir a 600 expulsões suplementares por ano.
Segundo a ministra do Interior, as deportações em 2023 aumentaram para 16.430, cerca de 27% mais do que no ano anterior, em resultado de uma aplicação mais firme da política existente.
+++ COMO VOTARAM OS PARTIDOS? +++
A lei foi aprovada com os votos da coligação formada pelo Partido Social-Democrata da Alemanha (SPD), o Partido Democrático Livre (FDP) e Os Verdes.
Tanto a AfD como a União Democrata-Cristã (CDU) votaram contra por considerarem que a lei deveria ser mais dura.
+++ QUAL FOI A POSIÇÃO DO GOVERNO SOBRE A LEI? +++
“Queremos que as pessoas que não têm o direito de ficar no nosso país sejam obrigadas a abandoná-lo mais depressa”, declarou a ministra do Interior, Nancy Faeser, a propósito deste projeto de lei, que visa “expulsar de maneira mais rápida e mais eficaz”.
A governante, que pertence ao SPD do chanceler Olaf Scholz, garantiu: “Os que fogem da guerra e do terrorismo podem contar com o nosso apoio”.
+++ QUANTOS PEDIDOS DE ASILO HOUVE EM 2023? +++
A Alemanha recebeu 352 mil pedidos de asilo no ano passado, mais 51% que em 2022.
No entanto, estes números estão distantes do pico da crise migratória entre 2015 e 2017, quando 722 mil pessoas solicitaram asilo.
Além disso, o país acolheu cerca de 1,1 milhão de refugiados ucranianos na sequência da invasão russa, em fevereiro de 2022.
+++ QUE REAÇÕES HOUVE À LEI? +++
Grupos de defesa dos direitos humanos criticaram as novas disposições, tendo a Associação Alemã de Advogados argumentado que não são “proporcionais”.
“Estamos horrorizados com a ideia de que as pessoas em fuga e aqueles que lhes oferecem ajuda humanitária possam ser ameaçados com penas de prisão”, afirmou a associação de salvamento marítimo SOS Humanity.
A ONG afirmou que o Governo alemão “quebrou as promessas feitas no acordo de coligação de não dificultar a busca e salvamento civil”. A ONG afirma ainda que, nalgumas circunstâncias, a nova lei poderá expor os seus voluntários a penas de prisão.
Uma petição que reuniu 136 mil assinaturas contestou a “prisão por salvamento marítimo civil”.
A Medical Volunteers International, outra das organizações envolvidas numa ação de protesto no dia da aprovação da lei, declarou: “A União Europeia continua a fechar-se e a restringir maciçamente o acesso aos direitos humanos. A criminalização das ONG que trabalham em prol dos direitos humanos é terrível! A saúde é um direito humano e deve ser disponibilizada incondicionalmente a todas as pessoas, independentemente do local onde vivem ou do seu estatuto”.