Indústria dos Incêndios, uma conquista de Abril

Novamente voltamos à época de incêndios e continuamos com o princípio, de hoje assistirmos a uma série de técnicos, politólogos e gente entendida alegadamente na “poda”, a falar sobre esta questão. Nós nunca tivemos uma política preventiva de fogos, nós estamos sempre nesta lógica da reação, na lógica de atirar os bombeiros como carne para canhão e à última da hora a fazer o combate aos incêndios, sempre que existem ignições, irem para o teatro de operações completamente desprotegidos.

Vamos por partes, 70% da área da floresta em Portugal está sobre a jurisdição do próprio Estado. Grande parte desta área ardida é de responsabilidade do próprio Estado. A lei de limpeza dos terrenos, que determina que os terrenos devem ser limpos até março, caso os privados não o façam. O governo não consegue fazer uma carta e um registo de quem pertence os terrenos e de quem são as responsabilidades. E a pergunta que eu deixava no ar era: desta área ardida, deste problema dantesco que está a acontecer, quanto deste terreno pertence ao Estado? Quanto é que o Estado fez de limpeza? Quantas vezes o Estado, durante este ano e nos anos anteriores, cumpriu as suas obrigações de fazer limpeza?

Estamos constantemente, nesta lógica de chegar ao Verão e rezar para que nada aconteça, rezar para que os bombeiros consigam resolver o problema e só nos lembramos deles maioritariamente no verão ou então na época de cheias no inverno. Não olhamos para a inércia de sucessivos governos, nomeadamente na lógica do planeamento e da prevenção, para evitar que mais tarde estejamos com estas situações e que, obviamente se existir prevenção e se existir planeamento, porventura teremos sempre situações de fogos. Não é isso que vai evitar na totalidade é certo. Mas pelo menos e certamente, não chegaríamos a este ponto de descalabro total e de calamidade total em que tudo se perde, em que bens patrimoniais, mas essencialmente e mais complicado do que isso e muito mais de lamentar do que isso, são as perdas de vidas humanas.

De uma vez por todas, tem que existir responsáveis dos fogos em Portugal. Não venham com a justificação das alterações climáticas, do Verão mais quente de sempre e do vento mais forte que nunca. Não vale a pena virem com esta conversa. Existem responsáveis e têm que existir responsáveis, políticos, mas não só a nível governamental, também a nível local. Existe aqui uma responsabilidade clara de algumas Câmaras Municipais, que têm alguma responsabilidade ou total responsabilidade na gestão do território e não adianta só quando querem aparecer para a fotografia, é que reclamam a autoridade sobre do território, mas depois quando é para cumprir as suas obrigações, não o têm feito.

Tem que ser revista obrigatoriamente, a forma como as autarquias têm tanta autonomia em tanta coisa, mas depois na contratação em pessoas para trabalhar em determinados sectores, não lhes é permitido ou têm que entrar em concursos públicos que vão demorar imenso tempo, onde a autonomia do poder local, aqui esvai-se de uma forma que não faz sentido nenhum. Tanto se autoriza os municípios a fazerem ajustes directos, com justificações muitas delas por vezes ridículas e a gastar dinheiro de uma forma completamente sem nexo e depois impedem as autarquias de fazerem o seu trabalho em determinadas áreas de supervisão, controlo e garantia do “bem público”.

Tudo isto é lamentável, quando tudo está a arder, é que nós dizemos constantemente, que isto nos traga uma grande reflexão. A reflexão tem que ser antes, a altura de protegermos tudo isto, tinha que ser antes. É no Inverno que se prepara o Verão e é no Verão que se prepara o Inverno, e de preferência com alguns anos de antecedência. Não é chegarmos à altura, num descontrolo total, a pedir à Europa que nos envie aviões Canadair, para tentar resolver uma situação que não conseguimos precaver e não conseguimos controlar. Temos sido ridículos na gestão da “coisa pública”, do “bem público”, da nossa floresta e da forma como temos desorganizado o ordenamento do território que existe a nível nacional.

É vergonhoso, não aprendemos nada com Pedrógão, não aprendemos nada com a Serra da Estrela, não aprendemos nada com o incêndio de Odemira e não aprendemos, que não vale a pena continuar a não mudar nada e estar à espera que as coisas mudem por si. Chegamos a uma altura que de uma vez por todas, é lamentável a forma como os bombeiros estão ajoelhados, como os bombeiros florestais, como os bombeiros sapadores e como toda a Proteção Civil está ajoelhada perante a inoperância e a incompetência do governo.

Posto isto, o que eu esperava do governo, que equiparasse as penas de crime florestal a crimes de terrorismo – máfia do fogo posto e o combate feroz à indústria dos incêndios. Não é por acaso, que as zonas de exploração de minério, são muito parecidas às zonas que estiveram em incêndio. Esperava a aplicação da revisão da carreira de bombeiro voluntário. A descentralização dos meios necessários às autarquias de prevenção e combate aos fogos. O que realmente acontece? Momentos de reflexão e decretado dias de luto nacional. É curto, muito curto.

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